Terceira votação do “Brexit” só com mudanças na proposta, diz speaker do Parlamento

Presidente da Câmara dos Comuns defende que uma moção não pode ser apresentada duas vezes na mesma sessão legislativa. May tinha prometido terceira votação do acordo de saída da UE até quarta-feira.

Foto
Jonh Bercow, presidente da Câmara dos Comuns EPA/JESSICA TAYLOR

O speaker da Câmara dos Comuns sugeriu esta segunda-feira que pode não permitir o agendamento da terceira votação do acordo de saída do Reino Unido da União Europeia, prometido por Theresa May. Em mais um duro revés para os planos da primeira-ministra para o “Brexit”, John Bercow recorreu a convenções do procedimento parlamentar britânico para concluir que o Governo não pode apresentar “a mesma proposta ou uma proposta substancialmente igual” àquela que apresentou na semana passada.

“Se o Governo pretender apresentar uma nova proposta, que não seja a mesma, ou substancialmente a mesma, que apresentou à câmara no dia 12, estará tudo em ordem. O que o Governo não pode fazer, de forma legítima, é apresentar à câmara a mesma proposta, ou substancialmente a mesma proposta, que foi rejeitada nessa ocasião por 149 votos”, disse o presidente da câmara baixa do Parlamento de Westminster, numa intervenção aos deputados que apanhou toda a gente de surpresa e, particularmente, o Governo.

“O speaker não nos avisou de antemão sobre o conteúdo do seu comunicado, nem sequer do facto de que ia fazer um [comunicado]”, admitiu um porta-voz de Downing Street, remetendo uma reacção elaborada para mais tarde. Na Câmara dos Comuns, a líder da bancada conservadora, Andrea Leadsom, limitou-se a exigir que Bercow tratasse os deputados com mais “cortesia e respeito”. 

Apontando as diferenças formais entre a primeira votação do acordo de May – chumbada em Janeiro por 230 votos – e a segunda, Bercow evocou precedentes parlamentares “que remontam a 1604” para explicar não ser possível apresentar uma moção duas vezes na mesma sessão legislativa.

Esta impossibilidade processual já tinha sido alvitrada pelo deputado trabalhista Chris Bryant na semana passada, através de uma emenda a uma das moções do Governo – que acabou por ser retirada pelo próprio em cima da hora de votação.

O responsável pela coordenação da ordem de trabalhos na Câmara dos Comuns – repetidamente acusado por diferentes facções do Partido Conservador de ser “parcial” na gestão da agenda parlamentar do “Brexit”, por ser remainer – sublinhou, no entanto, que não foi a sua “última palavra sobre esta matéria”, mas uma “indicação dos requisitos que o Governo tem de cumprir” para que ele possa decidir sobre o agendamento de uma terceira votação “legítima” ao acordo do “Brexit”

O seu veredicto sobre o assunto está, por isso, dependente daquilo que for apresentado em concreto aos deputados. Se Bercow se contentar com uma moção diferenciada para sustentar nova apresentação do documento ou com um parecer do procurador-geral, a vida do Governo estaria facilitada, em teoria.

Mas se exigir mudanças substanciais no tratado de jurídico, negociado durante meses (e fechado) com Bruxelas, ou até na declaração política sobre a relação futura entre os dois blocos, só com um milagre é que May conseguirá guiar o Reino Unido por um outro caminho que não o do adiamento prolongado do “Brexit”  – a data de saída que ainda vigora é 29 de Março.

Na sequência da maratona de votações da semana passada na Câmara dos Comuns, a primeira-ministra tinha prometido nova votação ao tratado jurídico do divórcio antes do dia 20 (quarta-feira) para, a partir do seu resultado, poder pedir um adiamento da saída aos líderes europeus, que se reúnem na quinta-feira e sexta-feira em Bruxelas.

Em caso de aprovação do seu acordo, May pediria um adiamento até 30 de Junho para se preparar a legislação necessária. Havendo novo chumbo, a primeira-ministra assegurou que iria pedir um adiamento mais longo, que obrigaria o Reino Unido a participar nas eleições europeias de Maio.

 Votação só com “perspectivas realistas” sucesso

Antes da declaração de Bercow, porém, eram reduzidos os sinais vindos do Governo sobre o agendamento iminente da referida votação, devido à falta de progressos nas discussões com os seus aliados. 

As negociações com o Partido Unionista Democrático, da Irlanda do Norte, “prosseguiam”, mas sem grandes avanços. E mesmo que Jacob Rees-Mogg – líder da facção eurocéptica Partido Conservador – tenha sugerido que poderia apoiar um acordo se tivesse a certeza de que não o fazer implicaria frustrar de vez o “Brexit”, uma carta assinada por 23 brexiteers, publicada no Telegraph, dava conta da sua oposição continuada ao acordo.

Por isso mesmo, a posição de Downing Street era esta segunda-feira pragmática: sem “perspectivas realistas” de sucesso, não haverá lugar a nova votação ao acordo. O limite para a apresentação de uma moção nesse sentido termina às 19h de terça-feira.

Sugerir correcção
Ler 12 comentários