Documentário atribui autoria de Salvator Mundi a alunos de Leonardo da Vinci

Le Sauveur à vendre (”O Salvador à venda”), realizado por Antoine Vitkine, vai ser estreado pelo canal France 5 no dia 13 de Abril. É uma viagem aos meandros de um segredo também salvaguardado por razões de Estado.

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Salvator Mundi, uma história ainda com muito por contar DR

Salvator Mundi, a tela adquirida em 2017 num leilão da Christie's de Nova Iorque por 450 milhões de dólares (cerca de 380 milhões de euros) pelo príncipe saudita Mohammed Ben Salman (MBS), terá definitivamente sido pintada pela oficina de Leonardo da Vinci (1452-1519) e não por ele próprio. E Paris terá rejeitado, ao mais alto nível, as condições exigidas por Riade para exibir a obra na grande exposição que o Museu do Louvre dedicou ao mestre do Renascimento em 2019, a assinalar o quinto centenário da sua morte. Estas são as principais conclusões defendidas num documentário que vai ser estreado pelo canal France 5, no próximo dia 13 de Abril.

Antoine Vitkine, realizador de Le Sauveur à vendre ("O Salvador à venda"), investigou esta pintura que fora inicialmente comprada em 2005, em mau estado, por 1175 dólares (cerca de mil euros), por um negociador de arte de Nova Iorque, e que foi restaurada nos Estados Unidos, recorda a agência AFP. A obra foi autenticada por vários especialistas britânicos como sendo da autoria de Leonardo e depois vendida a um oligarca russo, que decidiu revendê-la. Foi assim que, em Novembro de 2017, chegou ao leilão da Christie's apresentada como um original do mestre italiano, tendo batido todos os recordes do mercado mundial da arte.

Apesar de a Arábia Saudita nunca ter confirmado que o seu príncipe herdeiro é o dono de Salvator Mundi, várias fontes apontam nesse sentido, tendo MBS adquirido a pintura recorrendo a intermediários. 

Em Salvator Mundi — cujo actual paradeiro permanece desconhecido —, Jesus Cristo é representado a dar a bênção com mão direita levantada e os dedos cruzados, enquanto a mão esquerda segura um globo transparente. Já em 2018, surgiu a dúvida sobre se o trabalho não teria sido executado em grande parte pelos alunos de Leonardo. E terá sido sobre esse tema que, segundo o documentário de Antoine Vitkine, o príncipe saudita terá também falado com o Presidente Emmanuel Macron, quando este o recebeu numa cimeira França-Arábia Saudita, em Abril desse ano. Os sauditas terão então pedido à França uma avaliação da obra, que, para o efeito, esteve durante três meses no Louvre, onde foi estudado no laboratório (C2RMF) que a instituição detém para a análise de obras de arte.

Meandros de um segredo

O estudo demonstrou, segundo a fonte citada, que para Le Sauveur à vendre, o mestre italiano apenas terá contribuído para o desenho da figura de Cristo, e o Louvre informou os sauditas desta conclusão. No seu documentário — que a publicação especializada The Art Newspaper viu em primeira mão —, Antoine Vitkine cita, sem as identificar, duas fontes bem colocadas na Presidência da República e no Ministério da Cultura franceses. Assim se soube que MBS tinha a pretensão de emprestar a pintura ao Louvre para a grande exposição dedicada a Leonardo no final de 2019. O seu pedido era muito claro: expor o Salvator Mundi ao lado da Mona Lisa, e apresentá-lo como um ‘da Vinci’. Aceitar estas condições, equivaleria a elevar o valor da obra a 450 milhões de dólares”, sublinhou uma das fontes ouvidas pelo documentarista. Mas, “no final de Setembro [de 2018], o Presidente de França decidiu não dar seguimento ao pedido de Ben Salman”, acrescentou. Em resultado dessa decisão, o príncipe saudita recusou-se a emprestar a pintura em condições diferentes daquelas que tinha apresentado ao Louvre, revela ainda o documentário, cujo autor tentou também ouviu os responsáveis do museu parisiense, que, no entanto, se recusaram a prestar declarações.

Na grande exposição que dedicou ao quinto centenário de Leonardo, o Louvre — que, para o efeito, chegou a imprimir duas versões do catálogo, uma com a referência à autoria de mestre, outra, sem ela, avança The Art Newspaper  exibiu em alternativa o Salvator Mundi da Colecção Garnay, de autoria de um aluno do mestre do Renascimento.

Le Sauveur à vendre “fala-nos do nosso mundo, conta-nos a história da globalização em que vivemos, a nossa relação com a verdade. E se avançarmos na nossa reflexão, esta pintura conta-nos a história do populismo”, disse Antoine Vitkine à rádio FranceInter, acrescentando ter trabalhado durante dois anos a tentar descobrir os meandros deste segredo extremamente bem guardado”, que associa o vasto mundo dos negócios com a política e as sempre insondáveis razões de Estado.