Preço das casas sofre primeiro travão a fundo no centro histórico de Lisboa
Preço das casas mais do que duplicou desde 2013, altura em que o Índice de Preços do Centro Histórico de Lisboa atingiu o valor mais baixo. A subida galopante arrefeceu no final do ano passado e neste primeiro semestre travou de vez.
Entre Janeiro e Junho deste ano, e pela primeira vez desde há nove semestres consecutivos, os preços das casas no Centro Histórico de Lisboa registaram uma variação residual de apenas 0,1% face ao semestre imediatamente anterior, entre Julho e Dezembro de 2017.
Mais do que a segunda contracção consecutiva - já que no segundo semestre de 2017 a tendência já fora de abrandamento, com a taxa de variação semestral registada a cair para menos de metade (em cerca de 8,5 pontos percentuais) face aos 14,4% observados na primeira metade desse ano – os números apurados pelo Índice de Preços do Centro Histórico de Lisboa (IPCHL), elaborado pela Confidencial Imobiliário, revelam um travão a fundo neste mercado.
Este índice monitoriza a dinâmica de valorização de imobiliário residencial nas freguesias de Misericórdia, Santa Maria Maior e São Vicente, em Lisboa, e tem por base o valor das transacções obrigatoriamente comunicadas às autarquias, que podem por lei exercer direito de preferência nas transacções que ocorrem em Áreas de Reabilitação Urbana.
“Este abrandamento dos dois últimos semestres faz com que a taxa de variação homóloga se tenha reduzido de forma visível, terminando o primeiro semestre de 2018 nos 6%, após ter atingido os 21,1% no semestre anterior”, lê-se no boletim produzido pela Confidencial Imobiliário a que o PÚBLICO teve acesso.
De acordo com Ricardo Guimarães, director desta empresa especializada em produção estatística no sector do imobiliário, trata-se “de um regresso à normalidade”, já que não é sustentável que um mercado apresente consecutivamente taxas de valorização superiores a 20%.
“O ritmo de valorização foi galopante, mas também porque partiu de uma base com valores muito baixos. É normal que agora entre numa fase de consolidação”, comenta o economista.
Se até agora a valorização foi justificada pela forte pressão da procura e pela acentuada dinâmica de investimento e de reabilitação, esta travagem a fundo não significa que já não haja procura no centro histórico nem imóveis para vender.
“O que há é uma grande incerteza, uma enorme imprevisibilidade face a alterações legislativas que estão a decorrer e que tardam em ficar decididas”, comenta Francisco Bacelar, presidente da Associação dos Mediadores do Imobiliário de Portugal (ASMIP).
Este dirigente refere-se não só ao pacote da habitação e arrendamento que ainda está a ser discutido da Assembleia da República, como as medidas sobre o Alojamento Local que foram discutidas e decididas durante este primeiro semestre e que entraram em vigor no último fim-de-semana. Estas freguesias do centro histórico de Lisboa correspondem a áreas em que ficaram suspensos novos pedidos de registo de alojamento local face à nova lei.
Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP) explica esta acentuada valorização pelo facto de os investidores terem vindo a adquirir imóveis tendo em conta as suas perspectivas de rentabilidade e não o seu valor de mercado. “Só pagaram estes valores exagerados porque esperavam rentabilizá-los no alojamento local. Não era possível pagar aqueles preços pelo imobiliário se estivéssemos a falar do investimento para colocar casas no mercado de arrendamento tradicional”, argumenta Luís Lima.
O presidente da APEMIP recorda que as mexidas na lei do Alojamento Local só entraram em vigor agora, mas vinham a ser discutidas há muito. Esta imprevisibilidade foi agravada nos últimos dias, com a tumultuosa situação na Assembleia da República onde as questões da habitação e do arrendamento ainda andam a ser discutidas, e que terminou com a saída surpreendente da coordenadora do grupo de trabalho. "Ninguém sabe onde isto vai parar. Mas os problemas mantêm-se”, recorda Luís Lima.
Problema não desaparece, mas transfere-se
Os investidores vão continuar a fazer a avaliação do imóvel não pelo valor do activo mas sim através da avaliação da sua rentabilidade, diz Luís Lima. E se os preços no centro histórico já parecem ter atingido o limite, a dinâmica de valorização do preço das casas vai sendo transferida para outras freguesias. “E aí vamos voltar a ter o mesmo problema. O stock das casas disponíveis vai baixando, a procura mantém-se ou aumenta, os preços sobem inevitavelmente. Continua a acontecer no resto da cidade. E eu continuo a acreditar que também aí terão um limite, porque os preços não podem aumentar até ao céu”, ironiza Luís Lima.
Esta percepção dos operadores confirma-se, mais uma vez, nas estatísticas produzidas pela Confidencial Imobiliário. “Se nas freguesias do centro histórico a valorização praticamente estagnou, noutras freguesias assiste-se ainda a uma forte dinâmica de valorização. A pressão da procura sai de um lado, mas transfere-se para outro”, explica Ricardo Guimarães. De acordo com o Índice de Preços Residenciais (IPR), apurado pela Confidencial Imobiliário para o concelho de Lisboa, a trajectória de crescimento verifica-se desde meados de 2013, com uma intensificação da subida desde o final de 2015, resultando em valorizações homólogas acima dos 20% há nove trimestres consecutivos.
O IPR é apurado trimestralmente, e no segundo trimestre de 2018, os preços residenciais em Lisboa subiram 4,9% em termos trimestrais e 21,5% em termos homólogos. Actualmente estão 58% acima dos valores registados em 2007, o último ano antes da crise se ter instalado no sector e no país.
“O crescimento do número de projectos de uso turístico, de comércio e de habitação direccionada para uma gama alta de mercado, além do crescimento da procura internacional, favoreceram o surgimento de uma dinâmica de valorização que, primeiramente, se fez sentir no Centro Histórico e depois começou a contagiar outras zonas da cidade. A intensidade dessa dinâmica e o nível de preços entretanto atingido no Centro deixavam antecipar que o ritmo de valorizações fosse progressivamente suavizar. No contexto da cidade, esta deverá também ser a tendência”, comenta o director do Confidencial Imobiliário.