A Maria do Mar está a crescer, da puericultura ao mobiliário. Mas não esquece os brinquedos de madeira
Além da loja online, a marca de Alvalade, em Lisboa, tem duas lojas físicas e prepara-se para abrir a terceira. Todas diferentes, mas, garante Mónica Albuquerque, todas amigas do ambiente.
Foi “a brincar” que Mónica Albuquerque, de 36 anos, se tornou empreendedora. A fundadora da marca Maria do Mar, que se destina a bebés e suas famílias, é uma grande defensora dos brinquedos tradicionais e segue um conceito de slow-living, em que os produtos servem o seu propósito: ajudam no desenvolvimento da criança e são amigos do ambiente.
“A crescer sempre tive brinquedos de madeira, nunca tive de plástico ou electrónicos porque já a minha mãe era completamente contra”, explica Mónica Albuquerque ao PÚBLICO. O projecto Maria do Mar – que vende artigos de puericultura, roupa infantil, decoração e brinquedos – tem seis anos e começou por ser uma loja online com entregas apenas em Portugal. Hoje, além do website, a Maria do Mar tem duas lojas em Lisboa, em Alvalade e prepara-se para abrir uma terceira no mesmo bairro lisboeta. O passo seguinte, espera Mónica, é expandir “para outras geografias”.
Ao criar a marca, o objectivo era ter uma oferta de produtos (brinquedos ou decorativos) diferentes daqueles que se vendiam no país. Para isso, a empreendedora continua a viajar até outras paragens à procura do artigo perfeito. “É nessas viagens e nesse convívio com pessoas de outras realidades, culturas de outros países, que se vai, de facto, encontrar outras ferramentas. A Maria do Mar surge nesse sentido, no sentido de trazer outros tipos de brinquedos”, justifica.
Três lojas, três conceitos
Mónica Albuquerque encontrou um nicho de mercado. Antes de entrar neste negócio, só existia uma loja de brinquedos de madeira em Portugal "focada na pedagogia Waldorf [que aposta na liberdade de desenvolvimento das crianças] e no brinquedo técnico”, conta.
De acordo com a empresária, há pouca oferta de “coisas que sejam evolutivas, que sejam tendencialmente para durar muito mais tempo e crescer com as crianças”, explica.
Há dois anos abriu a primeira loja física. “As pessoas gostavam da forma como a loja estava disposta, do tipo de produtos que nós apresentávamos. Os brinquedos [em madeira] eram das coisas que nós mais vendíamos”, revela. “Há este preconceito de que o brinquedo de madeira é mais caro, mas quando comparamos com brinquedos de plástico acabamos por chegar à conclusão de que isso é mito. Foi essa tentativa de mudança de mindset que nos fez crescer”, esclarece.
Por causa da falta de espaço de armazenamento que contrastava com a grande procura, Mónica abriu a segunda loja em 2018 na antiga fábrica da Confeitaria da Ajuda, onde se faziam as famosas amêndoas da Páscoa e cubos de marmelada. Ao abrir este espaço, Mónica foi forçada a tornar a primeira loja “mais crescida. Já passou a fase infantil e já está numa fase de adolescência”, explica. Assim, a primeira “está muito mais orientada para o lifestyle” e não é tão dedicada a bebés como o novo espaço. A terceira loja abre em Setembro e será uma loja de roupa.
A marca também redefiniu a sua loja online que passou a ter conteúdos “relacionados com as coisas que temos na loja: com enfermagem, escola, educação pedagogia, com tendências de moda infantil, decoração”, diz. O site está agora disponível em três línguas: inglês, português e espanhol e faz envios para cerca de 200 países. “Os nossos maiores clientes, além de Portugal, são o Reino Unido, Espanha, Angola e Brasil”, conta a empreendedora.
A filosofia Maria do Mar
Para pertencer à Maria do Mar, as marcas têm de respeitar certas regras. “Sem plástico [não reciclado], sem publicidade, sem pilhas” é o mote da loja.
“Estas lojas não são mais do que o reflexo do que é a minha verdade”, declara a proprietária. Por isso, uma das preocupações, diz, está em “ter uma pegada ecológica boa e passar isso à nossa comunidade”. Ali, só entram brinquedos de plástico reciclado e que, adianta, “têm funções específicas, como por exemplo, estar na água”. “Só que são brinquedos que duram gerações e gerações”, sublinha.
A maioria dos brinquedos é construída em madeira. “Quem diz madeira diz pano, diz cortiça, portanto, materiais que são orgânicos, que são bons para as crianças, que trabalham as texturas, a sensibilidade nos dedos e, no caso dos mais pequeninos, até na boca”, justifica. Mesmo nos artigos de puericultura se opta por biberões em vidro.
À consciência ecológica junta-se a “responsabilidade enquanto mãe”, confessa. "Há uma parte pedagógica de ajudar a educar”, continua. Na Maria do Mar, não existem, portanto, brinquedos que façam publicidade, ditos licenciados. Os brinquedos “têm uma imagem muito limpa, com menos personalidade, para dar espaço às crianças para conseguirem elas fazer a parte delas”, enuncia.
Para Mónica, os brinquedos licenciados travam a imaginação das crianças – “O comboio do Mickey será o comboio do Mickey, por mais que eu dê voltas, o Mickey estar no comboio nunca será o comboio da avó, nunca será o comboio que vai fazer a viagem do Eça de Queirós, nunca será o comboio do circo, nunca será o comboio que leva os remédios para a guerra. Será o comboio do Mickey”, exemplifica.
Outra regra de ouro deste projecto é a inexistência de brinquedos com pilhas. Para Mónica Albuquerque, não é suposto que o brinquedo funcione sozinho. “A criança só está ali para carregar no botão. Não gera empatia, não gera relação, cria miúdos mais desligados, mais incapazes, e acima de tudo que estão sempre à espera que a coisa se resolva sozinha. O que nós queremos é precisamente o inverso, é que a criança perceba que se eu quero que A chegue a B vou ter de fazer qualquer coisa”, explica.
A “chica-espertice” e o assédio das marcas
Ao criar o seu negócio, Mónica Albuquerque encontrou desafios. O maior, diz, foi a “chica-espertice”. “A chica-espertice é tramada. Fui buscar umas agendas escolares giríssimas a uma marca que nunca tinha vindo para Portugal. Passado um mês até as grandes superfícies já tinham”, começa por contar. Querendo marcar pela diferença, Mónica viu-se obrigada a criar contratos de “exclusividade geográfica” sobre os produtos que vende: “Somos nós que escolhemos os nossos fornecedores. Nós vamos, viajamos, conhecemos a pessoa que lá está e que faz o tapete ou a cama e é isso que faz uma diferença gigante – o processo da escolha”, admite.
Outro desafio referido pela empresária é o assédio das marcas. “Tenho marcas a mandarem coisas para eu testar porque dizem que são a minha cara. Todos os dias recebemos dezenas de e-mails, telefonemas, sinais de fumo, a amiga que conhece a amiga que conhece a amiga, porque tem de estar na minha loja”, conta Mónica. Para a constante pressão das marcas, estrangeiras e nacionais, a fundadora da Maria do Mar tem uma resposta acutilante: “Isto não é uma loja multimarca, isto não é uma loja de aluguer de espaço, aqui o dinheiro é nosso, o caminho é nosso e a escolha é nossa e nós é que sabemos o que é que queremos e para onde é que vamos.”