Covid-19: oito meses depois das valas comuns, Manaus volta a viver momentos dramáticos
O Brasil está a entrar de forma acelerada na segunda vaga da pandemia, depois das semanas festivas em que muita gente se deslocou às praias.
Há pouco mais de meio ano, vinham de Manaus algumas das imagens mais chocantes da pandemia da covid-19 no Brasil. A maior cidade da Amazónia volta agora a ser um dos locais mais castigados pela segunda vaga da pandemia, fortalecida com uma ainda desconhecida nova variante do vírus.
A propagação do novo coronavírus pela cidade de dois milhões de habitantes está a esgotar rapidamente a capacidade hospitalar da rede local. Só nos primeiros 12 dias do ano, Manaus registou 2221 novas hospitalizações, que é um número que supera os internamentos durante todo o mês de Abril, quando se verificou o pico durante a primeira vaga.
Só na quarta-feira foram sepultadas 198 pessoas na cidade, superando o recorde de 26 de Abril do ano passado, quando 167 pessoas foram enterradas, obrigando à abertura de valas comuns por falta de espaço nos cemitérios, de acordo com o site Amazonas Atual.
No início desta semana, a taxa de ocupação da rede pública e privada superava os 90%, diz a Folha de São Paulo. Para além de falta de camas para internamento, os hospitais também relatam a falta de oxigénio e os profissionais de saúde vivem momentos tão ou mais dramáticos do que na primeira vaga.
“Os pacientes que conseguirem sobreviver, além de tudo, devem ficar com sequelas cerebrais permanentes”, diz à Folha o investigador da Fundação Oswaldo Cruz da Amazónia, Jesem Orellana. Sem oxigénio para socorrer os doentes com falhas respiratórias, os hospitais tornaram-se “câmaras de asfixia”, afirma o especialista. De acordo com o site G1, o governo estadual está a receber cilindros de oxigénio de outros estados.
No Hospital 28 de Agosto, um médico descreveu, sob anonimato, “um cenário de guerra com soldados cansados”. Esta quinta-feira, já começaram a ser transferidos doentes para hospitais noutros estados por avião.
A situação grave vivida em Manaus levou as autoridades locais a cancelar a realização das provas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), de acesso ao ensino superior. “Seria uma temeridade abrir as escolas no momento em que nós estamos”, disse o presidente da Câmara Municipal, David Almeida.
O governador Wilson Lima decretou o recolhimento obrigatório em Manaus entre as 19 horas e as 6 horas a partir desta quinta-feira.
Um dos aparentes motivos para o crescimento acelerado dos contágios nesta região é o aparecimento de uma nova estirpe do vírus SARS-CoV-2 detectada pela primeira vez no Japão, mas que circula na Amazónia. Ainda há muito por estudar em relação a esta variante do vírus, mas os especialistas suspeitam que a mutação encontrada poderá torná-lo mais contagioso.
Crescimento em São Paulo
Também em São Paulo, cidade mais populosa do Brasil, os números de casos, internamentos e mortes causados pela covid-19 estão a disparar como resultado das deslocações de pessoas durante o período festivo do final do ano. No Brasil, o Natal e o fim de ano coincidem com o pico das férias de Verão, e muita gente aproveita essa altura para sair das cidades para o litoral.
Nas últimas duas semanas, os internamentos subiram 19% e a taxa actual de ocupação das camas hospitalares está em torno dos 66%, segundo a Folha de São Paulo. O número de mortes causadas pela pandemia quase duplicou nas duas últimas semanas na cidade – morreram 827 pessoas entre 29 de Dezembro e 12 de Janeiro.
Os especialistas receiam um novo período de enorme pressão para os hospitais paulistas. “É uma bomba que a gente estava esperando. Se continuar alto assim, comprometeremos Fevereiro também com hospitais lotados e alta de casos mesmo com a vacinação”, disse o professor da Universidade Estadual Paulista, Wallace Casaca.
Ao todo, morreram mais de 206 mil pessoas e mais de oito milhões foram infectadas desde o início da pandemia no Brasil.