Jaime Marta Soares: “Mais de 80%, muito próximo de 90%” dos bombeiros não reportaram ocorrências aos CDOS

“A autoridade [de Protecção Civil] deve fazer o que se faz em todos os países do mundo, que é coordenar e deixar o comando aos bombeiros e aos seus comandantes”, afirma o presidente da Liga, reivindicando autonomia de comando. “Não fazemos parte da estrutura do Estado".

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LUSA/MÁRIO CRUZ

A guerra entre bombeiros e Governo transformou-se neste domingo numa guerra de números. Cerca das 20h, o comandante operacional da Protecção Civil, Pedro Nunes, declarou que a autoridade nacional tinha registado hoje um decréscimo de 23%, face a sábado, do número de ocorrências reportadas, um dia depois do “bloqueio” decretado pela Liga de Bombeiros em protesto contra a nova Lei Orgânica da Protecção Civil. Mas uma hora mais tarde, em entrevista à RTP3, Jaime Marta Soares declarou que “mais de 80%, muito próximo de 90% [das corporações de bombeiros], hoje não reportaram aos CDOS [comandos distritais de operações e socorro] da ANPC [Autoridade Nacional de Protecção Civil]”.

Ao mesmo tempo, o presidente da Liga garantiu que o protesto dos bombeiros não coloca em causa “a defesa da vida e dos haveres de todos os portugueses”.

“Nós mantemos exactamente a 100% daquilo que é a nossa actividade. A única coisa que fizemos, e que estamos a fazer, é não reportar os nossos serviços à Autoridade Nacional de Protecção Civil, porque nós funcionamos sem essa ligação”, disse, devolvendo ao ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, as acusações de irresponsabilidade.

“Se há irresponsabilidade, é da parte do senhor ministro, que não cria efectivamente as condições para nós podermos ser melhores na prestação de serviços”, disse, acusando ainda o ministro de incorrer “num crime de ofensa” pelas declarações deste domingo.

"Não fazemos parte da estrutura do Estado"

Na entrevista, Marta Soares reiterou a oposição à nova Lei Orgânica da Protecção Civil e a exigência de autonomia dos bombeiros face ao Estado.

“A autoridade deve fazer o que se faz em todos os países do mundo, que é coordenar e deixar o comando aos bombeiros e aos seus comandantes”, disse, reivindicando “autonomia de comando” para os bombeiros semelhante à conferida à GNR ou a PSP.

“Não fazemos parte da estrutura do Estado. Somos uma organização que cumpre efectivamente a Constituição Portuguesa, que tem o seu regime jurídico”, disse. “Nós substituímos na própria área de socorro o próprio Estado social que está adormecido. Quem está alerta, 100% da noite e do dia, são os bombeiros”, afirmou.

“A Lei Orgânica retira-nos no fim de contas toda a competência que nós defendemos. Nós defendemos uma organização nacional de bombeiros autónoma e com orçamento próprio, que aumenta a operacionalidade e a eficácia e diminui os custos”, declarou, descrevendo o comando nacional descrito no diploma como “uma manta de retalhos”: “Falam num comando nacional em que ninguém comanda nada”.

Luta pode endurecer em Fevereiro

Marta Soares repetiu ainda que “absolutamente nada” das propostas feitas pelos bombeiros ao Governo ao longo de “muitos anos e muitos meses” foi transposto para a Lei Orgânica aprovada em Conselho de Ministros a 25 de Outubro, não só ao nível da autonomia de comando como dos incentivos para bombeiros voluntários, qualificando como “humilhante e insultuoso” o anúncio de descontos nas entradas em monumentos e museus.

Marta Soares deixou ainda críticas à intermunicipalização dos comandos e descreveu como potencialmente inconstitucional a instituição de uma inspecção-geral “que pode entrar nas associações, entidades privadas de direito público, a qualquer hora, sem se fazer anunciar”.

O responsável da Liga prometeu por fim um endurecimento das formas de luta dos bombeiros caso as suas pretensões não sejam ouvidas até ao congresso nacional marcado para Fevereiro, mas sem detalhar a natureza dos eventuais protestos. “O único responsável sobre tudo o que vier a acontecer é o ministro da Administração Interna e o Governo a que pertence”, avisou contudo.

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