Ninguém é insubstituível?

Qualquer trabalho técnico, rotineiro, repetitivo, com mais ou menos expertise será sempre realizado por um bom profissional, com formação e treino adequado à função. Isto é válido para operários a gestores de topo, directores de escolas ou professores.

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"Um bom profissional é aquele que aplica os seus conhecimentos à realidade que vive" Nelson Garrido

Ninguém é insubstituível? Habituámo-nos a ouvir esta frase tão feita e reconhecida como verdade absoluta, que o seu oposto, apresenta-se igualmente tão verdade.

Um dos melhores exemplos de que somos todos insubstituíveis são todos os artistas da história da Humanidade e que alguma forma, em alguns momentos, nos faz arrepiar até os pensamentos, ou seja, causam-nos experiências estéticas inesquecíveis, que queremos, por vezes, repetir. São insubstituíveis. O que seria o cubismo sem Picasso? Ou do Modernismo português sem Almada Negreiros? Ou sem Fernando Pessoa? Viveríamos na mesma com o grande Amadeu de Souza Cardoso e com Mário de Sá-Carneiro. Mas não era a mesma coisa. Cada um de nós faz a diferença e é tão necessário como qualquer outro. Mas em que é que fazemos a diferença? Qualquer trabalho técnico, rotineiro, repetitivo, com mais ou menos expertise será sempre realizado por um bom profissional, com formação e treino adequado à função. Isto é válido para operários a gestores de topo, directores de escolas ou professores.

Um amigo de longa data, há um bom tempo, contou-me uma história, mais ou menos assim: a sua esposa estava no processo de contratar uma empregada doméstica. Das muitas que entrevistou, houve uma, a que ficou com o lugar, que na hora de falarem sobre o vencimento e perguntada sobre quanto pensava que devia ganhar, ela respondeu: “Depende, se é com penso ou sem penso.” A esposa perguntou: “Com penso ou sem penso?” E a candidata respondeu: “Sim, se é para eu fazer o que a senhora me disser, sem ser preciso pensar, é um preço, se é para eu pensar, é outro.” Esta história ilustra bem o valor a nossa individualidade. O que faz a diferença é o modo como fazemos o nosso trabalho, como pensamos sobre ele e como investimos para o realizar de forma oportuna, certeira, que seja proveitoso para todos.

Um bom profissional é aquele que aplica os seus conhecimentos à realidade que vive, aos desafios que enfrenta e que toma decisões de acordo com o que o seu pensamento e coração ponderam. E o modo como o fazemos, torna-nos irrepetíveis e únicos. A forma como tratamos os outros, as oportunidades que agarramos e que proporcionamos aos outros, o tipo de desenvolvimento que queremos e a forma como nos posicionamos no ‘nosso mundo’. É certo que haverá sempre lugar para todos, e que muitos são exemplo de profissionalismo e rigor, pelo modo como cumprem arduamente as suas tarefas rotineiras. O seu sentido de responsabilidade e do dever revelam a sua precisão e entrega. Outros mais ousados e disruptivos geram boas crises que fazem avançar. Outros ainda, mais virados para fora, pressentem o futuro e adequam processos e procedimentos numa antecipação de sucesso. Outros mais ‘cabeça no ar’, equilibram a rotina e o sucesso e trazem-nos o bem-estar.

Todos somos precisos e todos somos insubstituíveis, fazendo a diferença, deixando marcas. É assim no mundo do trabalho. É assim no mundo das relações humanas. Assim são as escolas. Cheias de diversidade. No mundo do trabalho, esta dimensão de ser insubstituível ganha mais relevância quando falamos de colaboradores com impacto na organização. Quem faz as escolas, como qualquer outra organização, são as pessoas. Quando estas nos falham, ficamos sem chão. Já não é a mesma coisa.

Como podem as lideranças equilibrar estes benefícios para os clientes? Como e quando descobrimos, no nosso percurso, que o modo como tratamos os que connosco fazem caminho, equipa, grande ou pequena, impacta os nossos clientes? Ser uma organização de bem-estar e de bem viver é gerar competitividade e sucesso. Trazer ao de cima o que de bom e único existe em cada um é uma grande mais-valia para as organizações. Investir nas pessoas, é investir na organização e nos serviços que prestamos.

Assim também é nas escolas. Partindo do princípio do bem, todos acreditamos que queremos o melhor possível. A diferença está nas estratégias para alcançar esse bem. Acreditamos que todos queremos ter bons alunos a matemática. A diferença está no caminho que vamos trilhar para lá chegar. Diferentes pessoas consideram diferentes estratégias.

É claro que a performance nos deve preocupar. E é disso que escrevo. Uma boa performance está directamente relacionada com a diminuição do risco e das fragilidades das pessoas, e a forma como lidamos com estas adversidades. E melhor ensino está directamente relacionado com bons professores e boas condições. Daí que criar condições de trabalho para todos, neste tempo de ainda incerteza, sem qualquer anúncio válido a 100% de ‘novo normal’, pedir e aceitar as sugestões e pensamento de cada um, cuidar da sua protecção, da sua saúde e bem-estar físico e psicológico e das suas famílias, dando um propósito ao trabalho neste tempo em que se pede muitas coisas nunca antes vistas, são dicas de como podemos atravessar estes tempos. Com todos, com cada um, único, insubstituível.

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