Tribunal da Concorrência recebeu mais de 16 milhões só dos processos com multas mais elevadas
“A partir do momento em que passou a haver prestação de caução, os problemas de pagamento das coimas mitigaram-se”, afirmou Mariana Machado, juíza titular do Juízo 1 Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.
O Tribunal da Concorrência recebeu, desde a sua criação, em 2012, mais de 16 milhões de euros de coimas, apenas dos recursos de contra-ordenações dos níveis 2 e 3 (superiores a 100.000 euros).
Segundo dados da Comarca de Santarém fornecidos à Lusa, desde a instalação do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em 30 de Março de 2012, até ao final de 2020, dos recursos de contra-ordenação, níveis 2 e 3, julgados e arquivados após recurso para os Tribunais Superiores, “foram cobrados, provenientes de coimas, mais de 15.900.000 euros e de custas mais de 95.000 euros”, grande parte pagos voluntariamente pelos recorrentes.
Dados referentes a 2021, indicam que, até ao final do ano, foi pago um valor total de 1.502.758 euros, correspondendo 773.439 a coimas de nível 1 (até 100.000 euros), cerca de 150 mil a coimas de nível 2 (entre 100.000 e 500.000), 530 mil euros a coimas de nível 3 (acima dos 500.000 euros) e 49.218 euros a execuções. Se até 2020 não eram pagas cauções, a partir dessa altura o TCRS instituiu a obrigação de os arguidos terem de prestar cauções das coimas a que vêm condenados pelas autoridades administrativas.
“Estão a ser prestadas cauções de valores muito significativos ao Tribunal”, disse à Lusa Mariana Machado, juíza titular do Juízo 1 do TCRS, dando exemplo dos 100 milhões de euros de caução no processo que ficou conhecido como “cartel da banca” e que terá sentença no final deste mês. Fonte judicial adiantou que, nos processos que envolvem bancos, as cauções, em regra no valor de 50% da coima aplicada pela entidade administrativa, têm sido prestadas por garantia bancária.
Menos problemas no pagamento das coimas
No caso da EDP que se encontra em fase de julgamento, a empresa depositou como caução o valor integral de 48 milhões de euros, correspondente à coima a que foi condenada pela Autoridade da Concorrência por abuso de posição dominante entre Janeiro de 2009 e Dezembro de 2013, da qual recorreu para o TCRS.
“A partir do momento em que passou a haver prestação de caução, os problemas de pagamento das coimas mitigaram-se”, disse Mariana Machado, salientando que, após alguma resistência inicial, esta prática “começa a ser interiorizada”. Nos processos do BES entrados antes da exigência de prestação de caução tem havido “intercomunicabilidade com outros processos em que há apreensões” e “comunicações para, uma vez transitadas as coimas, serem salvaguardados” os interesses do Tribunal, disse.
Como exemplos, Mariana Machado referiu o arresto preventivo interposto pelo Ministério Público no processo BESA/Eurofin, no qual o ex-presidente do BES Ricardo Salgado foi multado em 4 milhões de euros, e a acção cível de impugnação pauliana (para contestar uma decisão lesiva dos legítimos interesses dos credores) da decisão do juiz de instrução Ivo Rosa de levantamento do arresto de 700 mil euros depositados numa conta do Deutsche Bank em nome da mulher de Ricardo Salgado.
Da primeira decisão do universo BES, de Abril de 2018, transitada em julgado em Novembro de 2020, continuam a ser feitas diligências para obter o pagamento dos 3,7 milhões de euros a que Ricardo Salgado foi condenado, uma vez que não houve pagamento voluntário, estando o outro arguido, o ex-responsável financeiro do BES Amílcar Morais Pires a pagar em prestações os 350.000 euros a que foi condenado.
Sobre o dinheiro das coimas pagas junto do TCRS, Mariana Machado explicita que “entra na conta geral do Estado”, salientando não existir qualquer interesse do Tribunal no desfecho dos processos.