Nasceu no pós-Primeira Guerra como resposta a um expressionismo em decadência num mundo em transformação e a precisar, naturalmente, de optimismo e de ordem. Propunha-se cruzar as artes, combinar a tecnologia com o saber fazer tradicional, contaminar a indústria com a qualidade do produto feito por mãos experientes e atentas ao detalhe. Passaram 100 anos e a aura experimentalista da Bauhaus permanece intocada. Enquanto escola criada pelo arquitecto Walter Gropius a 1 de Abril de 1919, com artistas como Paul Klee, Josef Albers e László Moholy-Nagy entre os seus professores, durou apenas 14 anos — a chegada dos nazis ao poder em 1933 ditaram-lhe o fim —, mas como sinónimo do moderno perpetuou-se. O seu gesto de ruptura, o novo modo de vida que propunha e o olhar que lançou sobre a arte, a arquitectura, o design, a fotografia e as artes performativas passaram a ser referências difíceis de contornar.
A Alemanha está a celebrá-la em dezenas de exposições, espectáculos e roteiros especiais, com paragem obrigatória nas cidades que lhe serviram de sede entre 1919 e 1933 — Weimar, Dessau, Berlim — e com outras mais surpreendentes.
Weimar e Dessau, dois museus novos
Estas duas cidades tomaram o centenário como pretexto para inaugurar novos museus dedicados à escola que nos pôs a pensar que o moderno tanto podia ser uma utopia, como algo de muito concreto, materializável em casas, berços, candeeiros, cadeiras ou tabuleiros de xadrez. O de Weimar, um projecto da arquitecta Heike Hanada, abre a 6 de Abril com uma exposição que inclui 1000 peças saídas da mais antiga das colecções de objectos da Bauhaus, em que estão representados Klee, Marcel Breuer ou Marianne Brandt. O de Dessau, local do mítico edifício-sede de Gropius e da sua Casa dos Mestres, uma colónia de artistas onde viviam e trabalhavam os seus professores, é inaugurado a 9 de Setembro. O programa de exposições vai mostrar o quotidiano da escola, a forma como as suas actividades eram divulgadas e o papel que nela tiveram as mulheres.
Celle, a cidade de Otto Haesler
Festejar o centenário da Bauhaus permite celebrar a arquitectura moderna no geral, divulgando a obra de figuras mais discretas, quando comparadas com Gropius ou Mies van der Rohe. Otto Haesler é uma delas. Sob o mote O Barroco Encontra a Bauhaus, Celle, cidade da Baixa Saxónia a 120km de Hamburgo, propõe visitas guiadas a algumas das principais obras de Haesler, que ali começou a trabalhar na construção de moradias com uma linguagem tradicional para os mais ricos, e que acabaria por se notabilizar, sobretudo, pelos bairros de rendas acessíveis e pela escola primária que ainda hoje funciona.
Este arquitecto, que trabalhou de acordo com os princípios da Nova Objectividade, projectou em Celle nos anos 1920 e 30 três conjuntos residenciais em que, tirando partido das modernas técnicas de construção com recurso a estruturas de aço e a revestimentos e outros materiais de produção industrial, reduziu drasticamente os custos e aumentou a qualidade das casas, dando resposta às necessidades da Alemanha do pós-Primeira Guerra.
Em Maio, esta cidade que é também famosa pelas suas casas centenárias em madeira e tijolo, pelo seu palácio com uma magnífica capela renascentista e pela criação de cavalos, reabre o Museu Haesler, que tem estado fechado para remodelação, e dá início a um extenso programa de conferências e visitas guiadas que procura dar a este arquitecto nascido em Munique a atenção que o seu trabalho merece.
A mina mais bonita do mundo
Entre os roteiros da arquitectura moderna que o Turismo Alemão promove neste centenário da Bauhaus, há vários edifícios ou conjuntos classificados como património mundial. Aqui destacamos dois: a Mina de Carvão de Zollverein, em Essen, construída entre 1926 e 1932 e hoje transformada num complexo com museus, galerias e espaços de conferência e concertos; e a Fábrica Fagus (1911-1913), em Alfeld, que há mais de 100 anos produz formas e moldes para sapatos.
A mina, construída com a eficiência em mente e usando os equipamentos mais evoluídos do arranque do século XX, é sempre apresentada como a mais bonita do mundo graças ao Poço 12, aberto em 1932. Funcionou até 1986 e é hoje um centro de cultura e lazer, com intervenções do arquitecto holandês Rem Koolhaas. A fábrica onde ainda trabalham 350 pessoas, um projecto começado por Eduard Werner e finalizado por Walter Gropius e Adolf Meyer, também é visitável e o seu refeitório, bem iluminado, está aberto a quem vem de fora.
A Bauhaus também se dança
O Museu LWL, em Münster, associa-se ao centenário com uma exposição (A Bauhaus e a América. Experiências com Luz e Movimento) e um espectáculo que propõem, até 3 de Março, colocar o foco sobre os artistas e arquitectos que, depois de encerrada a escola em 1933, em virtude da pressão sobre ela exercida pelos nacional-socialistas no poder, se exilaram nos Estados Unidos, onde continuaram a trabalhar.
Pegando no palco como laboratório e território fértil para o cruzamento de artes e saberes que está na génese da Bauhaus, a equipa do museu foi à procura de obras na dança, na performance ou no cinema em que o experimentalismo tenha tornado evidente a influência dos artistas e dos princípios da escola alemã nos EUA. Uma influência que, a partir dos anos 1950, faz o caminho inverso e se impõe na produção europeia, escrevem os curadores desta exposição que conta com empréstimos de importantes museus internacionais, como o Centro Georges Pompidou (Paris) e a Tate Modern (Londres), e que inclui trabalhos de Josef Albers, László Moholy-Nagy, Robert Rauschenberg, Barbara Morgan, John Cage, James Turrell, Merce Cunningham, Lucinda Childs e, claro, Oskar Schlemmer, o homem a quem se deve o Ballet Triádico.
MESH (2 e 3 de Fevereiro; 9 e 10 de Março), uma criação da dupla de coreógrafos Matthias Markstein/Isaac Spencer e da cenógrafa Nora Maria Bräuer, associa-se à exposição para explorar o impacto que a Bauhaus teve na dança moderna americana.
A Fugas viajou a convite do Turismo Alemão