Fim dos carros a diesel e a gasolina em 2035 vai a votos no Parlamento Europeu

Revisão do regulamento de emissões aponta para um corte de 55% nas emissões de CO2 já em 2030 e o corte de 100% dentro de 13 anos. Ambientalistas dizem que não chega. A palavra final será do Conselho da UE.

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Rui Gaudencio

Estrasburgo começa esta terça-feira a rever regulamentos de emissões de dióxido de carbono (CO2) na Europa e espera-se que aprove o ano da morte do comércio de carros com motor de combustão interna. A partir de 2035, acaba-se a venda de carros novos (ligeiros de passageiros e de mercadorias) a gasolina ou a gasóleo na União Europeia (UE), isto se o plenário aprovar, como se espera, a proposta que tinha partido da Comissão Europeia e que será debatida terça-feira, e votada no dia seguinte, no plenário do Parlamento Europeu.

Os ligeiros de passageiros e os de mercadorias são responsáveis por cerca de 12% e 2,5%, respectivamente, das emissões de gases com efeitos de estufa na UE. O regulamento aprovado em 2019, e que se aplica desde 1 de Janeiro de 2020, previa a redução de 37,5% das emissões de CO2 dos novos ligeiros de passageiros e de 31% nos novos ligeiros de mercadorias face às emissões de 1990.

Em Julho de 2021, a Comissão Europeia propôs metas mais ambiciosas: menos 55% de emissões nos ligeiros de passageiros e menos 50% nos ligeiros de mercadorias. Além disso, introduziu outra meta, até aqui inexistente, de um corte de 100% dessas emissões em todos os ligeiros a partir de 1 de Janeiro de 2035. A partir desse dia, a indústria deixaria de vender carros com motor diesel ou a gasolina na UE. Algo que até fabricantes de carros como a Volvo ou a Ford também defendem.

A UE ultrapassou a China como maior produtor de veículos eléctricos, mas estes não são a única solução. “Continua a ser possível recorrer a diferentes tecnologias para alcançar o objectivo de emissões nulas para a frota. Entre os veículos com nível nulo de emissões incluem-se actualmente veículos eléctricos a bateria, veículos a pilha de combustível e outros veículos movidos a hidrogénio”, lê-se no texto que será votado pelos deputados europeus.

Para generalizar estas alternativas, é preciso repensar o abastecimento. O regulamento das infra-estuturas de combustíveis alternativos vai exigir que cada Estado-membro instale nas “auto-estradas principais” pontos de carregamento eléctrico a cada 60 km e postos de abastecimento de hidrogénio a cada 150 km.

O executivo comunitário quer acelerar a descarbonização e espera um contributo mais intenso por parte do transporte rodoviário. As novas metas deveriam ser o trampolim para um aumento na produção de carros eléctricos e uma redução de preços, para que mais facilmente se generalize o seu uso. Contudo, diferentes associações ambientalistas garantem que a proposta de Bruxelas já é insuficiente.

“É preciso reduzir bastante mais do que as ambições que estão em cima da mesa, isto se quisermos que a Europa cumpra a sua quota-parte neste esforço de controlar o aquecimento global e de mantê-lo abaixo de 1,5 graus”, comenta Pedro Nunes, da associação Zero. “A ciência mostra que até 2030 precisaríamos de baixar as emissões em 65%. Há provas científicas nesse sentido pelo que a ambição do Parlamento Europeu não é ainda a mais adequada.”

Em 2020, a venda de eléctricos triplicou a sua quota de mercado e as emissões de CO2 dos carros reduziram-se 12% na UE. As regras que entraram a 1 de Janeiro desse ano baixavam o limite de CO2 das novas frotas e prometiam pesadas sanções para as marcas incumpridoras. Por outro lado, a pandemia reduziu o tráfego nesse ano. Só que, dois anos depois, e numa UE já sem confinamentos, voltou tudo ao mesmo, constata William Todt, director executivo da federação europeia Transporte & Ambiente.

“Alimentou-se a esperança de um novo normal, com novos hábitos. Infelizmente, nada disso aconteceu. A procura de petróleo recuperou completamente para níveis pré-pandemia e somente a aviação ainda não igualou o consumo de 2019, mas provavelmente fá-lo-á já neste Verão”, constatou Todt, numa conferência há duas semanas em Madrid.

As novas metas já foram objecto de parecer na Comissão de Ambiente, Saúde Pública e Segurança Ambiental, que aprovou o relatório a 11 de Maio, com 46 votos a favor, 40 contra e duas abstenções. Abriu-se assim caminho para a apreciação e votação em plenário. A comissão especializada incluiu novos alertas: esta transição “também deve ter em conta as consequências significativas no plano industrial e social” e não deve substituir a dependência do petróleo por outras dependências.

O pacote legislativo para os carros inclui também mudanças nas derrogações que podem beneficiar fabricantes de carros em relação a certos limites. Propõe ainda o fim, em 2030, dos incentivos à produção de carros de emissões baixas ou nulas. Por outro lado, reforçará as verbas para apoiar uma transição justa. Afinal, o sector automóvel emprega 4,6 milhões de pessoas na UE e representa 7% do seu PIB e nem todas as regiões partem para este desafio a partir do mesmo ponto.

"Sei que alguns queriam emissões zero já em 2030. Para ser honesto, essa medida não teria um apoio maioritário e, por outro lado, seria impossível lidar, à escala europeia, com a dimensão social dessa proposta. Alguns países e alguns construtores podem ter zero emissões nos carros novos já em 2030, mas não todos. Por isso, a meta de acabar com elas em 2035 é um bom equilíbrio”, disse Pascal Canfin, presidente da Comissão de Ambiente, durante o mesmo seminário de há duas semanas, em Madrid.

As diferenças entre países, quer na mobilidade eléctrica, quer no peso económico da produção de carros com motores de combustão interna, podem pesar no debate. Mas a pressão para reduzir a dependência energética da UE face à Rússia, por exemplo, também pode jogar a favor de uma decisão mais célere. O Conselho da UE terá a palavra decisiva e, segundo Canfin, até agora nenhum país se mostrou contra as novas metas em discussão. “Ainda não há um acordo, mas parece estar tudo bem encaminhado”, revelou.

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