Quatro vezes vencedor do Campeonato Asiático de Escalada, o chinês Chi Wai Lai, 38 anos, era um promissor alpinista, tendo chegado a posicionar-se em oitavo no ranking mundial. Até que um acidente de viação, em 2011, o deixou paraplégico. E, como seria de esperar, os primeiros momentos foram difíceis. “Houve uma altura em que me senti um pouco desamparado e em baixo”, recorda ao PÚBLICO, numa troca de mensagens.
Porém, “pouco tempo depois”, decidiu elevar-se. “Comecei a recompor-me e foquei-me no que ainda podia fazer”, diz. “Procurei na Internet e percebi que há muitas maneiras de fazer desportos adaptados e comecei a sonhar em escalar outra vez”, lembra.
Numa cadeira de rodas, a sua última aventura levou-o a subir 250 metros da Torre Nina na península de Kowloon, em Hong Kong, em Janeiro deste ano, com o propósito de angariar fundos para a investigação e desenvolvimento de exoesqueletos, uma estrutura robótica controlada pelo cérebro que, no caso de determinadas lesões na espinal medula, como as suas, ajudam à recuperação. “Actualmente estou a treinar [o uso do exoesqueleto] e logo estarei a levantar-me e a andar outra vez.” A sua iniciativa de Janeiro tinha rendido, até dia 6 de Fevereiro, um total de 6,5 milhões de dólares de Hong Kong (quase 700 mil euros).
No entanto, apesar do feito, Chi Wai Lai acabou por se sentir “desapontado”. É que o objectivo era chegar ao cume da torre, de 320 metros, e isso não foi conseguido. Não por causa da má preparação física ou do cansaço, mas simplesmente por factores que não se podem controlar, como o vento: “Para um alpinista, o clima desfavorável é o maior inimigo de uma subida.”
Adaptável como a água
Apesar dos actuais sucessos, Chi Wai Lai percorreu um longo caminho até conseguir ultrapassar as dificuldades impostas pelas consequências do acidente, entre as quais a mais difícil de superar foi, considera, “a dignidade”. “Eu era um atleta de elite em Hong Kong... De um dia para o outro, perdi não apenas minha mobilidade, mas minha auto-estima”, resume.
Foi a capacidade de sonhar que o levou a reunir forças, mas a sua inspiração é um pouco mais terrena: “O meu ídolo é o Bruce Lee”, conta, ao mesmo tempo que explica partes da filosofia deste lutador de artes marciais tornado herói dos filmes: “‘Ser água’ é a minha filosofia, e isso quer dizer que devemos ‘adaptar-nos’ ao ambiente e mantermo-nos sempre flexíveis.”
Ainda assim, os obstáculos diários são uma realidade: “Hong Kong não é uma cidade muito acessível... Ainda não é fácil andar livremente numa cadeira de rodas, embora esteja a melhorar”, relata, apesar de notar que existe um problema maior: “Precisamos de mais compreensão e respeito (…) – não de pena.”
No seu caso, diz ter voltado a sentir-se vivo quando “passou a ser outra vez um atleta”, recordando que foi como ter sido ‘acendido’ (do inglês “ignited”). Por isso, baptizou a organização sem fins lucrativos, que criou com a companheira, de Ignite.
No horizonte, além de um exoesqueleto, há mais alturas a escalar, admite entre risos: “Ainda estou a decidir [o que escalar], mas com certeza que será algo com mais do que 309 metros de altura. Pode ser um arranha-céus em qualquer lugar ou uma enorme montanha fora de Hong Kong.” E deixa a dica: “Fiquem atentos!”