Liquid learning: entregar valor “exige ir além dos novos modelos híbridos”
Cerca de 50% da formação presencial passará a ser só online, prevê Nick van Dam. Isso obriga a questionar o modelo de ensino.
Pela segunda vez em pouco mais de uma década, as escolas de negócios vêem-se interpeladas por uma crise. No meltdown financeiro de 2008, a pergunta que o mundo lhes fez foi: “Afinal, o que é que andam a ensinar?” Tinham de explicar o que fizeram à ética (ou à falta dela), à responsabilidade social, ao interesse comum. Com a pandemia de 2020, a pergunta começou por ser como ensinar num mundo que se fechou em casa.
O que ensinar e como ensinar são dois dos quatro temas que se cruzam no modelo pedagógico de “ensino líquido” que a IE University, em Espanha, tem vindo a conceber e ao qual decidiu dar visibilidade em 2021, com a inauguração de um novo centro de desenvolvimento pedagógico a que chamou IE Center for Liquid Learning.
Tal modelo assenta em quatro perguntas, explica o director deste novo centro, Nick van Dam: com quem aprendemos? Como estamos a aprender? Onde estamos a aprender? E o que estamos a aprender?
A resposta é um pouco mais complexa, como se depreende das palavras de Van Dam. O modelo implica que a aprendizagem seja “activa e social” ("aprendemos melhor a fazer do que a tirar notas, de acordo com o que nos dizem as neurociências"). Exige que a aprendizagem seja colaborativa ("comunitária, porque aprendemos com os outros"). Pressupõe que seja aplicada ("para que serve se não podemos aplicar?”). E finalmente remete para a personalização ("ter a liberdade de escolher com quem e o que queremos aprender").
Se a abertura de um centro é, no fundo, marketing, a iniciativa tem pelo menos o mérito não comercial de demonstrar que a crise questiona todos. Incluindo o próprio IE, que, ao apostar no adjectivo líquido, adopta um baptismo questionado pela sociologia, porque lembra o conceito de modernidade líquida desenvolvido por Zygmunt Bauman (1925-2017), que lhe deu uma conotação negativa.
Nick van Dam sublinha que o centro lançado em Março de 2021 serve “para mostrar” um modelo pedagógico “com provas dadas” e que, ao contrário do que o nome pode sugerir, vai muito além da já clássica divisão entre ensino presencial e online, ou a junção destes dois num modelo híbrido.
“Há quem pense que é líquido porque é online ou híbrido. Não. O online faz certamente parte, mas o modelo vai além disso”, continua, defendendo que entregar valor aos candidatos “exige ir além dos novos modelos híbridos”.
De todo o modo, Nick van Dam (licenciado em Educação, mestre em Sociologia das Organizações e doutorado em Filosofia, que passou pela McKinsey, pela Deloitte, esteve na Siemens e assina mais de 25 livros e numerosos artigos sobre inovação no ensino) crê que a componente online é aquela que, nesta altura, precisa de maior acompanhamento, porque é aquela que “está a acelerar”.
“Antes da pandemia, o número de escolas com programas online ainda era limitado. Depois da pandemia, deixou de ser uma opção. Passamos de uns 5% a 10% para 100%. É obrigatório estar online. O que era uma tendência de futuro decuplicou. Diria que já estamos a viver no futuro. Os dados indicam que metade da oferta em formação executiva [que não atribui grau académico] existente antes da pandemia nunca mais voltará a ser presencial.”
Hoje, garante Nick van Dam, a oferta online já se expandiu dos cursos para retiros online organizados para executivos. Para conceber toda esta oferta online, “é preciso integrar a educação de adultos, o desenho de instrução [instructional design], a psicologia do desenvolvimento, as neurociências”. “Não é só transferir os slides da sala para o ecrã. É preciso treinar os docentes. E é preciso tecnologia.”
Em 2016, a escola lançou a sala de aula do futuro, a que chamou Wow Room (Wow está para Window on the world, janela para o mundo). É uma sala em que só está o professor (ou convidado), fisicamente ou via holograma projectado por um robô capaz de se mover na sala para facilitar a interacção com os alunos, que “entram" na sala Wow via 48 ecrãs que se dispõem numa espécie de parede em U com 45 metros quadrados.
Para intermediar esta relação virtual, a escola desenvolveu uma aplicação desktop que é, no essencial, uma plataforma de videocolaboração desenvolvida internamente para ser mais eficaz na aprendizagem. Recorrendo a algoritmos, análise de dados, sistemas de reconhecimento emocional, permite expandir a interacção aluno-aluno e aluno-professor-convidado, “sem consumir muita banda larga”.
Mas porque o modelo de “ensino líquido" não se resume ao online, Van Dam destaca que o IE vai abrir em Setembro um novo campus em Madrid (a Torre IE, de 180 metros de altura, onde ocupará 50 mil metros quadrados).
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