Visons com covid-19 voltam a pôr em causa o uso de peles pelas marcas de luxo
À medida que aumentam as perspectivas de que a criação de visons pode atrapalhar os esforços para combater a pandemia do coronavírus, o futuro da indústria de peles da Europa parece menos certo do que nunca.
Nos últimos anos, algumas casas de luxo têm aderido ao movimento anti-peles, como é o caso da Versace, Gucci e Prada. Mas o mais recente golpe mortal na indústria acabou de ter a assinatura da pandemia provocada pela covid-19, por meio de uma mutação do vírus encontrado no vison.
Os animais surgiram como disseminadores altamente eficientes do coronavírus, potencialmente complicando os esforços para controlar uma pandemia que já ceifou mais de um milhão de vidas humanas. Na semana passada, a Dinamarca revelou ter encontrado uma variante do vírus que as autoridades temem que possa ser tão destrutiva que justificou a ordem de extermínio de toda a população de visons do país — 17 milhões de animais.
A primeira-ministra Mette Frederiksen reconheceu que eliminar todos os visons reprodutores significa que a indústria pode não se recuperar na Dinamarca, que está entre os maiores produtores mundiais de peles. “A minha posição continua a ser que os visons devem ser abatidos, porque representam um risco para a saúde humana”, defendeu, na terça-feira, em Copenhaga. Mais de dez milhões de animais já foram abatidos na Dinamarca, de acordo com estimativas da indústria.
À medida que aumentam as perspectivas de que a criação de visons pode atrapalhar os esforços para combater a pandemia do coronavírus, o futuro da indústria de peles da Europa parece menos certo do que nunca. Fora da Dinamarca, outras nações produtoras de visons estão a observar de perto o que ali se passa, de maneira a também planearem os seus próximos passos.
“Estamos alarmados com as notícias da Dinamarca”, declara Nadezhda Zubkova, directora-executiva da Associação Nacional de Criadores de Peles de Animais da Rússia. Na Suécia, as autoridades dizem que a transmissão do vírus entre visons está sob controlo. Mas cerca de um quarto das quintas de visons suecas tiveram surtos, e a indústria sabe que não pode ignorar os riscos. Jorgen Martinsson, chefe da sueca Mink, disse num post no Facebook: “Nunca devemos fugir das questões difíceis.”
A verdadeira mudança pode vir de dentro da própria indústria de luxo. Diana Verde Nieto, co-fundadora da Positive Luxury, que avalia o impacto social e ambiental de marcas sofisticadas, diz que a “disseminação do vírus entre a população de visons na Dinamarca provavelmente será outro sinal de alerta”. Acrescentando: “O mundo como um todo tem de repensar a sua relação com a natureza.”
O ano passado, o LVMH estabeleceu uma directiva de fornecimento de matérias-primas que visa proteger a biodiversidade. Enquanto o maior conglomerado de luxo do mundo permite que as suas marcas decidam se usarão ou não peles, um dos objectivos desta nova política é possibilitar o rastreamento das peles até às quintas de criação.
Mesmo antes de o vison ser associado às mutações do coronavírus, a indústria enfrentava um futuro sombrio. A produção global de visons caiu para cerca de 45 milhões de peles, quase metade do recorde histórico de 87 milhões em 2014, de acordo com a Fur Europe, um grupo de lobby para a indústria em Bruxelas.
A organização defende a indústria e diz que o comércio de peles “não desempenhou nenhum papel significativo” na disseminação da doença e que os produtores de visons aumentaram os exames desde o início da pandemia, na Primavera. Argumenta ainda que há espaço no mundo para as peles. “A procura por pêlo natural é forte”, declara a Fur Europe em comunicado, na semana passada, acrescentando que o segredo está nos produtos reutilizáveis, em vez de no “comprar hoje e deitar fora”.
A indústria de peles está já habituada a combater campanhas negativas e, por isso, está a preparar-se para esta luta. Contudo, agora, não é fácil ignorar a evidência científica. Como disse Kare Molbak, o principal epidemiologista dinamarquês, numa entrevista ao Politiken, “os visons são facilmente infectados pelo coronavírus e, quando isso sucede, espalha-se à velocidade da luz”, chegando aos himanos, “o que torna praticamente impossível lidar com a propagação durante uma pandemia”. Ou seja: “É uma tempestade perfeita.”