Líderes europeus definem o perfil do próximo presidente da Comissão, e não é Manfred Weber
No rescaldo das eleições para o Parlamento Europeu, os chefes de Estado e Governo dos 28 tentam concertar alianças e acertar os critérios para as nomeações dos cargos de topo da UE.
Com duas palavrinhas apenas se arrasa uma candidatura. Sem nunca referirem o nome do cabeça de lista do Partido Popular Europeu (PPE), os 28 chefes de Estado e governo da União Europeia desqualificaram Manfred Weber como próximo presidente da Comissão Europeia: “credibilidade” e “experiência”. Quem quiser suceder a Jean-Claude Juncker precisa de ter “experiência governativa” para poder liderar o executivo comunitário, e ainda a “credibilidade política” de ter defendido a agenda política de combate às alterações climáticas, redução das desigualdades e estabilização da união económica e monetária que foi sufragada pelos eleitores europeus no último domingo.
“De facto, Manfred Weber não tem essas características”, constatou o primeiro-ministro português, António Costa, à chegada para a cimeira informal de líderes. Na agenda do jantar de trabalho havia um único prato: a nomeação dos dirigentes das instituições europeias — Comissão, Conselho Europeu, Parlamento e Banco Central Europeu — na próxima legislatura. Um processo que, como assinalou Costa, “implica vários acordos”. “É preciso um acordo que cumpra a maioria necessária aqui no Conselho Europeu. E é preciso um acordo entre o Conselho e o Parlamento Europeu, que foi muito claro na sua conferência de presidentes a dizer que o próximo presidente da Comissão deve ser escolhido entre os Spitzenkandidaten”, ou seja, os cabeças de lista apresentados pelas famílias políticas europeias.
Merkel e Macron desavindos
Weber, o eurodeputado bávaro que lidera a bancada conservadora (que continuará a ser a maior do próximo hemiciclo) conta com o apoio dos oito líderes do PPE no Conselho — Áustria, Bulgária, Chipre, Croácia, Irlanda, Letónia, Roménia e a poderosa Alemanha. À entrada, a chanceler Angela Merkel reafirmou o seu apoio à nomeação do seu concidadão e aliado político. Mas reconheceu que “nem todos os parceiros” do Governo de coligação germânico defendem esta escolha: o candidato do SPD, que saiu fragilizado da votação europeia, é o socialista holandês Frans Timmermans.
“Como membro do PPE naturalmente apoio Manfred Weber”, prosseguiu Merkel. “Mas devo lembrar que só estamos a começar a nossa troca de impressões, e devemos tratar todos os candidatos por igual. Este é um processo determinante para a capacidade da UE actuar no futuro”, concluiu, aparentemente já conformada com o mais que provável chumbo do nome do seu concorrente pelos líderes dos restantes grupos — oito liberais, cinco socialistas, dois conservadores, três desalinhados ou independentes e, claro, Emmanuel Macron.
O Presidente de França, que nunca escondeu a sua oposição à regra dos Spitzenkandidaten, até concedeu que Timmermans teria a competência para presidir à Comissão. Ou então a dinamarquesa Margrethe Vestager, cujo partido se senta na mesma bancada do ALDE a que os eurodeputados da sua lista Renascimento vão pertencer. Ou mesmo o diplomata francês nomeado negociador da UE para o “Brexit”, Michel Barnier. Entre várias hipóteses, Macron só não mencionou Manfred Weber. “Devemos escolher um homem ou uma mulher que tenha a experiência e a credibilidade para levar avante o projecto europeu de forma ambiciosa”, sublinhou.
Quando chegaram ao edifício do Conselho Europeu para jantar, os líderes já se tinham multiplicado em reuniões bilaterais e trilaterais para concertar alianças e definir a estratégia para a distribuição dos cargos de topo nas instituições comunitárias. Os membros do PPE encontraram-se ao fim da manhã com Manfred Weber. Macron convidou para o almoço os liberais Xavier Bettel (Luxemburgo) e Mark Rutte (Holanda), e a dupla ibérica António Costa e Pedro Sánchez, os dois negociadores socialistas. O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, chamou os quatro líderes do grupo de Visegrado: Polónia (conservador), República Checa (liberal), Eslováquia (socialista) e Hungria (suspenso do PPE, Viktor Orbán, já disse que não apoia Weber).
O que terão combinado foi que em vez de avançar com a discussão dos nomes para os cargos, deviam começar por debater questões processuais e de conteúdo. “Temos de fixar uma nova agenda estratégica para responder às prioridades que os cidadãos claramente sinalizaram nas eleições”, disse António Costa. É com base nessa agenda que anseia “construir uma plataforma progressista e democrática que assegure uma maioria estável, quer no Conselho, quer no Parlamento Europeu para eleger uma nova Comissão Europeia”.
Mas mesmo sem discutir nomes, os líderes já vinham com a lição estudada sobre o “perfil adequado” do próximo chefe do executivo comunitário. “Não se trata de eliminar ninguém, mas seria estranho que o presidente da Comissão não fosse, como tem sido sempre, alguém com uma sólida experiência governativa, ao nível nacional e europeu”, considerou Costa. Não estava seguramente a pensar em Manfred Weber, que nunca esteve num governo alemão e cuja carreira política se circunscreve ao Parlamento Europeu.