Previdência dos advogados recusa substituir-se ao Estado na protecção da classe
Para Carlos Pinto de Abreu é intolerável que o Governo negue a estes profissionais os apoios que criou para todos os outros trabalhadores independentes prejudicados pela pandemia.
O presidente da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS), Carlos Pinto de Abreu, apontou esta quarta-feira baterias ao Governo, numa audição parlamentar sobre o futuro deste sistema privado de segurança social.
Interrogado por vários deputados de um grupo de trabalho criado para estudar esta questão sobre a possibilidade de a CPAS aumentar os seus apoios e reduzir as exigências contributivas – que muitos profissionais se queixam de ser demasiado elevadas –, pelo menos enquanto os tribunais continuarem praticamente sem actividade, este responsável foi taxativo: a Previdência dos Advogados e Solicitadores não irá pôr em causa a sua sustentabilidade, nem o pagamento de reformas e subsídios de invalidez, “para se substituir a uma responsabilidade que é do Estado e do Governo”.
Para Carlos Pinto de Abreu, é intolerável que o Governo negue a advogados e solicitadores os apoios que criou para todos os outros trabalhadores independentes cuja actividade sofreu forte redução por causa da pandemia - apesar de estas duas classes não descontarem, por norma, para o regime geral da segurança social. O presidente da CPAS explica que escreveu às ministras da Justiça e da Segurança Social, bem como à Secretaria de Estado do Orçamento e, “em desespero de causa, até ao primeiro-ministro”. Para nada: “Houve sempre total ausência de resposta”, lamentou, apesar de as duas classes que representa ajudarem também a custear, não com as suas contribuições mas com os impostos que pagam ao Estado, a Segurança Social.
A questão, que dura há muito tempo, não se apresenta de fácil resolução. Com um escalão mínimo obrigatório de contribuições de 250 euros mensais para os profissionais que exerçam há mais de cinco anos, a CPAS é um sistema virado sobretudo para o pagamento de reformas, deixando a descoberto, ou quase, situações como as baixas por doença e o desemprego. E se a CPAS arranjou recentemente um seguro de doença e acidentes pessoais para os beneficiários – considerado porém insuficiente, por incluir um período de carência de dez dias durante os quais não há direito a pagamento -, no que respeita ao desemprego Carlos Pinto de Abreu considera que não há muito a fazer: “Numa profissão liberal nunca pode haver subsídio de desemprego, porque não há propriamente desemprego – a não ser que existam relações de subordinação”.
Manifestando-se disponível para introduzir algumas alterações no sistema vigente, o principal responsável da CPAS frisou, porém, que será sempre preciso manter um escalão mínimo de contribuições, independentemente dos rendimentos auferidos pelos sócios. Um princípio cuja constitucionalidade foi recentemente posta em causa por um tribunal de Coimbra, por assentar na presunção de rendimentos. Carlos Pinto de Abreu alega, porém, não ser aceitável que quem exerce há mais de cinco anos não ganhe o suficiente para pagar os 250 euros mensais. Basear as prestações nos rendimentos declarados pelos beneficiários traria dois problemas, disse aos deputados: a incapacidade da Previdência dos Advogados e Solicitadores de fiscalizar os rendimentos efectivos, por um lado, e, por outro, o risco de mais tarde estes profissionais se verem confrontados com “pensões de miséria”.
Pelas contas que apresentou, a CPAS paga neste momento 110 milhões de euros por ano em reformas, mas as contribuições que recebe não chegam aos cem milhões. O equilíbrio é feito quer através do vasto património imobiliário da Caixa quer através de outros activos. “Neste momento estamos na linha de água”, sintetizou. Ao longo dos últimos 25 anos, as dívidas contraídas pelos beneficiários, resultantes de contribuições em atraso, totalizaram 150 milhões de euros, não tendo ainda a CPAS à sua disposição todos os instrumentos legais necessários para proceder à sua cobrança coerciva. “Mesmo assim temos recuperado nove a dez milhões por ano”, contabiliza Carlos Pinto de Abreu, segundo o qual apenas 14 advogados e solicitadores recorreram até agora ao mecanismo criado pela Assembleia da República para obrigar a CPAS a prestar apoio financeiro aos profissionais mais afectados pela pandemia.