O potencial de aquecimento global diminuiu em Portugal. Ausência de seca ajudou

Ausência de seca no país foi o principal factor para que Portugal retomasse a tendência interrompida em 2015 e 2017, já que o peso das emissões provenientes da área da energia foi bastante menor, revelam os dados do INE.

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Quando o país enfrenta uma seca grave, o potencial de aquecimento global do país aumenta, como aconteceu em 2017 Rui Gaudêncio

O potencial de aquecimento global de Portugal diminuiu em 2018 retomando uma tendência que já se confirmava desde 2008, mas que fora interrompida em 2015 e 2017. No ano passado, os dados revelados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) relativos a 2017 apontavam o dedo à seca que assolara o país nesse ano, e que levara a um maior consumo de energia de fontes não renováveis com o principal responsável pelo mau resultado. Em 2018, com um “ano normal”, em termos de pluviosidade, o potencial de aquecimento global caiu 4,5%, apesar de a actividade económica ter crescido 2,7%.

É um dado positivo, mas não surpreendente. No ano passado, quando o INE divulgou que o potencial de aquecimento global do país tinha aumentado 6,9% em 2017, Francisco Ferreira da Zero lembrava ao PÚBLICO a seca que se viveu no país e também os gigantescos incêndios (causadores do aumento de emissões) como responsáveis por esse valor, antecipando que existiria “uma enorme diferença” quando se olhasse para os dados de 2018 e 2019.

Os primeiros foram disponibilizados esta quarta-feira e confirmam isso mesmo. O INE revela que os três principais indicadores ambientais analisados desceram todos em 2018: o potencial de aquecimento global caiu 4,5%, o de acidificação decresceu 2,4% e o de formação de ozono troposférico diminuiu 1,6%. Apesar disto, a actividade económica cresceu, em termos reais, 2,7%, o que, feitas as contas, são boas notícias: houve “uma redução do impacto ambiental com o crescimento económico, contrariamente ao que tinha sucedido em 2017”, lê-se no relatório. A notícia menos positiva é que, apesar da diminuição, o potencial de aquecimento global ainda continua acima dos valores de 2013 e 2014, que foram os mais baixos desde 2010.

Os números de 2018 indicam que o potencial de aquecimento global atingiu 66,9 milhões de toneladas de equivalente de dióxido de carbono (CO2), com a emissão dos principais gases de efeito de estufa a baixarem todos em comparação com o ano anterior: 6% no caso do CO2, 0,8% no óxido nitroso (N2O) e 0,5% no metano (CH4). Já as emissões dos outros gases aumentaram 4,4%, refere-se no documento.

Sem novidade continuam também os principais sectores responsáveis pelas emissões globais e de cada um destes gases. A área da energia, água e saneamento, com 32,2% das emissões contabilizadas em 2018 continua a ser a maior responsável pela libertação destes gases (como acontece desde 1999), mesmo tendo reduzido as suas emissões em 11,4%, comparativamente com o ano anterior. Se se olhar exclusivamente para o CO2, este sector da actividade económica emitiu 16,8 milhões de toneladas deste gás e a indústria 14,6 milhões de toneladas, o que significa que, combinados, estes dois sectores foram responsáveis por 61,3% das emissões de CO2 para a atmosfera. 

No caso do metano e do óxido nitroso, são as actividades mais ligadas à produção alimentar - agricultura, silvicultura e pesca - as grandes emissoras, congregando, respectivamente, 75,9% e 48,1% das emissões destes gases.

Na análise aos dados recolhidos, o INE salienta que, apesar do aumento da produção de energia eólica e solar, o país ainda está muito dependente da fonte hídrica para a produção de energia eléctrica, o que faz com que a situação meteorológica afecte de forma muito marcante a relação entre o potencial de aquecimento global e a actividade económica. No ciclo analisado, sempre que houve uma “dissociação” idêntica à deste ano - diminuição do primeiro e aumento do segundo - foi quando o país não enfrentou uma seca relevante. E basta olhar para os dois últimos anos analisados para perceber esta ligação. Em 2018, o valor médio da precipitação anual em Portugal correspondeu a 107% do valor considerado normal. Em 2017, pelo contrário, esse valor correspondeu a apenas 60% do normal.

O ano de 2018 foi também aquele em que a intensidade carbónica da economia - total de emissões necessárias para a obtenção de todos os bens e serviços produzidos, obtida na relação entre os gases emitidos e o produto interno bruto (PIB) - mais diminuiu na última década, tendo caindo 7,2% em relação ao ano anterior. De novo, foi a redução de 18,4% de emissões do potencial de aquecimento global da área da energia, água e saneamento que mais pesou neste valor, apesar de - alerta o INE - este ser o único sector em que essas emissões aumentaram na última década, crescendo 20%. Em sentido inverso, houve uma diminuição na indústria (23,4%), nos transportes, informação e comunicação (9,2%), na construção (6,9%) e na agricultura, silvicultura e pesca (4,5%).

As contas das emissões atmosféricas feitas pelo INE são utilizadas na construção do indicador que permite monitorizar a meta europeia que estabelece que até 2030 deverá ocorrer uma modernização das infra-estruturas e uma reabilitação das indústrias que permitam “torná-las sustentáveis, com maior eficiência no uso de recursos e maior adopção de tecnologias e processos industriais limpos e ambientalmente correctos, com todos os países actuando de acordo com as respectivas capacidades”.

Desde 2010 que Portugal tem visto diminuir as emissões de CO2 por unidade de valor acrescentando - com excepção dos anos 2015 e 2017 -, mas não ao ritmo que tem acontecido na União Europeia. Entre 2010 e 2018, a diminuição nacional foi de 8,2%, quando a média dos países da UE chegou aos 21,9%. Os valores de 2018 aproximam, contudo, o país um pouco mais desta média, com Portugal a ver cair em 8,5% as emissões de CO2 por unidade de valor acrescentado, e a diminuição da média dos países da UE a não ir além dos 4,2%.

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