Explorações de lítio obrigadas a avaliação ambiental todos os anos

Caderno de encargos obriga vencedores de futuro concurso a apresentar anualmente plano de intervenção. Governo quer autoridades a fazer monitorização constante dos trabalhos.

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Exploração em Montalegre já está no terreno mas ainda precisa de Avaliação de Impacte Ambiental. Adriano Miranda

As empresas que vão trabalhar na prospecção, extracção e mineração do lítio serão obrigadas a entregar todos os anos às autoridades ambientais um plano de intervenção onde deixem exposto quais as acções que pretendem fazer na área que lhes foi concessionada. Esse plano terá de ser avaliado pelas autoridades antes de ser posto em execução e esta será a forma, segundo o Governo, de garantir um adequado acompanhamento dos trabalhos nas suas mais diversas frentes. A informação foi dada ao PÚBLICO pelo secretário de estado da Energia, João Galamba, que cita esta premissa, que vai estar incluída no caderno de encargos, como uma garantia de que a monitorização do Estado vai ser constante.

As declarações de João Galamba foram feitas na sequência dos alertas deixados pela associação ambientalista Zero, que questionou a ausência de uma avaliação estratégica ambiental ao plano nacional do lítio. A associação deu como exemplo do que não pode voltar a acontecer o caso das pedreiras, com várias ilegalidades detectadas, ou da mina das Covas do Barroso, contestada pela população local, que se sente arredada de todos os processos de desenvolvimento da mina.

O secretário de Estado da Energia assegura que os receios da Zero não se vão materializar e que o Estado pretende fazer um acompanhamento contínuo ao desenvolvimento dos projectos mineiros nas suas várias fases. “A Zero também estava preocupada que estivéssemos a utilizar uma legislação obsoleta, de 1990, porque essa foi a última a ser regulamentada. Mas mesmo que a legislação de 2015 tivesse a regulamentação feita, ela não iria ser utilizada nos concursos que vamos lançar”, explicou João Galamba.

Até agora as concessões para prospecção, pesquisa e exploração eram atribuídas por contrato administrativo celebrado entre o Estado (representado pelo Ministério da Economia) e os particulares que tivessem manifestado interesse e oferecessem garantias de idoneidade e capacidade técnica e financeira adequadas à natureza dos trabalhos a executar. A actual lei já dizia que constituía “condição de preferência a apresentação de melhor proposta de realização desta actividade, nos termos da lei e tendo em conta o interesse público”, mas nunca foi feito nenhum concurso público internacional para encontrar essa melhor proposta. Na sequencia da divulgação da estratégia nacional do lítio, e depois de identificadas as 11 áreas de elevado potencial deste minério, e para as quais já existiam mais de 30 pedidos de prospecção e pesquisa, muitos deles em áreas sobrepostas, o Governo anunciou a intenção de avançar com um concurso público, lançado com as regras do Código dos Contratos Públicos (CCP).

É na definição dos termos de referência do que vai ser esse concurso, e das cláusulas que vão integrar o caderno de encargos, que vai constar então a obrigatoriedade de sujeitar o plano de trabalhos a uma avaliação das autoridades ambientais, que vai ser feita em cada uma dessas áreas numa base anual. “O concessionário terá de apresentar todos os anos as suas intenções, dizer onde vai fazer sondagens, a que profundidade, apresentar planos de lavra, enfim, consoante a fase do projecto, ele dirá o que vai fazer no ano seguinte, e terá de ter a concordância das autoridades ambientais como seja o Instituto da Conservação da Natureza, ou a Agência Portuguesa do Ambiente”, exemplifica João Galamba. Essa avaliação “dependerá da área em que está inserida a concessão e da fase dos trabalhos a que se refere o planeamento em causa”, concluiu o secretário de Estado. 

Boticas e Montalegre

Fora destas obrigações continuam os projecto de pesquisa e exploração que já estão no terreno, como é o caso da Mina de Covas do Barroso, em Boticas, cuja licença é actualmente detida pelos britânicos da Savannah, ou da Mina do Romano, em Sepeda, em Montalegre, cujo contrato de exploração foi assinado na semana passada com a empresa de Braga, a Lusorecursos – mais de um ano e meio depois da contenda judicial com os australianos da Novo Lítio. “Ambas as concessões terão de avançar para uma Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) antes de começaram a fazer a exploração propriamente dita”, assegurou o secretário de Estado.

No caso da Mina do Romano foi assinada na passada quinta-feira o contrato de exploração com a Lusorecursos por um prazo de 20 anos, podendo haver duas prorrogações de 15 anos por decisão ministerial​. De acordo com a secretaria de Estado do Ambiente, a exploração só se iniciará após a AIA aprovada – o que terá de ocorrer nos próximos dois anos. Até lá, a empresa fará trabalhos suplementares de pesquisa e de preparação para a exploração.

De acordo com o plano de negócios da Lusorecursos a que o PÚBLICO teve acesso o projecto vai desenvolver-se em várias fases, sendo que as melhores previsões apontam para que a exploração arranque em 2020 e que em 2022 já comece a entregar o tão desejado hidróxido de lítio. A exploração da mina será feita a céu aberto, implicará um investimento de 20 milhões de euros e vai criar 100 postos de trabalho. A parte industrial avançará em duas frentes, sendo que a primeira a avançar envolve o que é apelidado de concentrador, onde será feita a separação dos vários minerais que vão sair da exploração. Vai envolver um investimento de 80 milhões de euros e criar 100 postos de trabalho. Na segunda fase, avançará a parte da metalurgia, para transformar o carbonato em hidróxido de lítio através de métodos químicos. Vai exigir um investimento de 350 milhões de euros e criar 150 postos de trabalho. O plano da Lusorecursos prevê ainda outros investimentos industriais, nomeadamente uma fábrica de painéis cerâmicos robotizada, para aproveitar a matéria-prima excedente (mais 25 milhões de euros e mais 100 postos de trabalho).

Numa fase mais avançada, mas igualmente dependente de uma Avaliação de Impacte Ambiental aprovada para iniciar a exploração de lítio, está a mina de Covas do Barroso, agora nas mãos dos britânicos da Savannah (75%) e dos australianos da Slipstream (25%). Esta mina existe desde 2006, mas arrancou com exploração apenas de feldspato e quartzo e apenas em 2011 alargou o âmbito para o lítio. A mina tem estado em funcionamento, sobretudo para o abastecimento da indústria cerâmica local, e foi o facto de mudarem de accionistas e de alargarem os planos de exploração sem consulta da população que tem indignado os locais e merecido muitos reparos inclusive do presidente da câmara de Boticas. Actualmente a Mina do Barroso tem uma concessão válida até 2036, prorrogável por mais 20 anos.

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