Pianista de origem russa Evgeni Kissin pede ao Ocidente para ajudar Ucrânia a vencer guerra

Nascido em Moscovo e residente em Praga, o músico defende que a passividade das democracias ocidentais perante as acções russas na Tchétchénia, na Geórgia e na Crimeia abriram caminho a esta invasão.

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O pianista de origem russa Evgeni Kissin apelou este sábado às democracias ocidentais para ajudarem o povo ucraniano a vencer esta guerra e a “expulsar os assassinos do seu país”, sob pena de se sujeitarem ao julgamento da História.

Num longo depoimento ao jornal canadiano Stir, de Vancouver, cidade onde dará um recital no dia 28, o pianista apela às democracias ocidentais para passarem à acção e corrigirem as opções políticas passadas, lamentando que, logo após a queda da URSS em 1990/91, em vez de levarem os antigos líderes soviéticos a julgamento num tribunal internacional, mantiveram a Rússia no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Se o Ocidente “não fizer tudo para ajudar o corajoso povo ucraniano a vencer esta guerra, para expulsar os agressores e assassinos do seu país, a história não perdoará”, escreve o pianista, um dos mais destacados da chamada “escola russa”.

Nascido em Moscovo, em 1971, residente em Praga, detentor das cidadanias britânica e israelita, Evgeni Kissin chegou às principais salas de concerto nos anos de 1980, iniciando uma carreira desde logo premiada. Actua regularmente em Portugal, sobretudo na Fundação Calouste Gulbenkian e na Casa da Música.

Crítico da “passividade” ocidental, perante a anexação da Crimeia, em 2014, Kissin vai mais atrás, e recorda acções da Rússia, “menos de um ano após o colapso da URSS”, que o Ocidente deixou passar em branco, como o apoio ao líder sérvio Slobodan Milosevic, no início da guerra dos Balcãs.

“O Ocidente engoliu” a retórica de Moscovo, afirma, recordando que a chamada “Rússia democrática” perpetrou a limpeza étnica dos georgianos na Abcásia”, matou dezenas de milhares de pessoas na Tchetchénia, “e o Ocidente não foi além da crítica”. “Factos tristes e vergonhosos”, acrescenta.

Se o Ocidente “tivesse aplicado sanções ao regime de [Vladimir] Putin, após a anexação da Crimeia, agora não havia guerra na Ucrânia (...); se tivesse aplicado sanções pela invasão da Geórgia e a anexação da Ossétia do Sul, em 2008, Putin não teria anexado a Crimeia, e talvez já não estivesse no poder. E se o Ocidente tivesse aplicado sanções em 2000, quando do genocídio na Tchetchénia, não teria havido invasões da Geórgia e da Ucrânia”, defende.

“Os líderes [russos] deviam ter sido julgados por um tribunal internacional”, após a queda da URSS, e deviam ter desaparecido o que chama “as quintas colunas” de Moscovo na Ucrânia e nos Estados Bálticos.

Após a invasão da Ucrânia, a 24 de Fevereiro, Kissin condenou de imediato a guerra, numa mensagem no Instagram, e participou em recitais a favor dos refugiados. Mas agora leva mais longe o seu apelo contra a Rússia de Vladimir Putin.

“Hitler mostrou que ditadores e assassinos nunca devem ser apaziguados, mas confrontados da forma mais decisiva e por todos os meios possíveis”, defendeu, acrescentando que não se trata só de Direito, mas de “dever moral” perante os crimes cometidos.