“Gretamania” em Madrid: o ícone e a juventude em marcha
De Lisboa a Madrid, Greta seguiu para uma visita “surpresa” aos protestos que decorreram durante o dia na capital espanhola. Pelas 18h quis tomar as rédeas da Marcha pelo Clima, mas demasiados curiosos impediam-na de avançar. Ainda assim, como prometido, discursou no final da manifestação.
Greta Thunberg chegou à estação de Santa Apolónia às 21h em ponto, como mandam os hábitos nórdicos, e conseguiu a proeza de fintar os jornalistas que só se aperceberam que já estava dentro do comboio que partia de Lisboa quando a avistaram por uma janela. Estava confirmado: a jovem sueca iria mesmo para Madrid a bordo do Lusitânia — uma das opções mais sustentáveis para a activista, que seguia rumo à 25.ª Conferência das Partes (COP25) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas.
Foi um vislumbre fugaz — Greta evadiu-se quase sem ser notada para a cozinha do comboio de forma a escapar aos olhares mais indiscretos. À sua espera tinha uma Gran Suite, que lhe permitiu alguma privacidade durante as mais de dez horas que dura a viagem até à capital espanhola.
Mal o comboio parou na estação de Chamartín, às 8h40 (hora espanhola) já os jornalistas se acotovelavam para conseguir as melhores imagens da chegada. Mas Greta Thunberg não cedeu: não fez declarações; não respondeu a perguntas. Seguiu acompanhada pelo pai e escoltada pela polícia até ao Seat eléctrico de cor vermelha que a transportou para fora da estação.
Uma aparição-surpresa na COP25
A primeira alteração na agenda da jovem activista aconteceu apenas horas depois de ter chegado a Madrid. Ao contrário do que estava previsto, Greta, um dos ícones da luta pelo clima, marcou presença na COP25 – algo que só deveria acontecer na próxima semana. Uma “decisão espontânea” da jovem sueca, de acordo com o seu gabinete de imprensa.
Pelas 11h15, Greta foi avistada junto de outros jovens perto da sede de reuniões da ONU. Juntou-se aos protestos, com canções e gritos de ordem, e teve ainda tempo para se encontrar a sós com outra activista indiana, Licypriya Kangujam. A menina de nove anos tweetou uma fotografia das duas, escrevendo que Greta é a sua “inspiração” e apelando à acção por parte do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi.
Greves estudantis não são “solução sustentável”
Antes de seguir para a Marcha do Clima, convocada para ontem ao fim da tarde em Madrid, Greta Thunberg deu uma conferência de imprensa com outros três membros do movimento Fridays For Future: a ugandesa Vanessa Nakate e os espanhóis Alejandro Martínez e Shari Crespi. A conferência decorreu no centro cultural La Casa Encendida, apinhado com centenas de jornalistas. No entanto, no pátio onde estava Greta apenas entraram os canais de televisão e os restantes jornalistas tiveram de assistir a uma transmissão numa sala à parte, ficando impedidos de colocar perguntas.
Por ser o nome mais conhecido, as questões eram-lhe quase sempre dirigidas — Greta bem tentava “esquivar-se” e passar a resposta aos colegas do lado, sem grande sucesso. Questionada sobre se faltavam mais figuras como ela e se seria preferível estar ali a escutá-la em vez de assistir às conferências da COP25, afirmou que era apenas “uma pequena parte de um movimento maior”. “Claro que não devem ouvir-me em vez de [ouvirem] essas pessoas. (...) Precisamos de mais activistas, sim.”
Sobre as críticas que tem recebido – de algumas figuras políticas, como Donald Trump –, Greta afirmou apenas que “algumas pessoas só querem manter tudo como está”. “As pessoas mais novas querem a mudança. E por isso são silenciadas. Eles têm medo da mudança e de as nossas vozes serem ouvidas”, explicou a sueca de 16 anos.
Quando lhe pediram para falar sobre o que alcançou com um ano de greve às aulas pelo clima, disse que foi “muito” e que os jovens conseguiram “aumentar a consciência pública sobre o assunto”. Por outro lado, a activista é da opinião que as crianças não podem continuar a faltar à escola — “não é sustentável” — e que terão de ser os políticos a agir. “É um grande passo na direcção certa. Mas as emissões estão a aumentar e por isso não é uma vitória. O que queremos é acção e isso ainda não aconteceu. Desse ponto de vista, não alcançámos nada”, disse.
Uma marcha interrompida
Apenas uma hora depois do fim da conferência de imprensa, Greta Thunberg tomou a liderança da marcha pelo clima, que reuniu milhares de pessoas, saindo da Atocha rumo a Nuevos Ministerios — local onde a jovem sueca leu um manifesto pelo Clima, já depois de ter sido aconselhada pela polícia espanhola a abandonar o local. A causa? Demasiados curiosos e jornalistas, que a estavam a impedir de avançar.
“A polícia disse-me que não podíamos continuar assim”, resumiu a jovem activista, antes de se retirar num carro eléctrico, com o seu já famoso cartaz com a frase “Greve pelo Clima” debaixo do braço. “Peço imensa desculpa se alguém se sentir magoado. Adorava participar na marcha mas é uma questão de segurança”, justificou. A marcha seguiu sem mais percalços, mas sem a sua figura de proa.
A jornalista viajou a convite da Talgo