Coronavírus: confirmada primeira morte por covid-19 em Portugal
Homem de 80 anos tinha outras patologias associadas. Mário Veríssimo foi massagista no extinto Estrela da Amadora e estava “há já vários dias” internado no Hospital de Santa Maria.
A ministra da Saúde, Marta Temido, confirmou na tarde desta segunda-feira a primeira morte por covid-19 em Portugal: trata-se de um homem de 80 anos, que se encontrava internado “há já vários dias” no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, um dos hospitais de referência para o tratamento desta doença.
Apresentando as suas condolências à família e amigos da primeira vítima por covid-19, Marta Temido disse apenas que o octogenário tinha várias doenças associadas. A ministra da Saúde agradeceu ainda “o empenho” dos profissionais de saúde que cuidaram deste doente — e a todos os outros que trabalham no Serviço Nacional de Saúde.
A primeira vítima mortal do coronavírus chama-se Mário Veríssimo e tinha sido massagista do extinto Clube de Futebol Estrela da Amadora. O Clube Desportivo Estrela confirmou a identidade do homem de 80 anos, deixando-lhe uma última mensagem de gratidão no Twitter. "Lutou, batalhou, deu o melhor de si, mas não conseguiu driblar o maldito coronavírus que acabou por derrotá-lo num último desafio”, escreveu o clube.
A directora-geral da Saúde, Graça Freitas, afirma que é expectável que o número de mortes aumente, mas que os serviços de saúde irão fazer de tudo para que isso não aconteça: “Faz parte da história da doença”, afirmou, reforçando que a taxa de mortalidade da doença “é superior a 2% em todo o mundo”.
Há 18 doentes internados nos cuidados intensivos, adiantou Graça Freitas, sem precisar quantos estão em estado crítico. “Todos inspiram cuidados”, disse.
Minutos após se ter tornado conhecida a primeira morte por covid-19 em Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa anunciou as suas condolências à família do doente. “O Presidente da República apresenta os seus sentidos pêsames à família da primeira vítima mortal da pandemia da covid-19 em Portugal, cujo falecimento acaba de ser confirmado pelas autoridades de Saúde”, lê-se na nota publicada no site da Presidência da República.
Horas mais tarde foi a vez de António Costa se pronunciar sobre o assunto, referindo que este é “um momento de respeito” que deve “servir também para reforçarmos a consciência colectiva dos riscos que corremos”.
“Façamos tudo o que depende de nós, enquanto comunidade, para contermos esta pandemia”, escreveu no Twitter. “À família e amigos, apresento as minhas condolências.”
Taxa de letalidade mais elevada do que a gripe
Ainda se sabe pouco sobre a doença, mas, de acordo com os dados conhecidos, a Organização Mundial da Saúde estima que a taxa de letalidade da covid-19 seja de 3,4%.
As comparações mais comuns são entre a covid-19 e a gripe sazonal. No entanto, no caso da covid-19 a taxa de letalidade é muito superior: em todo o mundo, a gripe mata menos de 0,01% dos doentes.
A pandemia de gripe de 1918 — conhecida como “gripe espanhola” — seria uma comparação mais justa: estima-se que tenha matado 2% a 5% dos doentes.
De acordo com os epidemiologistas que falaram ao New York Times no início de Março, a taxa de letalidade apresentada pela Organização Mundial da Saúde pode ser demasiado elevada. Há vários factores em jogo, mas esses especialistas estimam que uma taxa de letalidade de 1% dos doentes seja mais realista.
Os cálculos da taxa de letalidade são feitos com recurso ao número total de infectados em todo o mundo e o número de mortes registadas. De acordo com os últimos dados, havia mais de 170 mil infectados em todo o mundo e morreram pouco mais de 7000 pessoas.
Tanto quanto se sabe actualmente, quase 78 mil recuperaram da doença que, para uma parte da população, vai manifestar-se apenas com sintomas leves de pneumonia ou até mesmo de forma assintomática. É o que acontece com a gripe sazonal, com 13% a 19% dos doentes a não apresentarem sintomas.
Isso pode levar a que muitas pessoas não sejam sequer testadas para o novo coronavírus, enviesando o número total de infectados — que, caso seja superior, dá origem a uma taxa de letalidade menor.
Por outro lado, muitas mortes por coronavírus podem não estar a ser registadas em todo o mundo. Por exemplo, em Espanha, um idoso internado com pneumonia só foi testado para o novo coronavírus depois da morte — e o teste foi positivo. Caso o número real de mortes seja superior ao que os registos mostram, é normal que a taxa de letalidade aumente também.
Idosos e doentes são grupo de risco. Mulheres morrem menos
O que se sabe até agora é que os idosos e os doentes são o grupo de maior risco. “As pessoas mais velhas e as pessoas com problemas médicos prévios (como hipertensão arterial, doenças coronárias, pulmonares, cancro ou diabetes) parecem desenvolver a doença de forma mais séria do que os outros”, escreve a Organização Mundial da Saúde.
Fumar apresenta-se como um factor de risco, mostram as provas científicas.
As crianças parecem ser as menos afectadas ou, pelo menos, são as que mostram ter menos sintomas. Também quase não morrem, apesar de ficarem infectadas. “Na China, em 44.657 doentes com sintomas, apenas 416 (0,9%) eram crianças e, destas, a esmagadora maioria não tinha doença grave”, escreveu Manuel Carmo Gomes, professor de Epidemiologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, num artigo sobre a covid-19 para o PÚBLICO.
Apesar de quase não apresentarem sintomas e quase não morrerem da doença, as crianças podem agir como transmissores, pelo que a suspensão das aulas e encerramento das escolas se afigura como uma medida eficiente para conter o vírus.
De acordo com os dados apresentados pelo mesmo especialista, retirados de um estudo que usou uma amostra de 44.672 doentes chineses, a mortalidade pela doença foi de 0,2% em doentes com idades entre dez e 40 anos; 1,3% até aos 59 anos; 3,6% entre 60 e 69 anos; 8% entre 70 e 79 anos e de 14,8% nos maiores de 80 anos.
As pessoas com mais de 60 anos e com doenças crónicas associadas parecem ser as mais vulneráveis. De acordo com o mesmo estudo e independentemente da idade, morreram 10,5% dos doentes com doenças cardiovasculares, 7,3% dos doentes com diabetes, 6,3% dos doentes com doença respiratória crónica, 6% dos doentes com hipertensão e 5,6% dos doentes com doença oncológica.
Há que lembrar, no entanto, que a percentagem de idosos a viver na China é inferior à de Portugal. Em Hubei, apenas 14% dos residentes têm mais de 60 anos. Em Portugal inteiro, a percentagem é de 28%.
Sabe-se, por outro lado, que há diferenças de género na taxa de letalidade do vírus. De acordo com uma avaliação feita no final de Fevereiro pelo Centro de Controlo e Prevenção de Doenças chinês, os homens e as mulheres são infectados em números aproximadamente iguais, mas a taxa de mortalidade masculina é de 2,8%. Nas mulheres é de 1,7%.
A resposta parece estar no sistema imunitário das mulheres, que luta melhor contra as infecções respiratórias, e nos hábitos mais saudáveis das mulheres, que as afastam dos grupos de risco desta doença.