Eleições em Madrid: o terramoto político de Ayuso
Editorais e análises nos media espanhóis sublinham o feito da candidata dos populares, notando o seu estilo de confronto e “trivialização” da política, e o que significa a derrota do PSOE no panorama nacional.
A imprensa espanhola destaca o “terramoto” da candidata do Partido Popular (PP) Isabel Diáz Ayuso, nas eleições da véspera em Madrid. O seu estrondoso resultado, muito perto de uma maioria absoluta, tem como contraponto a queda do Partido Socialista (PSOE), de Pedro Sánchez, que passou a terceira força, sendo ultrapassado pelo Más Madrid. Aqui ficam editoriais e análises de vários quadrantes ideológicos de media de Espanha.
“O resultado das eleições de Madrid é um autêntico terramoto político cheio de consequências, imediatas – sobre a Comunidade [de Madrid] – e também indirectas, sobre o conjunto da politica nacional.
A cidadania de Madrid deu um forte apoio ao projecto encabeçado pela representante do PP, Isabel Díaz Ayuso, o seu modelo de gestão da pandemia, o seu posicionamento económico ultraliberal, a sua atitude política polarizadora e com uma forte tonalidade demagógica.
Ganha o projecto de aprofundamento do modelo socioeconómico do PP de Madrid (…) de crescimento económico, ainda que mal partilhado. Este modelo vai agudizar-se, com as prometidas descidas de impostos – contra um crescente consenso internacional – e a consequente deterioração dos serviços públicos e aumento da desigualdade.
Ganha ainda uma atitude de confronto e de uma certa trivialização do discurso político. A vitória não chega para limitar a perigosa influência do Vox, formação obscurantista, retrógrada e com derivas que ultrapassam a linha dos valores democráticos.
O resultado dá um novo alento ao choque de pólos que atinge Espanha. Um desenvolvimento pouco animador para os defensores de uma política pragmática e dialogante.”
“Ayuso, que aprovou uma lei e meia (literalmente) durante dois anos de mandato e que não foi capaz de fazer avançar orçamentos, vai voltar a estar à frente de uma comunidade autonómica que, durante a sua gestão da pandemia e apenas num mês e meio – entre meados de Março e finais de Abril de 2020 – morreram 9470 idosos que viviam em lares em Madrid, deles 7291 morreram no próprio lar, sem ter cuidados médicos ou ser levados a um hospital.
Diaz Ayuso foi uma “Trump” durante o seu mandato e na campanha, mas no seu discurso triunfalista da noite deixou-o mais claro do que nunca, com o seu falso uso da expressão “liberdade” (“a liberdade que nos queriam tirar”, em referência às restrições da pandemia).
Voltou a posicionar-se como clara opositora a Pedro Sánchez numa manobra que pode trazer problemas ao PP e a Pablo Casado.
Madrid, com Ayuso na liderança, tem estado na contracorrente até de outras comunidades também governadas pelo PP na gestão da pandemia. Isto torna-a numa ave rara dentro do Estado. Para não dizer ainda que é a única grande capital (com a sua área metropolitana) europeia sem um governo progressista: das 28 capitais europeias, 14 são governadas pela esquerda – entre elas Berlim, Paris, Roma e Londres – sete pelo centro, cinco pela direita e duas por independentes.”
“O dia em que apresentou a candidatura de Ángel Gabilondo, o PSOE divulgou um vídeo que se revelou viral. Foi dos poucos – talvez o único – golpe mediático de toda a campanha com tropeções ideológicos, sem um discurso definido e com um candidato incómodo até quando lia algumas das suas intervenções.
Gabilondo estava de saída quando o nomearam candidato. Na verdade, o PSOE não tinha tempo de preparar outro, e optaram pelo mal menor.
Talvez a derrota do PSOE – e a ultrapassagem pelo Más Madrid – seja mais por desmérito do que por outra coisa.
A situação na nova assembleia não é boa para o PSOE. Ayuso está reforçada por este resultado e os eleitores escolheram Mónica Garcia [Más Madrid] como a pessoa que deve fazer frente a um governo de direita com o apoio na sombra do Vox. Poderá o PSOE recuperar o foco perdido antes de 2023?”
“As eleições são um aviso sério a Pedro Sánchez porque não se basearam exclusivamente na inusitada força de Ayuso. Analisá-lo assim seria incompleto porque a mensagem de centenas de milhares de madrilenos é de castigo a Sánchez, por mais do que PSOE queira atribuir o resultado à conjuntura. Até o Más Madrid o ultrapassou como segunda força. Madrid foi a constatação do desgaste brutal que estão a ter Sánchez e a sua coligação com o Podemos.
Se o PSOE pensa que este descalabro é só devido a Ayuso, está muito enganado. Votou-se contra a sua gestão da pandemia, contra o medo da recessão, contra o infantilismo com que Sánchez trata a opinião pública, contra os mantras da esquerda que perdeu os complexos de replicar palavras da guerra civil.”