Número de vagas para formação especializada de médicos vai ser o maior de sempre

Auditoria realizada a pedido da Ordem dos Médicos revela várias fragilidades e problemas no processo de atribuição de vagas para formação especializada, como a falta de uma base de dados ou sistema informático de suporte.

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Nelson Garrido

O número de vagas para a formação especializada atribuído pela Ordem dos Médicos vai ser “o maior de sempre” este ano, aumentará algumas dezenas e deverá ficar perto de 1900, revela o bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Miguel Guimarães. Em 2019, o mapa de vagas para internato ascendeu a 1830, deixando sem hipótese de formação especializada centenas de jovens médicos, um problema que se tem vindo a agravar de forma significativa de ano para ano.

Este ano, a OM já identificou cerca de 1850 vagas e, até 15 de Agosto, data limite para entregar o mapa ao Ministério da Saúde, o bastonário acredita que serão identificadas mais algumas dezenas. “Queremos potenciar as capacidades formativas” das unidades de saúde, explicou Miguel Guimarães.

A notícia foi avançada ao PÚBLICO no dia em que a OM apresentou a auditoria ao processo de avaliação da idoneidade e capacidades formativas de 2019 realizada por uma consultora externa. As vagas para formação especializada, o chamado internato médico, são todos os anos abertas pelo Ministério da Saúde com base na identificação da idoneidade e capacidade de formação das unidades de saúde por parte da OM e posteriormente aprovadas pelo ministério liderado por Marta Temido.

Apesar de o número de vagas atribuído ser nos últimos dois anos muito semelhante ao que é pedido pelas unidades de saúde, no ano passado, contabilizam os autores da auditoria, foram atribuídas menos 29 vagas. As especialidades mais penalizadas foram a ginecologia, a cirurgia geral, a oftalmologia e a urologia e, pelo contrário, a pediatria foi beneficiada, ao ser contemplada com mais 30 vagas do que as solicitadas. No total, no ano passado o Ministério da Saúde autorizou 1830 vagas para internato médico em todo o país, menos três do que a OM.

Os autores da auditoria realizada pela consultora Deloitte concluem que há várias fragilidades e problemas em todo este processo, nomeadamente a existência de abordagens distintas na atribuição de capacidades formativas por parte dos diversos colégios de especialidade da OM, atrasos no envio de inquéritos e falta de resposta de diversos órgãos do Ministério da Saúde, além da ausência de uma base de dados ou sistema informático de suporte. Enfatizam, a título de exemplo, que 40% do total dos inquéritos realizados pelas comissões regionais do internato médico, organismos do Ministério da Saúde, foram enviados fora do prazo.

“Há falhas do Ministério da Saúde e dos órgãos que dele dependem e também da Ordem dos Médicos”, reconhece Miguel Guimarães, que frisa que vai ser necessário uniformizar os critérios de idoneidade e ter este processo informatizado e publicado “forma transparente” no site da Administração Central do Sistema de Saúde.

A auditoria permitiu ainda perceber que há especialidades cujos programas de formação foram revistos e aprovados há muitos anos, e que estão desactualizados, como é o caso da pediatria (1996) e da otorrinolaringologia (1999/2000).

No final de Novembro passado, uma auditoria semelhante pedida pelo Ministério da Saúde a outra consultora externa, a EY, concluía já que a avaliação das capacidades de formação de médicos no SNS tem sido subjectiva e pouco documentada, mas as críticas eram dirigidas sobretudo à Ordem dos Médicos.

O relatório dessa auditoria, que avaliou os procedimentos que estão na base da atribuição de vagas para o internato médico, apontava várias falhas no processo, como a falta de uniformização e documentação, o que aumenta a ineficiência, além de tornar a avaliação subjectiva.

“Não se verificou a existência de práticas uniformes e documentadas de revisão periódica dos critérios de idoneidade e capacidade por parte da Ordem do Médicos. Alguns colégios de especialidade assinalaram que existem critérios pouco adequados face à evolução e contexto actual da sua especialidade, tendo sido referido que os critérios se encontram em revisão”, assinalava-se no documento.

Manual de regras

Os autores da auditoria sugeriam a criação de um manual de regras e procedimentos com a metodologia de trabalho e as actividades e que permita uniformizar o processo entre as várias entidades envolvidas. Propunham ainda uma uniformização dos processos de revisão dos questionários e dos critérios de avaliação da idoneidade e capacidade formativa pela OM e que se torne obrigatório que todos os serviços preencham os questionários de idoneidade para “melhorar a clareza do processo e a adequação à realidade das especialidades” médicas.

A ministra da Saúde sublinhou na altura que as conclusões desta avaliação eram apenas “o início do trabalho que há a realizar” para melhorar a definição de vagas. A auditoria, confirma, “veio recomendar uma maior transparência e uma maior clarificação e até informatização desse processo para não só garantir que eventuais capacidades que existam e que não estão a ser aproveitadas não possam o ser”. O documento serve também, segundo a ministra, para que “todos fiquemos tranquilos e informados sobre a forma com se atribuem” os procedimentos que desencadeiam o internato médico”.

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