A luta pelos apoios aos causídicos em circunstâncias de pandemia, muito discutida, muito abordada, mas muito pouco considerada, teve um efeito nulo, num total descrédito por estes profissionais. Em virtude da pandemia, instalou-se a confusão em sede legislativa no caminho da organização dos tribunais e na organização das diligências, quer a nível presencial, quer por meios electrónicos à distância.
Em primeiro lugar, os tribunais não estão dotados das condições para assegurar diligências efectivas com o rigor que os cidadãos merecem e para um desempenho competente do advogado na sua representação. Em diversas diligências, as plataformas electrónicas não estão em condições, e assim se perde mais um dia de trabalho, muitas vezes com vários quilómetros percorridos.
Todos os dias, os advogados estão expostos ao risco de contágio do novo coronavírus em diligências presenciais que exigem um número considerado de intervenientes processuais. Muitos magistrados aproveitaram a maré da pandemia para apressar o término de muitos processos e eles próprios não estão preparados para esta realidade.
Um advogado que queira fazer o seu trabalho com independência, decoro e profissionalismo tem imensas dificuldades. Por exemplo, muitas vezes, em sede de produção de prova, se o advogado pretender confrontar uma testemunha com um documento do processo, sendo a diligência assegurada por videoconferência, como faz? Resposta: Não faz! Perde-se a qualidade da produção de prova, que deve ser o apanágio da prática da boa justiça nos tribunais. Com isso, diminui-se a qualidade das audiências e a qualidade da justiça.
Chegamos ao ponto de falar pela aplicação móvel WhatsApp, quando as plataformas electrónicas não estão a funcionar, sendo que, nesse caso, a gravação da prova é completamente inútil, pois não é audível mais tarde.
Por outro lado, inquirir uma testemunha presencialmente ou por meios electrónicos à distância é completamente diferente: perde-se a espontaneidade que a mesma deve ter, criando dificuldades não só no trabalho dos advogados, mas, acima de tudo, na apreciação da prova por parte do tribunal, o que pode influenciar a decisão final — a sentença.
Muitos advogados têm, e bem, solicitado adiamentos por questões de várias ordens, tais como saúde, isolamento, parentalidade, mas acima de tudo pela falta de qualidade na boa prática da justiça. Nem todos os tribunais estão coniventes com tal situação, e exigem o andamento dos processos, ainda que sem condições para o efeito.
É verdade que o Estado de direito não pode parar e a justiça também não, mas a pergunta que deve ser feita é: a prática de uma justiça sem apoio, sem meios, defende os cidadãos e o Estado de direito? A resposta, além de lamentável, é óbvia: Não.
A pandemia não pode ser desculpa para tudo, e uma nova suspensão de prazos não vai resolver o problema na sua génese. A confusão está criada e os advogados não podem ter uma bola de cristal para saber a vontade de cada magistrado, nem do próprio Governo.
A suspensão de prazos para a prática de actos processuais e procedimentais pode ser útil em determinadas situações em que os diversos agentes da justiça, magistrados, funcionários judiciais e advogados estão assoberbados de trabalho, mas deveria ser oportunidade para recuperar processos em atraso, “à espera de tempo”.
No rigoroso confinamento de Março de 2020, verificou-se essa recuperação nalguns tribunais. Noutros, o que se verificou foi que nada mexeu e tudo ficou como se o confinamento determinasse uma paragem do tempo. Da mesma forma, da parte dos advogados, houve os interessados em fazer andar os processos e outros interessados em que se mantivessem parados.
Por outro, só falta vincularmo-nos à “promulgação” de leis pela televisão, porque ultimamente é quase o que sucede. Até ao presente, os advogados ainda não tiveram qualquer apoio, mas sem dúvida que não lhes podem retirar a dignidade no seu trabalho, pois quem sofrerá com isso serão os cidadãos. A justiça bateu no fundo, mas como sempre levou os advogados à frente.