Um recorde trágico: 12 mil crianças mortas ou feridas em guerras em 2018

O recrutamento e uso de menores nos combates, a violência sexual, os raptos e os ataques a escolas fazem parte da lista que considera sobretudo as mortes e os ferimentos de crianças. Os países com as situações mais críticas são o Afeganistão, a Palestina, a Síria e o Iémen.

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Sana'a (Iémen) depois de um ataque aéreo LUSA/YAHYA ARHAB

Mais de 12 mil crianças foram mortas e feridas em conflitos armados no ano passado, denuncia nesta terça-feira a ONU, sublinhando tratar-se de um recorde e apontando Afeganistão, Palestina, Síria e Iémen como os piores países da lista. Num relatório anual publicado nesta terça-feira, as Nações Unidas referem que as mortes e os ferimentos estão entre as mais de 24 mil “violações graves” dos direitos das crianças verificados pela organização no ano passado.

Entre as violações registadas contam-se ainda o recrutamento e uso de menores nos combates, a violência sexual, os raptos e os ataques a escolas e hospitais, avança o relatório.

De acordo com o documento, entregue pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, ao Conselho de Segurança das Crianças e Conflitos Armados, e citado pela agência AP, o número destas violações feitas por grupos armados manteve-se estável relativamente a 2017, mas houve um “aumento alarmante” do número de violações realizadas por forças governamentais e internacionais.

O relatório refere que o número de mortos e feridos em 2018 foi o mais alto desde que o Conselho de Segurança autorizou a monitorização e realização destas análises, em 2005.

O Afeganistão lidera a lista dos países com mais casos, com 3062 baixas em 2018, sendo que “28% de todas as vítimas civis são crianças”.

Na Síria, os ataques aéreos e as bombas mataram e feriram 1854 menores e, “no Iémen, 1689 crianças sofreram as consequências dos conflitos”, adianta o documento.

No conflito israelo-palestiniano, a ONU verificou ter-se registado em 2018 o maior número de crianças palestinianas mortas — 59  e feridas  2756  desde 2014. A análise apurou terem também ficado feridas seis crianças israelitas.

Guterres pede que se acabe com “uso excessivo da força”

Guterres admitiu estar “extremamente preocupado com o aumento significativo” de feridos nesta área do mundo, incluindo por inalação de gás lacrimogéneo, e pediu ao enviado da ONU Nikolay Mladenov para fazer uma análise mais fina aos episódios causados por forças israelitas. Além disso, António Guterres “exortou Israel a implementar imediatamente medidas preventivas e de protecção para acabar com o uso excessivo da força”.

De acordo com o relatório, as partes em conflito na Somália recrutaram e utilizaram 2300 crianças, algumas com apenas oito anos, tendo-se verificado um aumento significativo do recrutamento feito pelos extremistas al-Shabab, que terão usado 1865 menores para combater. A Nigéria ficou em segundo lugar, com 1947 crianças recrutadas, incluindo algumas usadas como bombistas suicidas.

A Somália teve o maior número de casos de violência sexual contra crianças, com 331 casos em 2018, seguida pelo Congo, com 277 casos, embora o secretário-geral tenha alertado haver muitos casos que não são notificados, particularmente contra meninos, devido ao estigma. A Somália teve também o maior número de raptos de crianças no ano passado: 1609.

António Guterres sublinhou ainda os milhares de crianças afectadas por 1023 ataques verificados em escolas e hospitais no ano passado.

Na Síria, foram registados, no ano passado, 225 ataques a escolas e instalações médicas, o maior número desde o início do conflito em 2011, referiu o secretário-geral da ONU, acrescentando que o Afeganistão também apresentou um aumento desta violação dos direitos da criança, com 254 escolas e hospitais a sofrerem ataques.

“Um maior número de ataques também foi verificado na República Centro-Africana, na Colômbia, na Líbia, no Mali, na Nigéria, na Somália, no Sudão e no Iémen”, disse Guterres.

O secretário-geral também expressou preocupação com a crescente detenção de crianças, reiterando que “essa medida só deve ser usada como último recurso e pelo menor período possível” e defendendo que “as alternativas à detenção devem ter sempre prioridade”.

Segundo o secretário-geral da ONU, em Dezembro do ano passado estavam 1248 crianças, sobretudo com idades abaixo dos cinco anos, “privadas da sua liberdade”.

Estas crianças, provenientes de 46 nacionalidades de áreas anteriormente controladas por extremistas do Estado Islâmico, estavam detidas em campos no Nordeste da Síria.

No Iraque, 902 crianças permaneciam detidas por acusações de “ameaça à segurança nacional”, incluindo associação ao auroproclamado Estado Islâmico.

Na mesma altura, Israel tinha detidas 203 crianças palestinianas por “crimes contra a segurança”, incluindo 114 que aguardavam julgamento ou que foram julgadas, e 87 que já estavam a cumprir uma sentença.

A ONU recebeu, segundo Guterres, depoimentos de 127 meninos palestinianos que “relataram às Nações Unidas maus tratos e violações do direito a um julgamento justo durante sua prisão, transferência e detenção”.