Taliban mantêm escolas do Afeganistão fechadas para as raparigas com mais de 11 anos
Dezenas de milhares de raparigas deveriam regressar ao ensino, sete meses depois do regime taliban ter subido ao poder e restringido os direitos das mulheres à educação e ao trabalho.
Os taliban vão manter a interdição do acesso ao terceiro ciclo do ensino básico e ao secundário para as raparigas, apesar da promessa do regime afegão de que as escolas voltariam a permitir, a partir desta quarta-feira, o regresso das jovens adolescentes às aulas.
“As escolas para as raparigas adolescentes entre o 7.º e o 12.º anos [dos 12 aos 18 anos de idade] continuam fechadas”, afirmou o porta-voz adjunto do Governo dos taliban, Inamullag Samangani, no mesmo dia em que as escolas reabrem após as férias de Inverno, citado pela agência de notícias EFE.
O Ministério da Educação afegão tinha anunciado o reinício das aulas para as raparigas em várias províncias, incluindo Cabul. “Não estamos a reabrir escolas para agradar à comunidade internacional, nem para obter o reconhecimento do mundo. Estamos a fazer isto como parte da nossa responsabilidade de proporcionar educação e instalações educativas aos nossos estudantes” referiu o porta-voz do ministério, Aziz Ahmad Rayan.
Contudo, a promessa não foi cumprida. Desde o seu regresso ao poder que os taliban têm tentado tranquilizar a comunidade internacional garantindo, entre outros aspectos, que os direitos das mulheres seriam respeitados. Mas várias decisões, incluindo esta, têm provado que o novo executivo afegão está a retomar as condições com as quais governou o país entre 1996 e 2001.
Os líderes religiosos dizem temer que matricular raparigas para além dos 11 anos possa corroer a sua base, disse Waheedullah Hashmi, um dos representantes das relações externas dos taliban. “A liderança não decidiu quando ou como permitirá que as meninas voltem à escola. Um ‘irmão’ renegará outro ‘irmão’ se descobrir que está a decidir abrir as portas à educação para alguma das suas filhas”, disse.
Em sete meses de governo, os taliban impuseram várias restrições às mulheres, que se viram excluídas de muitos empregos públicos, controladas na forma de vestir e proibidas de viajar sozinhas para fora da cidade onde vivem. O grupo islâmico deteve também várias activistas que se manifestaram pelos direitos das mulheres.
A Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, mostrou a sua “profunda decepção” com esta decisão. “Partilho da profunda frustração e decepção das meninas e mulheres afegãs do ensino médio que, depois de seis meses de espera, foram impedidas de voltar à escola” disse em comunicado. “A negação da educação viola os direitos humanos das mulheres e das raparigas e, para além do seu direito à educação, deixa-as mais expostas à violência, pobreza e exploração”, sublinhou Bachelet.
Terminou referindo que o Afeganistão é um “país que precisa desesperadamente de superar inúmeras crises inter-relacionadas” e que “desempoderar metade da população é contraproducente e injusto”. “A discriminação estrutural é profundamente prejudicial às perspectivas de recuperação e desenvolvimento do país”, concluiu.
Também a organização não-governamental Save The Children sublinhou que “todas as raparigas têm direito à educação” e recordou que “as autoridades afegãs declararam repetidamente nas últimas semanas que as raparigas voltariam à escola.”
“Estamos consternados que não tenham cumprido a sua promessa. Cada dia que passa sem que as raparigas possam ir à escola, negam-se os seus direitos humanos básicos. Apelamos ao governo para reverter esta decisão e garantir a abertura imediata das escolas a estas raparigas”, disse o director regional da Save The Children Asia, Hassan Noor Saadi.
O Ministério da Educação reconheceu, contudo, enfrentar um problema de falta de professores. Afirma que muitos deles se encontravam entre as dezenas de milhares de afegãos que fugiram do país quando os taliban chegaram ao poder.
As autoridades taliban, que têm enfrentado críticas internacionais pelo fecho de centros educativos e pela exclusão de estudantes do sexo feminino - por meio de uma série de de medidas discriminatórias contra as mulheres que as distanciam dos seus empregos e regem aspectos das suas vidas quotidianas - instalaram um Governo marcado pela falta de mulheres e de outros grupos políticos. Apesar disto, o vice-primeiro-ministro do Afeganistão garante que este executivo “é inclusivo” e tem tentado incorporar todas as etnias e sectores sociais nas novas autoridades.