Redução do défice não evita “risco elevado” de sustentabilidade
Comissão Europeia coloca Portugal entre os países com riscos mais elevados de médio prazo nas suas finanças públicas. No curto e no longo prazo, os riscos identificados são mais baixos
Mesmo não alterando as políticas orçamentais que têm permitido a redução do défice nos últimos anos e registando sempre um excedente primário superior a 2%, Portugal chegaria a 2029 com uma dívida acima dos 100% do PIB, resultado que lhe garante a classificação de “risco elevado” para a sustentabilidade das finanças públicas por parte da Comissão Europeia.
No relatório anual onde analisa a sustentabilidade das finanças públicas dos países da União Europeia, Bruxelas volta a colocar Portugal no grupo de países em que se encontram mais motivos de preocupação. Aplicando a todos os países um cenário base para os próximos dez anos de não alteração das actuais políticas orçamentais, é atribuído a classificação de risco elevado à sustentabilidade orçamental à Bélgica, Espanha, França, Itália, para além de Portugal.
Estes já são, neste momento, os países que registam rácios de dívida pública mais elevados, todos acima de 100%. E, apesar da redução que alguns, nomeadamente Portugal, têm conseguido registar neste indicador nos últimos anos, os riscos não ficam eliminados no final da próxima década, mesmo num cenário em que se continue a assistir à tendência dos últimos anos.
De acordo com os cálculos da Comissão Europeia, se não houver alteração de políticas em Portugal nos próximos dez anos e o país registar, em média, um saldo orçamental primário (o saldo nominal depois de retirada a despesa com juros) positivo de 2,3% e um crescimento do PIB de 1,8% ao ano, a dívida pública passaria dos 116,8% do PIB estimados para 2020 para 106,7% no final de 2029.
Esta descida de cerca de 10 pontos percentuais no rácio da dívida seria, de longe, a mais elevada entre os países europeus com maiores fragilidades orçamentais, mas mesmo assim não chega, segundo a Comissão, para retirar Portugal da zona de perigo elevado no que diz respeito à sustentabilidade das suas finanças públicas.
Um cenário em que a dívida baixaria a barreira dos 100% do PIB ainda antes do final da próxima década seria aquele em que o país cumpriria escrupulosamente todas as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento, não só chegando ao objectivo para o saldo estrutural com melhorias de 0,6 pontos percentuais ao ano (o que aconteceria em 2021), como depois mantendo esse indicador ao mesmo nível em todos os anos seguintes. Desse modo, que implicaria um excedente primário médio anual de 3,6%, a dívida chegaria ao final de 2029 nos 90,4% do PIB.
Há depois os cenários mais negativos. Um deles é o projectado no caso de uma subida das taxas de juro de mercado em um ponto percentual. Isso faria, mesmo sem alterações de política, com que a dívida pública apenas descesse de 116,8% em 2020 para 112,4% em 2029.
E, na eventualidade de a política orçamental portuguesa voltasse na próxima década a ser igual à dos últimos 15 anos, a dívida pública voltaria, de acordo com a Comissão Europeia, a subir, até aos 126% do PIB.
Na sua análise para o curto prazo (um ano), a Comissão não vê riscos para a sustentabilidade das finanças públicas portuguesas, isto é, não antecipa qualquer dificuldade de Portugal no pagamento dos seus compromissos. O Chipre é o único país da UE onde esse risco não é visto como baixo (não é feita uma análise à Grécia). E para o longo prazo, cuja análise já leva em conta questões como a evolução demográfica e a natureza do sistema de pensões, o risco de sustentabilidade das finanças públicas portuguesas deixa de ser considerado alto, passando ao nível “médio (baixo)”. Neste caso, os países onde é identificada uma situação mais preocupante são a Bélgica, Espanha, Itália, Luxemburgo, Hungria e Reino Unido.