Vacina da Pfizer/BioNTech: foi uma “boa notícia”, mas ainda há muitas questões por responder
Imunologistas e virologistas encararam o anúncio da Pfizer e da BioNTech como uma notícia entusiasmante, mas pedem cautela e notam que há muito que ficou por conhecer. Ainda falta saber, por exemplo, se a vacina funciona bem em diferentes grupos de participantes do ensaio.
Esta segunda-feira, a farmacêutica Pfizer e a sua parceira alemã BioNTech anunciaram que os resultados preliminares da sua potencial vacina contra a covid-19 revelam que tem uma eficácia de 90%. Mas o que representam estes resultados? É mesmo um grande avanço na investigação das vacinas? Que questões ficaram por responder?
Quantas vacinas estão a ser testadas em humanos?
Há 47 candidatas a vacinas em ensaios clínicos (em pessoas) e dez estão na fase 3 (em que é feita a avaliação dos resultados do fármaco em milhares de voluntários), segundo documentação da Organização Mundial da Saúde de 3 de Novembro.
Quais foram os novos resultados sobre uma das vacinas anunciados esta semana?
A farmacêutica Pfizer e a sua parceira alemã BioNTech anunciaram esta segunda-feira que a sua potencial vacina “teve sucesso” na fase 3 dos ensaios clínicos. Contudo, estes são resultados preliminares e só foram anunciados num comunicado de imprensa. Ainda não foram publicados em nenhuma revista científica.
No comunicado, refere-se que foram analisados 94 casos de covid-19 que ocorreram nos participantes do estudo depois de terem recebido duas doses da vacina ou do placebo. Verificou-se que a vacina tinha tido uma eficácia de mais de 90% sete dias depois da segunda dose. Como as duas doses são espaçadas por três semanas, refere-se que os resultados sugerem que a protecção é conseguida 28 dias depois da vacinação se iniciar. A farmacêutica não refere quantos desses casos receberam as doses da vacina e o placebo.
Destaca-se ainda no comunicado que o estudo envolve mais de 43 mil participantes de diferentes contextos e não se encontraram indícios de qualquer preocupação ao nível da segurança. “A segurança e dados adicionais de eficácia continuam a ser recolhidos”, acrescenta-se.
O que se segue?
O estudo irá continuar até que 164 casos de covid-19 (no total) sejam detectados entre os participantes para que se possam recolher mais dados, refere-se no comunicado. Além disso, acompanhar-se-ão os participantes no estudo durante dois anos após a vacinação para que se possa explorar a segurança a longo prazo ou se lhes dá protecção.
A Pfizer afirma ainda que poderá pedir uma autorização de uso de emergência desta vacina à FDA (a agência norte-americana para a saúde e alimentação) nas próximas semanas. De acordo com o jornal britânico The Guardian, entidades reguladoras já afirmaram que dariam luz verde a uma vacina que tivesse pelo menos 50% de eficácia (protegendo metade das pessoas que a tomassem).
Os resultados anunciados são mesmo um avanço?
Perante o que foi descrito no comunicado, muitos especialistas parecem concordar que os resultados são entusiasmantes, mas também pedem precaução. Por enquanto, os resultados são preliminares e apenas foram divulgados num comunicado de imprensa. Além disso, os ensaios ainda não foram finalizados.
“Precisamos de ver os resultados no final, mas, ainda assim, o meu entusiasmo não diminuiu. Isto é fantástico”, reagiu ao site da revista Nature Florian Krammer, virologista da Escola de Medicina Icahn do Hospital do Monte Sinai (Nova Iorque), que é um dos mais de 40 mil participantes do estudo. Peter Hotez, investigador na área das vacinas da Faculdade de Medicina Baylor, prefere dizer que são “aparentemente boas notícias”, referiu ao site da revista Science, notando que é difícil fazer uma leitura dos resultados através de um comunicado de imprensa.
Por sua vez, Eric Topol, director do Instituto de Investigação Translacional Scripps (nos Estados Unidos), considera que, mesmo que a vacina não seja tão eficaz quando os ensaios terminarem, a eficácia ficará, provavelmente, acima dos 50%. “Acho que é uma conquista extraordinária, mesmo que não tenhamos muitos detalhes, porque não havia qualquer garantia da eficácia da vacina antes de termos a primeira leitura de um ensaio.”
Mas também se pede mais cautela. “Há ainda muitas questões por responder”, assinalou à Nature Jesse Goodman, da Universidade Georgetown (Estados Unidos) e antigo cientista principal da FDA.
Que questões ficaram por responder?
A informação divulgada nesta fase não permite responder a questões, por exemplo, sobre quanto tempo dura a imunidade desencadeada pela vacina, se pode evitar casos de covid-19 grave ou se pode diminuir as taxas de transmissão se for amplamente distribuída pela população.
Sobre a eficácia duração da imunidade, Rafi Ahmed (imunologista da Universidade Emory, nos EUA) refere que, com base nos dados publicados anteriormente, muitos participantes ainda terão níveis elevados de anticorpos protectores no seu sangue. “Para mim, a principal questão é o que acontecerá seis meses mais tarde, ou mesmo três meses mais tarde.” Essa resposta poderá surgir na continuação do ensaio ou de respostas imunitárias de pessoas que participaram nos ensaios iniciais da vacina da Pfizer e da BioNTech, indica o imunologista. Mesmo assim, diz que, apesar de pouco se saber sobre a eficácia da duração da imunidade, será improvável que isso “atrapalhe o seu uso”. “Não acho que alguém deva dizer: ‘Bem, só vou tomar uma vacina que me protegerá durante cinco anos’.”
Eric Topol e outros investigadores frisaram à Nature que falta saber detalhes sobre “a natureza das infecções que a vacina pode proteger”, isto é, se é apenas para casos ligeiros de covid-19 ou também para casos moderados e graves. Também não é claro se a vacina pode evitar que pessoas assintomáticas ou com poucos sintomas transmitam o vírus, o que poderia acelerar o fim da pandemia. Contudo, Florian Krammer nota: “Será difícil determinar se a vacina da Pfizer, ou outras em ensaios na fase final, pode consegui-lo, porque isso envolveria testes de rotina aos participantes. Não o podemos fazer com 45 mil pessoas.” O cientista destaca que outro detalhe que ainda falta saber se a vacina funciona bem em diferentes grupos de participantes do ensaio. “Ainda não sabemos se funciona na população que mais precisa, a idosa.”