Professores: a profissão mais importante, esquecida, fundamental e desvalorizada do mundo?

A excessiva (e desnecessária) sobrecarga de alunos e professores, com um número elevado de horas de aulas, disciplinas, momentos de avaliação (e muitas vezes momentos de reunião), bem acima do recomendado, tem fragilizado o bem-estar e a saúde mental de todos, e tem também exposto novas fragilidades do nosso sistema educativo.

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Tiago Lopes

A aprendizagem é, porventura, a mais fundamental das forças da espécie humana porque está directamente relacionada com a capacidade para a evolução, o crescimento e a adaptação.

Tendo sido, e continuando a ser, imprescindível para a evolução de qualquer criança, jovem e adulto, mas também de qualquer sociedade, não deveria a tarefa de ensinar e aprender ter um estatuto de elevadíssima importância? Não deveria a tarefa de ensinar e aprender ser percepcionada como algo fascinante, útil e aplicável aos desafios da vida?

Se assim fosse, talvez os alunos adorassem estar na escola e os intervalos fossem uma chatice porque interrompiam algo incrível a que chamariam aulas. Se assim fosse, talvez os professores tivessem todas as condições para fazer aquilo que verdadeiramente gostam: comunicar, partilhar, fazer pensar e fazer crescer os seus alunos. Os professores concentrariam toda a sua energia em ensinar e os alunos concentrariam toda a sua energia em aprender.

A qualidade do ensino e da aprendizagem não depende apenas da qualidade dos professores: o ambiente e condições em que trabalham, o rácio professor-alunos, a estrutura de liderança do contexto de ensino, a remuneração adequada, a carga de trabalho são alguns dos factores que determinarão a eficácia e o impacto do que verdadeiramente acontece na escola. Sabemos que, numa parte considerável dos contextos escolares, existem falhas graves em alguns (ou todos) destes factores. Como é possível captarmos ou retermos talento para a educação diante destas condições?

Perante estas circunstâncias e perante um período que carrega em si uma pandemia com consequências graves para a educação, deteriora-se a saúde mental e diminui o desempenho: de professores e de alunos. Nos professores, em particular, a diminuição do seu desempenho tem um efeito perverso, uma vez que as suas implicações se estendem ao desempenho académico e bem-estar emocional dos alunos.

A excessiva (e desnecessária) sobrecarga de alunos e professores, com um número elevado de horas de aulas, disciplinas, momentos de avaliação (e muitas vezes momentos de reunião), bem acima do recomendado, tem fragilizado o bem-estar e a saúde mental de todos, e tem também exposto novas fragilidades do nosso sistema educativo. Numa altura em que deveríamos sobretudo cuidar dos professores e dos alunos, apostando na sua recuperação, exigimos o mesmo (ou ainda mais).

Nos alunos, o número de dificuldades relacionadas com a ansiedade, a adaptação, a depressão ou o desempenho académico, aumentou exponencialmente; nos professores, o burnout tem crescido como uma avalanche imparável. São inúmeros os casos que, enquanto psicólogo, já acompanhei de professores que adoravam o que faziam e ficaram totalmente esgotados, não pelo contacto com os alunos ou pelo prazer de ensinar, mas sim porque se viram afogados num mar de burocracias, exigências desnecessárias ou outras tarefas que os afastaram do motivo pelo qual decidiram ser professores.

Porque não investir em saúde mental para alunos e também para professores? Porque não aumentar a contratação de psicólogos nos contextos de ensino? Porque não rever um sistema de ensino antigo, pesado, desactualizado, tão centrado em notas e memorização, e tão distante ainda das competências e da aplicação prática de conhecimentos ao mundo real?

O caminho para a saúde mental é o mesmo caminho para um desempenho académico óptimo, porque um precisa do outro, e a receita não é segredo, pelo contrário, está bem estudada e documentada. É um caminho que se faz a “dois”, professor e aluno. Precisamos de cuidar de ambos, porque os alunos precisam dos seus professores robustos emocionalmente e disponíveis, e os professores encontram propósito e significado quando têm condições para fazer aquilo que fazem melhor: incutir princípios e valores, influenciar atitudes e comportamentos, e inspirar as próximas gerações a sonharem, serem e fazerem melhor.

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