A economia só é importante na hora do aperto
Sempre que o produto cresce e as receitas aumentam, os governos dedicam-se a distribuir e remetem o investimento, a competitividade ou os incentivos às empresas para a segunda categoria das prioridades políticas.
Depois de quatro anos de razoável animação, a economia voltou a arrefecer e, cumprindo um cerimonial velho e relho, o Governo pede aos portugueses para “pedalarem com mais força”. Sempre que o produto cresce e as receitas aumentam, os governos dedicam-se a distribuir e remetem o investimento, a competitividade ou os incentivos às empresas para a segunda categoria das prioridades políticas; e sempre que os indicadores da economia pioram, os governos empenham-se em enaltecer os empresários, a apelar ao seu esforço e a pedir a aceleração da criação de riqueza.
Forçado pela troika e pela penúria, Pedro Passos Coelho tornou-se o apóstolo da iniciativa privada; constrangido pela urgência em não perder o apoio parlamentar do Bloco e do PCP, o Governo de António Costa foi o campeão de um discurso centrado na distribuição da riqueza (o famoso virar de página da austeridade). Como acontece há décadas, a política económica é um ioió.
Era fácil concordar que o maior problema com o qual Portugal se confronta desde pelo menos a era do euro é um problema de economia. Ainda esta quarta-feira o comissário europeu Pierre Moscovici lembrava que "a baixa produtividade continua a ser um desafio” do país. É essa limitação que explica a prática de salários baixos, a precariedade, os défices e a dívida ou, como consequência, a eterna dificuldade em manter serviços públicos de nível europeu com os rendimentos de uma economia que, em boa parte das suas áreas, continua em vias de desenvolvimento.
Essa questão crucial esteve demasiado afastada das prioridades políticas nos últimos anos. Com o espaço público tomado pelos sindicatos da função pública, foi difícil ouvir e discutir as iniciativas políticas dirigidas à ciência e à inovação e as empresas e os empresários não estiveram no primeiro plano dos desafios do país. A meio do caminho, António Costa decidiu nomear um ministro com outro peso político e outro reconhecimento nos meios empresariais e, mais recentemente, aplicou outro ânimo na batalha pela economia. Agora, com a “economia menos animadora”, quer mais velocidade na marcha e promete mais investimento estratégico.
Vale mais tarde do que nunca, mas a aposta estratégica na economia não pode acontecer apenas quando os números arrefecem. Com o sistema científico e tecnológico que o país tem, com a qualidade de algumas das suas empresas e empresários e, principalmente, com a melhoria da qualificação dos portugueses, o país deve ter como ambição ser mais rico – logo mais justo e solidário. Para isso, a economia deve permanecer no centro das prioridades da política.