Costa quer Portugal a colaborar na investigação e separa Isabel dos Santos das empresas

Primeiro-ministro comentou o caso que envolve Isabel dos Santos e diz esperar “que as empresas mantenham a sua actividade, até porque algumas delas são essenciais para a economia nacional”.

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António Costa LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

O primeiro-ministro afirmou nesta quarta-feira que compete a Portugal “colaborar totalmente” com as investigações das autoridades angolanas e fez uma separação entre a situação da accionista Isabel dos Santos e a actividade das empresas por ela participadas.

António Costa falava aos jornalistas depois de ter estado presente na inauguração de novas instalações e de novos laboratórios da multinacional portuguesa Hovione, em Loures, depois de interrogado sobre a matéria revelada pela investigação jornalística aos negócios da empresária angolana Isabel dos Santos.

“Compete a Portugal colaborar totalmente com as autoridades angolanas, tal como temos vindo a fazer e como iremos fazer. Espero que este caso permita à justiça angolana tratar aquilo que tem a tratar e às empresas portuguesas continuarem a desenvolver a sua actividade dentro do maior quadro de estabilidade possível”, reagiu o primeiro-ministro.

Interrogado sobre a situação em que poderão ficar grandes empresas portuguesas em que a empresária Isabel dos Santos detém participações relevantes, António Costa procurou então traçar uma linha de demarcação entre a questão da accionista e continuação da actividade dessas mesmas empresas.

“Não conheço em pormenor os casos judiciais, mas a investigação tem sido sobre uma accionista e não sobre as empresas. Portanto, as medidas que sejam adoptadas em relação à accionista não afectarão necessariamente as empresas. As empresas têm uma distinção entre aquilo que são os seus capitais, os seus recursos, e aquilo que é o capital e os recursos dos seus accionistas”, alegou.

Perante os jornalistas, o líder do executivo defendeu que, neste caso em concreto, deseja que “Portugal cumpra a sua função de colaborar (como lhe compete) com uma investigação que é desenvolvida pelas autoridades judiciárias de um país amigo”.

“Simultaneamente, espero que as empresas mantenham a sua actividade, até porque algumas delas são essenciais para a economia nacional, designadamente a Efacec - uma empresa industrial num sector de ponta de referência”, disse.

António Costa, porém, não quis pronunciar-se sobre a dimensão inerente ao Luanda Leaks, nem sobre os dados revelados por essa investigação, alegando não fazer comentários nem sobre casos de justiça em Portugal, nem em outro país.

Questionado se houve uma falha do sistema regulatório português, o primeiro-ministro contrapôs para o efeito que “há um comunicado público do Banco de Portugal, designadamente sinalizando que há cerca de quatro anos tomou uma decisão sobre não reconhecimento de idoneidade a algumas das pessoas que têm sido referidas” na investigação.

“Recordo que, no se refere ao Governo, foi feita uma alteração legislativa - na altura até muito criticada por alguns - para permitir assegurar a desblindagem estatutária de um banco muito relevante em Portugal, onde havia um conflito accionista. Assegurou-se, então, um quadro legal que permitiu ultrapassar essa situação de conflito e não manter uma situação de blindagem “, afirmou, aqui numa alusão ao BPI.

O primeiro-ministro rejeitou também a acusação do Bloco de Esquerda de que deu um tratamento especial à empresária angolana Isabel dos Santos e salientou que foi o seu Governo quem desblindou os estatutos do BPI.

Confrontado com referências do Bloco de Esquerda ao facto de, alegadamente, enquanto primeiro-ministro, ter concedido um tratamento especial à empresária angolana Isabel dos Santos, que, inclusivamente, teria acesso ao seu gabinete.

“Não dei tratamento nem de especial, nem de favor, nem de desfavor. Temos de tratar as pessoas todas por igual”, reagiu o líder do executivo, antes de responder à acusação feita pela coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins.

“O Bloco de Esquerda deve seguramente desconhecer os factos, mas quando a doutora Catarina Martins conhecer algum facto sobre a actuação do Governo, designadamente sobre a minha actuação, tem sempre a oportunidade de me telefonar ou de me visitar. Eu terei todo o gosto em poder prestar-lhe esclarecimentos”, respondeu.

Como facto em sentido contrário em relação ao teor dessa crítica feita pelo Bloco de Esquerda, António Costa referiu-se, então, ao longo processo de desblindagem dos estatutos do BPI, que se prolongou até 2017 e que envolveu a empresária filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos.

“Havia um conflito entre a engenheira Isabel dos Santos e outros accionistas, e havia um sistema de blindagem estatutária que garantia que Isabel dos Santos impedisse a alteração desse quadro estatutário, designadamente em relação a uma OPA (Oferta Pública de Aquisição) que estava para ser lançada por outro accionista. O Governo agiu como lhe competia, procurando, primeiro, contribuir activamente para que os conflitos fossem ultrapassados”, disse.

Segundo o primeiro-ministro, como esse conflito não foi ultrapassado, “o Governo fez o que devia, alterou a lei, pôs fim à desblindagem, permitindo ao banco encontrar o seu caminho normalmente”.

António Costa recusou depois a perspectiva de que as investigações em torno de Isabel dos Santos possam criar um novo “irritante” nas relações diplomáticas entre Portugal e Angola, dizendo que, “pelo contrário, há um enorme alinhamento de pontos de visita”.

O primeiro-ministro também não quis comentar um encontro que em breve terá lugar entre os procuradores gerais da República de Portugal e de Angola.

“Não tenho informações sobre e isso, nem tenho de ter. O Ministério Público em Portugal goza de autonomia”, alegou.