O orçamento mais difícil de toda a legislatura
O que quer que aconteça este ano pode desbloquear negociações futuras, se as condições orçamentais, económicas e financeiras do país não se alterarem substancialmente.
É entregue nesta segunda-feira no Parlamento o Orçamento do Estado para 2020. Que é também, em muitos casos, uma parte do Orçamento do Estado para 2021, 2022 ou até 2023. O Governo optou por inscrever no documento que foi aprovado no último sábado, numa reunião do Conselho de Ministros que durou dez horas, pistas do que vai acontecer até ao final da legislatura. E se este orçamento for aprovado, então é muito provável que os seguintes sejam muito mais fáceis de gerir, porque há compromissos que, uma vez assumidos agora, podem ter reflexos em negociações futuras.
Taxas moderadoras. Este é um dos casos que vão arrastar-se até 2023. Tal como decorre da Lei de Bases da Saúde, a sua eliminação vai ser gradual, a começar já em 2020, nos cuidados de saúde primários - não se sabe exactamente em que mês do ano a medida arranca, nem quais são os cuidados de saúde que vão ser abrangidos, mas tudo indica que o faseamento seja feito por tipologia dos actos clínicos (consultas, meios de diagnóstico, tratamentos). Esta era uma exigência da esquerda que causou alguns desacertos na “geringonça” na recta final da passada legislatura.
Investimentos plurianuais na saúde. Também esta semana ficámos a saber pela ministra Marta Temido que algum do dinheiro que foi posto em cima da mesa para aplicar no sector da saúde não é válido só para o Orçamento que agora se fecha. O caso dos 190 milhões para apostar na requalificação e modernização da rede de hospitais e centros de saúde é um exemplo de investimento plurianual, válido para os anos de 2020 e 2021. Também esta era uma medida prioritária para a oposição, incluindo PCP e BE, mas também PSD e CDS.
Salário mínimo nacional. O compromisso de aumento do salário mínimo foi já assumido a quatro anos. Perante a Concertação Social, o Governo propôs que o valor subisse para 635 euros em 2020, com o objectivo de chegar aos 750 euros no final da legislatura. Não esperou por nenhum acordo entre os parceiros sociais que não se entendiam quanto aos valores de partida (2020) e de chegada (2023) e decretou o aumento.
Descongelamento das carreiras, aumentos na Função Pública, contratação de cientistas, preço dos passes, meios aéreos próprios de combate a incêndios e compromissos ambientais relacionados com o encerramento de centrais a carvão são mais alguns exemplos de medidas que estarão já sinalizadas neste orçamento e que são para executar, de forma desdobrada, nos próximos anos.
Assim sendo, este pode muito bem ser o orçamento mais difícil de aprovar de toda a legislatura. E o que quer que aconteça este ano pode desbloquear negociações futuras, se as condições orçamentais, económicas e financeiras do país não se alterarem substancialmente. É como se o Orçamento do Estado para 2020 fosse o pai dos orçamentos para 2021, 2022 e 2023. Esteja António Costa a contar com os votos do PSD-Madeira, do PAN e do Livre; com os do Bloco e do PCP; ou só com os do PS e com a abstenção dos antigos parceiros de coligação (entre muitos outros cenários possíveis).