Uma semana depois do golpe de Estado na Birmânia, os protestos são “gigantescos” e as bandeiras vermelhas, cor da Liga Nacional pela Democracia, de Aung San Suu Kyi, já não são o único símbolo dos manifestantes. Professores, estudantes, médicos ou advogados em protesto esticam o braço e erguem três dedos, símbolo de resistência e solidariedade inspirado na saga Os Jogos da Fome (The Hunger Games, no título original).
A 1 de Fevereiro, Suu Kyi, líder birmanesa democraticamente eleita em Novembro de 2020, foi detida, e o poder foi tomado pelos militares. “Desprezo completamente o golpe militar e não tenho medo da repressão”, disse Kyi Phyu Kyaw, estudante universitária, à agência France-Presse. “Vou juntar-me todos os dias até que Amay Suu (Mãe Suu) seja libertada”.
Na trilogia de Os Jogos da Fome, o gesto simboliza a rebelião contra o regime totalitário de Panem, num futuro distópico imaginado pela autora Suzanne Collins. Nos seus livros, a população é forçada a entrar numa competição até à morte, transmitida em directo na televisão.
O gesto ultrapassou a ficção e tornou-se popular nas ruas, em manifestações pró-democracia. Em 2014, na Tailândia, seis meses de crise política terminaram num golpe militar que derrubou o Governo eleito democraticamente. Manifestantes em todo o país adoptaram o gesto que se tornou imediatamente um símbolo anti-golpe, e uma forma de resistência pacífica e silenciosa.
Poucas semanas após a tomada de poder, os militares tailandeses proibiram-no e avisaram que iriam deter os que ignorassem os avisos para baixar os braços. “Sabíamos que seria um gesto facilmente associado aos conceitos de liberdade, igualdade e solidariedade”, disse Sirawith Seritiwat, activista tailandês presente nos protestos em 2014, ao The Guardian. “Na altura, a oposição ao golpe parecia semelhante às cenas no filme The Hunger Games, em que as pessoas põem três dedos no ar dirigindo-se ao Presidente Snow”, explicou.
Adorada no seu país, ainda que tenha caído em desgraça internacionalmente devido à perseguição da minoria rohingya, Aung San Suu Kyi e o Presidente Win Myint estão em prisão domiciliária desde o golpe militar. Ambos podem enfrentar até três anos de prisão devido a acusações relacionadas, respectivamente, com a violação de uma vaga lei de importação e de violação das regras de segurança impostas durante a pandemia de covid-19.