Há um antes e um depois da acusação de Tancos na campanha
Ao quinto dia, a campanha animou. Mas não foram visões divergentes sobre o futuro do país que incendiaram os partidos. Foi Tancos.
Começou de mansinho mas, de repente, o caso de Tancos tomou conta dos discursos de campanha. Se, de manhã, os líderes ainda comentavam com timidez as notícias mais recentes sobre o andamento judicial, depois de a acusação se ter tornado oficial, tudo se precipitou. Rui Rio convocou os jornalistas para fazer declarações. António Costa respondeu-lhe minutos depois. E foi entre estes dois protagonistas que as coisas mais azedaram.
A partir da Casa do Impacto, em Lisboa, onde esteve a ouvir jovens empreendedores, o líder do PS ouviu o seu adversário político dizer que “um Governo não pode funcionar assim”. Rui Rio mostrou-se incrédulo pelo facto de o primeiro-ministro, António Costa, não saber do sucedido. E foi duro como ainda não tinha sido desde que é líder do PSD. “O que é que terá acontecido dentro do Governo ao longo destes quatro anos que o primeiro-ministro não soube? Só há duas possibilidades: ou sabe ou não sabe, e ambas são muito más porque, mesmo que não saiba, um Governo não pode funcionar assim”, criticou. “Perante um assunto desta gravidade, o ministro da Defesa não avisa o primeiro-ministro?”, quis saber o social-democrata, lembrando que o ex-ministro avisou um deputado do PS (Tiago Barbosa Ribeiro). “Se articula, se informou, como é o mais provável, temos aqui o problema de o primeiro-ministro ser conivente com aquilo que se passou”, concluiu, recusando-se a tecer considerações sobre Azeredo Lopes.
Antes de reagir, António Costa mostrou-se nervoso – quase caiu depois de tropeçar num degrau das escadas que davam acesso ao local onde os jornalistas o esperavam. O ataque era directo e, na resposta, o socialista acabou por deixar de fora a defesa do seu ex-ministro. "Não é aos 58 anos que lhe reconheço autoridade para fazer julgamentos morais sobre a minha atitude política”, quis dizer Costa. "Ainda há dois dias eu ouvi, todos os portugueses ouviram, o dr. Rui Rio dizer que tinha como princípio fundamental não fazer julgamentos na praça pública.”
O secretário-geral do PS, para quem as declarações de Rui Rio atingiram a “dignidade da campanha" (mais do que a sua), disse ainda que o líder social-democrata “tinha a estrita obrigação de saber” que o primeiro-ministro respondeu por escrito “a todas as questões que a comissão parlamentar de inquérito colocou sobre" o caso e que “a comissão de inquérito concluiu que nada tinha a apontar”.
Na entourage socialista, há ainda quem lembre que Azeredo Lopes desmente a versão do Ministério Público (MP). E não se rejeita que este caso vá manchar a campanha, forçando Costa a falar de uma polémica e não do país positivo.
Catarina Martins começou por dizer que o caso não devia entrar na campanha, mas acabou o dia a reconhecer que, se a justiça estiver certa, "foram ocultados factos” no Parlamento. “Se o MP tiver razão, não foi dita a verdade na comissão de inquérito do Parlamento”, assumiu a bloquista. Jerónimo de Sousa foi inicialmente parco nos comentários, mas lá foi registando que “ninguém está acima da lei” e que a “decisão é dos tribunais”. À noite, numa declaração sem direito a perguntas, acrescentou: “Ninguém pode esconder a gravidade do que está em causa. Apurem-se todas as responsabilidades, em particular as que resultam das gravíssimas acusações que são imputadas ao ex-ministro da Defesa.”
Assunção Cristas falou directamente para os eleitores. “Espero que as pessoas reflictam muito bem no dia 6 sobre que tipo de Governo querem ter. Se querem ter um Governo que encobre crimes, que iliba criminosos, impede a justiça de funcionar porque, aparentemente, conhece e dá cobertura a um acordo que impede que os responsáveis pelo furto [em Tancos] sejam efectivamente apanhados e punidos, ou se entendem que basta”, alertou. com Liliana Valente e Sofia Rodrigues