Bloco quer criminalizar enriquecimento injustificado nos altos cargos públicos

Catarina Martins refuta que seja legislar a quente, assinala que já vem tarde e considera que a PPP do SIRESP foi um péssimo negócio para o Estado.

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Catarina Martins nega que proposta do Bloco seja legislar a quente LUSA/NUNO ANDRÉ FERREIRA

A líder do Bloco de Esquerda defendeu este sábado a criminalização do enriquecimento ilícito ou injustificado nos altos titulares de cargos públicos e disse que o seu partido apresentará em breve uma proposta no Parlamento.”É claro que Portugal teve um primeiro-ministro que viveu de uma forma que não é explicável pelos rendimentos e pelo património que declarou. E é difícil encontrar algo de mais grave do que isto. Este é um problema que deve ser tratado e uma das formas de o tratar é claramente a criminalização do enriquecimento ilícito ou injustificado”, defendeu Catarina Martins.

A líder do Bloco falava aos jornalistas em Viseu, à margem de um plenário de sapadores florestais, a propósito da decisão instrutória de há uma semana da Operação Marquês, envolvendo o ex-primeiro-ministro José Sócrates, e que, no seu entender, é um processo que mostrou “todas as deficiências do próprio sistema de justiça”.

“O Bloco de Esquerda apresentará muito em breve no Parlamento, novamente, a proposta de enriquecimento injustificado para altos titulares de cargos públicos, não criando nenhum problema com o Tribunal Constitucional”, assumiu. Antes disso, a coordenadora do BE reconheceu que o partido irá ouvir a Associação Sindical de Juízes, que “tem propostas sobre essa matéria, e que, em boa medida, vão ao encontro das propostas que o Bloco tem proposto também”.

“Seguramente, com outras sugestões, analisaremos a melhor forma de as incluir e assim reforçar a nossa proposta”, admitiu Catarina Martins, referindo que o partido tem propostas sobre esta matéria desde 2009. A líder bloquista criticou o PS e CDS, que “fizeram uma maioria de bloquear qualquer possibilidade de se avançar no enriquecimento injustificado”.

“Mais tarde, foi possível avançar, mas com uma proposta que foi considerada inconstitucional, porque exigia tanto a cidadãos que não têm funções públicas, como aos de funções públicas, a mesma justificação da sua riqueza e, portanto, o tribunal considerou que se invertia o ónus da prova”, observou.

Catarina Martins disse que pode existir uma lei de enriquecimento injustificado que é constitucional, que não inverte o ónus da prova, se assumir o que deve ser assumido, ou seja, “cabe aos altos titulares de cargos públicos uma obrigação especial de justificarem os seus rendimentos que um qualquer cidadão em funções privadas não tem”.

“Concentrando a legislação nos altos titulares de cargos públicos, seja nos políticos ou, por exemplo, nos magistrados, conseguimos seguramente uma lei constitucional e que dê à justiça instrumentos necessários para combater a corrupção. Isso é fundamental”, destacou. A líder do BE disse ainda que isto “não é legislar a quente”, até porque “é uma discussão que está no Parlamento desde 2007” e, neste sentido, disse que “não é a quente, já vem é tarde”.

Nacionalizar o SIRESP

Catarina Martins defendeu ainda que a rede de comunicações do Estado, SIRESP, deve ser nacionalizado, por se tratar da segurança nacional e acusou o Governo de andar com remendos nos últimos anos. “Estamos muito preocupados com a questão do SIRESP e muito preocupados que seja sempre em cima do momento que se discutem estas questões, nomeadamente, perto de uma época mais perigosa de incêndios e começamos a perceber que, mais uma vez, há problemas com o SIRESP”, adiantou.

A líder do Bloco de Esquerda falava a propósito do anúncio do presidente da Altice Portugal, Alexandre Fonseca, de que sem um novo contrato a empresa não poderia manter o SIRESP e reiterou que o serviço cessa a 30 Junho, se nada mudar. “Em 2018, o Bloco de Esquerda propôs que o SIRESP fosse nacionalizado, ou seja, não tem nenhum sentido que seja uma parceria pública privada (PPP), não tem nenhum sentido que uma empresa privada tenha a infra-estrutura que é fundamental às comunicações do país, à segurança do país”, destacou.

No seu entender, “esse deve ser um trabalho de soberania, tem a ver com a segurança do país e, portanto, deve ser público” e sublinhou que ninguém quer ouvir outra vez o que se ouviu em 2017, que o SIRESP não funcionou, aquando do incêndio em Pedrógão Grande, que provocou 61 vítimas mortais.

O Governo, continuou Catarina Martins, reconheceu na altura “todos os problemas, mas decidiu criar um grupo de trabalho” e “passou 2018, 2019, 2020” e chegados a 2021 e “a Altice disse que não fará mais nada depois do dia 30 de Junho e o Governo, aparentemente, não tem nenhum projecto”. "Adiar decisões fundamentais é um erro. Está em causa a segurança do país, a segurança das comunicações de quem nos protege e, portanto, é fundamental esse passo determinante que em questões de soberania e de segurança têm de ser naturalmente públicas e não ficarem entregues a PPP”, reforçou.

Catarina Martins considerou que “o problema não deve ser cíclico, deve ser resolvido” uma vez que se trata de uma questão “tão fundamental como as comunicações sobre segurança em situações de desastre e de calamidade” e, por isso, “precisa de estar sempre assegurada e o país tem de ter a certeza que está sempre nas melhores condições”. A líder partidária afirmou que “foi um negócio péssimo, à medida de uma PPP privada para garantir a rentabilidade de privados à conta de dinheiro público e à conta da segurança de populações e é por isso que o Bloco de Esquerda propôs que revertesse para o Estado e se acabasse com a PPP”.