Cresap acusa Governo de pôr em causa a sua independência
Numa decisão inédita, a secretária de Estado da Administração Pública recusou, por despacho, os nomes indicados pela comissão de recrutamento para o cargo de director-geral da Administração e do Emprego Público. Cresap acusa Fátima Fonseca de querer um concurso à medida.
A presidente da Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública (Cresap), Júlia Ladeira, acusa o Governo de pôr em causa a sua independência e de querer abrir um novo concurso para director-geral da Administração e do Emprego Pública (DGAEP) à medida de “uma pessoa concreta e identificada”. A posição é assumida numa carta enviada na terça-feira à secretária de Estado da Administração Pública, Fátima Fonseca, depois de a responsável governamental ter recusado os nomes indicados pela Cresap para o cargo, por entender que havia um candidato mais adequado que não fazia parte da lista de finalistas, pondo em causa a forma como o concurso decorreu.
Em resposta ao PÚBLICO, fonte oficial do Ministério das Finanças garante que a decisão tem suporte legal no Estatuto do Pessoal Dirigente, “foi tomada com base na necessidade de alteração do perfil (…), atentas as orientações estratégicas definidas” e está devidamente fundamentada.
Esta não é, no entanto, a opinião de Júlia Ladeira que recebeu a “decisão inédita” com “surpresa e preocupação”. Numa carta que fez chegar ao gabinete de Fátima Fonseca, a presidente da Cresap defende que “apenas se concede (...) a não designação/anulação do procedimento concursal" se o membro do Governo invocar circunstâncias verdadeiramente excepcionais ou que tenham surgido já depois do lançamento do concurso e que o ponham em causa. "Não é o que sucede no caso concreto”, conclui.
“A decisão de não designação (…) reside apenas na circunstância de, após a realização de entrevista no âmbito do provimento do cargo de subdirector-geral, se ter identificado um candidato nessa sede entrevistado como tendo um perfil mais compatível com as orientações estratégicas definidas para o cargo de director-geral”, lê-se na carta enviada já depois de Júlia Ladeira ter transmitido pessoalmente à secretária de Estado a sua posição sobre o assunto.
Para a Cresap, a decisão não tem “cobertura legal” e “põe em causa o princípio basilar de independência subjacente à criação e funcionamento da CRESAP e dos júris" dos concursos. “E mais assim é quando esta decisão é adoptada em conjunto com uma decisão de abertura de um novo procedimento, para o qual não se estabelece, em abstracto, qualquer perfil funcional que deva ser considerado (diferente do anterior), apenas se podendo conceber que o procedimento concursal deve ser tramitado nos mesmos termos do procedimento concursal anterior (pois não se pode conceber que seja tramitado de acordo com um perfil de uma pessoa concreta e identificada)”, refere a Cresap.
Na origem desta tomada de posição está um despacho (com data de 6 de Dezembro e publicado nesta quarta-feira em Diário da República) onde a secretária de Estado põe em causa a forma como o concurso foi conduzido pela Cresap, recusando escolher um dos três nomes indicados para o lugar de responsável máximo da Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP), determinando a abertura de um novo concurso e nomeando um dirigente em substituição.
A secretária de Estado justifica a decisão com o facto de nas entrevistas feitas aos finalistas dos três concursos para a DGAEP (um para o lugar de director-geral e dois para os lugares de subdirectores) ter sido identificado “um candidato com um perfil mais compatível com as orientações estratégicas definidas” para o cargo de director-geral e que não constava da shortlist enviada pela Cresap. Ou seja, quando entrevistou os finalistas dos três concursos, o Governo terá identificado um candidato adequado ao lugar de director-geral, estranhando que ele não estivesse entre os finalistas.
Perante essa situação, a responsável governamental mandou abrir um novo concurso e nomeou um novo director-geral em regime de substituição, lugar que será assegurado por Vasco Hilário, um dos subdirectores da DGAEP da equipa cuja comissão de serviço o Governo optou por não renovar no início do Verão.
Fonte oficial das Finanças confirmou que este era também um dos finalistas dos concursos da DGAEP, sem precisar qual. Infere-se contudo que Vasco Hilário se terá candidatado ao lugar de director-geral e de subdirector e apenas foi seleccionado para a shortlist do segundo – ficando a dúvida sobre se ele será a pessoa identificada pelo Governo como tendo o perfil “compatível com as orientações estratégicas definidas".
Na carta que enviou ao Governo, a Cresap não explica por que razão é possível haver um candidato que encaixa no perfil desenhado para director-geral e não ter lugar nos três finalistas.
Já os concursos para ocupar os dois lugares de subdirector foram concluídos com sucesso. Da lista enviada pela Cresap, o Governo escolheu a licenciada em engenharia química Ana Maria Fortuna Andrade, que actualmente é directora executiva do Agrupamento de Centros de Saúde de Sintra, para ocupar uma das vagas de vogal. A outra vaga será assumida por Maria Eugénia de Almeida Santos, licenciada em direito e que é actualmente técnica superior na Unidade de Implementação da Lei de Enquadramento Orçamental, tendo experiência na área das autarquias locais.
Em Abril, o Governo decidiu não renovar a comissão de serviço da equipa dirigente da DGAEP (composta pela directora-geral, Maria Joana Ramos, e pelos dois subdirectores, Sílvia Gonçalves e Vasco Hilário) que terminava a 1 de Julho. Os concursos para os três lugares foram abertos a 25 de Junho e encerraram a 10 de Julho, não sendo possível determinar quando é que os nomes dos finalistas foram enviados ao Governo.