Covid-19: China condena ex-advogada que noticiou surto em Wuhan nas redes sociais

Zhang Zhan foi acusada de “causar distúrbios” e “problemas”. Através das redes sociais, partilhou informação sobre a resposta de Wuhan à pandemia de covid-19.

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Em Hong Kong, há manifestantes a pedir a libertação de Zhang Zhan, detida desde Setembro Reuters/TYRONE SIU

Uma ex-advogada chinesa que através das redes sociais noticiou o surto inicial de covid-19 em Wuhan, no centro da China, foi condenada nesta segunda-feira a quatro anos de prisão por um tribunal de Xangai.

Zhang Zhan viajou para Wuhan, em Fevereiro, para, na qualidade de jornalista independente, divulgar notícias sobre o surto e a subsequente campanha de prevenção contra a doença e o tratamento dos pacientes. A advogada, de 37 anos, desapareceu em Maio, sendo mais tarde revelado que fora detida pela polícia em Xangai.

Foi condenada por “causar distúrbios” e “arranjar problemas”, uma acusação frequente contra jornalistas e activistas dos direitos humanos na China, segundo o jornal Apple Daily, que citou um dos advogados.

De acordo com o The Guardian, no documento da acusação lê-se que Zhang ​enviou “informação falsa, em texto, vídeos e outros meios através da Internet” e “aceitou entrevistas com meios internacionais, como a Free Radio Asia e o Epoch Times, e especulou de forma maliciosa acerca da epidemia de covid-19 em Wuhan”.

De acordo com a Amnistia Internacional, o seu trabalho em Wuhan focou-se no relato das prisões de jornalistas independentes e o assédio a familiares de vítimas do novo coronavírus.

A organização Defensores dos Direitos Humanos na China revelou, em Setembro, que Zhang Zhan tinha sido presa por informar que os cidadãos de Wuhan receberam comida estragada durante as 11 semanas de confinamento da cidade, ou que foram obrigados a pagar para realizarem testes de detecção do coronavírus. Zhang Zhan recusou-se a admitir as acusações, considerando que as informações que publicou em plataformas chinesas como o WeChat ou nas redes sociais Twitter e YouTube não deveriam ter sido censuradas.

Em Setembro, Zhang Zhan começou uma greve de fome, o que fez com que ficasse “muito fraca”, segundo a sua defesa. Em Dezembro, e de acordo com os últimos relatos do seu advogado, estaria a ser alimentada por sonda contra a sua vontade. Teria, também, as duas mãos presas. De acordo com a sua equipa de defesa, pretende continuar a sua greve de fome, “mesmo que morra na prisão”.

Vários outros jornalistas independentes que viajaram para Wuhan no início do surto foram detidos ou desapareceram na China, numa altura em que as autoridades começaram a restringir a cobertura e a imprensa oficial enalteceu a resposta de Pequim como eficaz e oportuna.

Em Fevereiro, Chen Qiushi, que transmitiu vídeos ao vivo de Wuhan durante o bloqueio da cidade e difundiu reportagens nas redes sociais, desapareceu também. Dois outros jornalistas independentes — Li Zehua e Fang Bin — também foram detidos após cobrirem o surto em Wuhan. No entanto, Zhang Zhan foi a primeira jornalista a ser formalmente condenada a uma pena de prisão.

A China é o país que mais jornalistas detém no mundo, segundo a organização Repórteres sem Fronteiras. O Governo chinês controla a imprensa doméstica, enquanto bloqueia a maioria dos meios de comunicação estrangeiros, através de um sistema de censura online. Em Março, a China expulsou jornalistas dos órgãos New York Times, Washington Post e Wall Street Journal, num ataque sem precedentes contra a imprensa estrangeira. 

Embora surtos esporádicos continuem a surgir, a China controlou o vírus, permitindo ao país retomar uma relativa normalidade.