Quando o fim do amor não é (aparentemente) o fim do negócio
Jeff e MacKenzie Bezos anunciaram o divórcio. O homem mais rico do mundo – que destronou Bill Gates em 2016 – poderá deixar de sê-lo, se tiver de dividir a sua fortuna com a futura ex-mulher.
Os “pais da Amazon” vão divorciar-se. A informação de que Jeff e MacKenzie Bezos terminaram o casamento – que não foi totalmente inesperada porque o casal já fazia vidas separadas – foi divulgada na quarta-feira. Mas, apesar do divórcio, não estamos a falar de um corte total: Jeff e MacKenzie fazem planos para continuar unidos pelos negócios.
Os 25 anos em comum – uma parte deles a alimentar o sonho que era a Amazon e a outra parte a colher os frutos do negócio – chegaram ao fim com um comunicado no Twitter assinado pelos dois: “Decidimos divorciar-nos e continuar com as nossas vidas conjuntas enquanto amigos”. “Se soubéssemos que nos separaríamos depois de 25 anos, faríamos tudo outra vez. Já tivemos uma grande vida em conjunto enquanto estivemos casados e também antecipamos belos futuros, enquanto pais, amigos, parceiros de negócios e de projectos e pessoas à procura de empreendimentos e aventuras.”
As razões que levaram ao fim desta relação não são oficialmente conhecidas. Circulam rumores de que Jeff Bezos terá outro interesse romântico – a ex-pivô da Fox, Lauren Sanchez – mas, por enquanto, o multimilionário não assumiu a relação.
A Amazon, a maior retalhista online da actualidade, nasceu na cabeça de Jeff Bezos, mas MacKenzie é uma das peças fundamentais que permite compreender o sucesso. Os dois conheceram-se em 1992, em Nova Iorque, quando trabalhavam para o fundo de investimento D.E Shaw. Na altura, Bezos, que já era vice-presidente do fundo, estava a fazer entrevistas para um posto de trabalho. MacKenzie concorreu e conseguiu o lugar.
Tinham poucas coisas em comum. Ambos tinham estudado na Universidade de Princeton: Jeff estudou engenharia electrónica e ciências da computação e ela filologia inglesa. De resto eram o oposto um do outro: ele era extrovertido e gostava de atenção pública; ela, tímida e reservada. A própria MacKenzie comentou, em algumas entrevistas, que eram um casal pouco comum. À época, ela tinha 23 anos e queria ser escritora – um sonho muito diferente daquele que a levou a entrar naquele escritório, enquanto assistente de investigação.
Jeff trabalhava no escritório ao lado do dela: “Pelas paredes ouvia-o a rir-se com aquelas gargalhadas enormes”, disse MacKenzie. “Todo o dia. Foi mesmo amor à primeira audição.” E deu o primeiro passo: convidá-lo para almoçar. Seis meses depois estavam casados, num carro com destino a Seattle para nunca mais voltar a Nova Iorque.
O grande plano para a Amazon nasceu nessa viagem. MacKenzie ficou do lado de Jeff desde o primeiro momento: reconheceu-lhe de imediato o mérito da ideia que viu nascer do nada. “O que há de melhor do que isso?”
Uma livraria na garagem
A Amazon.com nasceu oficialmente em 1994 como uma livraria online, com sede na garagem numa casa com uma assoalhada alugada pelo casal Jeff e MacKenzie. Para Jeff, a mulher foi fundamental para o seu nascimento. Foi a sua primeira funcionária: assumiu a contabilidade da empresa nos primeiros anos e negociou o primeiro contrato com uma transportadora – ironicamente, a partir de um espaço Starbucks que havia dentro de uma livraria Barns and Nobel junto da casa onde viviam, de acordo com uma reportagem da revista Wired de 1999.
Com o tempo, e ao contrário do marido, MacKenzie, hoje com 44 anos, preferiu manter-se fora das luzes da ribalta e deixou, com o tempo, de ter uma parte activa na Amazon. Dedicou-se à escrita – a sua ocupação principal – e lançou dois livros: A testing of Luther Albright, em 2005, e Traps, em 2013. Trabalha a partir de casa, onde também toma conta dos quatro filhos do casal: três adolescentes e uma menina, adoptada na China.
O sucesso do projecto não foi imediato, mas chegou. Durante os cinco primeiros anos de vida, a Amazon não trouxe muito retorno aos seus fundadores. Hoje é uma das empresas mais caras do mundo, com um valor de mercado de 797 mil milhões de dólares. Oferece muito mais do que livros: da tecnologia aos utensílios de cozinha, a Amazon já se tornou na maior retalhista mundial. Saiu da Internet com as lojas Amazon Go (inovadoras por serem as primeiras sem empregados) e entrou no mercado audiovisual com a Amazon Prime Video, fazendo concorrência directa à Netflix. Mas os planos megalómanos de Bezos não se ficam por aqui.
O homem forte da Amazon fundou ainda a empresa de exploração espacial Blue Origin – com uma factura anual de cerca de um milhão de dólares – e tornou-se no dono do reputado jornal norte-americano Washington Post. Para além disso destronou Bill Gates, um dos fundadores da Microsoft, como o homem mais rico do mundo, em 2016 – algo que pode estar prestes a mudar.
A mulher mais rica do mundo
O anúncio do divórcio já tem dias, mas até agora, ainda não se sabe de que forma é que os activos do casal vão ser divididos – e isto inclui a participação de 16% na Amazon, para além das cinco casas (em Seattle, Los Angeles, Washington, Texas e Nova Iorque). De acordo com a Bloomberg, o casal não celebrou nenhum acordo nupcial o que deixa em aberto vários caminhos, agora que a separação será oficializada.
Sem acordo prévio, o mais certo é que os bens sejam divididos por igual. Pelo menos é isso que prevê a lei do estado de Washington, onde vive o casal e onde a Amazon tem a sua sede: “O dinheiro ganho por qualquer um dos cônjuges durante o casamento e toda a propriedade comprada com esses rendimentos são consideradas propriedades comuns e são detidas igualmente pelo marido e pela mulher”, lê-se no site Nolo, um guia sobre leis de cada estado norte-americano. Em caso de divórcio, é expectável que os bens e as dívidas “sejam divididos de forma equitativa pelo Tribunal”, especialmente “se o casal não conseguir negociar um acordo”.
Jeff Bezos é actualmente o homem mais rico do mundo: a quase totalidade do seu património, avaliado em 125 mil milhões de dólares (109 mil milhões de euros) provém das acções que tem na Amazon. Se dividisse a sua riqueza a meio com a ex-mulher, deixava vago o lugar de homem mais rico do mundo para Bill Gates, que actualmente é o número dois, mas faria Mackenzie a mulher mais rica do mundo – com uma fortuna de cerca de 62 mil milhões de dólares. E mesmo que a autora receba apenas uma percentagem, continuará a pertencer ao clube restrito de mulheres com uma conta bancária com nove zeros.
Actualmente, o título de mulher mais rica do mundo pertence à herdeira da L’Oreal, Françoise Bettencourt Meyers, neta do fundador da marca de cosméticos, que tem um património avaliado em 45,6 mil milhões de dólares. Tal como Françoise (e MacKenzie Bezos), quase todas as mulheres que aparecem no pódio das mais ricas da Bloomberg herdaram o dinheiro ou conseguiram-no depois de um divórcio.
No caso de Mackenzie, se vier a ficar com metade do que é do ex-marido, há uma grande hipótese de ficar com a segunda maior fatia da Amazon – 8%. Actualmente, a segunda maior accionista é a Vanguard, consultora de investimento, que detém 6% da empresa.
Ainda não é certo que isto vá acontecer: MacKenzie pode pedir mais (ou menos) e Jeff Bezos pode recusar-se a dar-lhe poder sobre a Amazon, alegando que a valorização das acções se deveu à sua gestão, que nada teve a ver com MacKenzie Bezos.
Mas se Mackenzie conseguir mesmo metade das acções da Amazon, o ex-casal mais rico do mundo vai mesmo continuar a ser “parceiro de negócios e de projectos”, tal como preconiza o comunicado conjunto. Até lá, a incógnita sobre o futuro papel de Mackenzie permanece.