Trump e Mnuchin agitam os mercados que já estão nervosos
Donald Trump não larga a Fed, voltando a criticar o ritmo de taxas de juro depois de um comunicado do secretário do Estado do Tesouro sobre os mercados ter gerado alguma ansiedade num ambiente de queda das bolsas.
Em pleno Natal e já a braços com múltiplas crises de iniciativa presidencial, como a paralisação parcial dos serviços federais devido à insistência em obter verbas para começar a construir um muro na fronteira com o México, Donald Trump continua a criar instabilidade. Ao criticar a política de subida das taxas de juro seguida pelo presidente da Reserva Federal norte-americana (Fed), Jerome Powell, por si nomeado e em funções desde o início do ano, agitou de novo as nuvens de tempestade.
“O único problema da nossa economia é a Fed”, tweetou Trump na segunda-feira, quando as bolsas ainda estavam abertas. Cerca de 24 horas antes o secretário de Estado do Tesouro, Steven Mnuchin, tinha emitido um comunicado onde afirmou que se tinha encontrado com os maiores banqueiros e não havia problemas de liquidez e os mercados “continuam a funcionar normalmente”. A estratégia, algo inesperada, trouxe mais nervosismo do que tranquilidade aos investidores.
Os três mais importantes índices da bolsa norte-americanos, que já estavam em tendência decrescente, tiveram uma queda de mais de 2%. Os responsáveis da Fed, defendeu, “não têm sensibilidade para o mercado, não entendem a necessidade das guerras comerciais ou o dólar forte ou os shutdowns democratas por causa da fronteira”. E os media norte-americanos encheram-se de notícias e análises sobre como Trump não tem poderes para simplesmente despedir Jerome Powell, como aparentemente tinha vontade, sem pôr em causa a independência do Banco Central.
Esta terça-feira, Trump voltou à carga, ao afirmar, perante um grupo de jornalistas na Casa Branca, que a Fed está “a subir as taxas de juro porque acham que a economia está muito bem”. “Acho que vão perceber [que não devem fazer isso] muito rapidamente", sublinhou, citado pela Reuters.
Os movimentos da Fed
Na semana passada, a Fed voltou a subir as taxas de juro, tal como era esperado, e apesar da pressão política de Trump sob a independência do banco central. Foram mais 25 pontos base, para o intervalo de 2,25%-2,5%, e a quarta subida este ano (a nona desde o início do ciclo, em 2015). Com esta decisão veio também o anúncio de que o banco central espera um crescimento mais moderado nos EUA: no ano que vem, diz a Fed, a economia vai crescer 2,3% (em vez de 2,5%).
Trump vê estas subidas dos juros como más notícias, já que juros mais altos encarecem o custo dos empréstimos e podem baixar o ritmo dos investimentos e do consumo (nomeadamente na habitação). A subida das taxas deve continuar em 2019, tendo em conta o mercado de trabalho e a inflação. Se antes a ideia era subir três vezes as taxas em 2019, agora a perspectiva é de dois aumentos (algo que os mercados não gostaram, já que esperavam uma maior redução do ritmo).
Numa conjuntura de enorme volatilidade, o comentário de Trump na segunda-feira sobre a estratégia do banco central, e a pressão que tem colocado, foi mais uma razão para justificar a venda de acções (com refúgio em outros activos) que os investidores têm praticado nas últimas semanas. Num clima de nervosismo qualquer motivo pode servir para os investidores se desfazerem de posições accionistas. Esta terça-feira, o principal índice do Japão, o Nikkei, caiu 5%, e amanhã, quarta-feira, ver-se-á como se comportam as bolsas ocidentais (fechadas devido ao Natal).
O índice tecnológico Nasdaq caiu 8,36% na semana passada, a maior queda desde Novembro de 2008, e já entrou tecnicamente no que se chama bear market (nome dado a um ciclo descendente), ao cair mais de 20% desde o seu pico em Agosto. Há receios de que o longo ciclo de crescimento (bull market) iniciado há quase dez anos no mercado financeiro norte-americano - com influência a nível mundial global - tenha chegado ao fim. No caso do S&P 500, outros dos principais índices, está, segundo a Reuters, a perder 19,8% desde o pico, atingido a 20 de Setembro.
Não se pode dizer que Trump e Casa Branca são a única razão para a conjuntura que se está a viver no mercado bolsista – tudo o que sobe tende a descer, e já há algum tempo que se perspectivava o fim desta vaga de crescimento nas bolsas –, mas o Presidente norte-americano é certamente um dos ingredientes.
Trump "vende" bolsas
Entre os factores de pressão sob os mercados, e de correcção, está o confronto comercial entre os EUA e China e a desaceleração do crescimento das principais economias, bem como a perspectiva de menores ganhos, e dividendos, das grandes empresas.
Esta terça-feira, perante os jornalistas, Trump quis voltar ao seu papel de empresário, “vendendo” os mercados aos cidadãos: as empresas norte-americanas, disse, são “as maiores do mundo” e apresentam uma “tremenda” oportunidade de compra para os investidores. Um corretor de bolsa não teria maior audiência.
A capacidade de tranquilizar os mercados, no entanto, não parece ser uma característica da Casa Branca. Não se está – pelo menos neste momento – numa crise, mas isso não impediu o secretário de Estado do Tesouro, Steven Mnuchin, de se reunir telefonicamente no domingo com os presidentes dos seis principais bancos norte-americanos. O resultado foi um comunicado onde se afirmou que “há muita liquidez disponível para emprestar” aos consumidores e às empresas e outras operações e que os mercados “continuavam a funcionar normalmente”.
O documento dava também conta de um encontro telefónico, na segunda-feira, do grupo de trabalho dos mercados financeiros, presidido por Mnuchin e que reúne o regulador do mercado, a SEC, e o conselho de governadores da Fed.
O resultado do comunicado, notam o New York Times e a BBC, foi nervosismo, e algum espanto. “Assinalou um certo sentimento de pânico e ansiedade que não precisava de estar presente”, afirmou ao diário de Nova iorque Brian Gardner, analista do banco de investimento Keefe, Bruyette & Woods.