Inês de Sousa Real, deputada municipal do PAN em Lisboa
Nos últimos anos têm sido dados alguns passos de relevo para reforçar a protecção dos animais, em particular dos animais de companhia, mudando o paradigma das competências do Estado e em particular das autarquias locais, que antes tinham um papel marcadamente sanitarista e que hoje são desafiadas a assumir uma posição de garante do bem-estar dos animais.
A atenção que tem sido dedicada aos direitos dos animais — e em particular aos animais de companhia — não se deve apenas aos avanços alcançados, nomeadamente a criminalização dos maus tratos e do abandono de animais de companhia com a alteração do Código Penal ou a alteração do estatuto jurídico dos animais no Código Civil que os dissociou do regime das coisas. Persistem lacunas que muita tinta têm feito correr.
Passados mais de três anos da criminalização dos maus tratos e do abandono de animais de companhia, verificamos que, tal como se antecipou, nem todas as condutas que directa ou indirectamente acabem por infligir sofrimento a um animal constituem crime. Exemplo disso são os casos de confinamento de animais em espaços exíguos ou varandas, a viver em condições insalubres ou acorrentados de forma lesiva para o seu bem-estar físico e emocional.
O abandono continua a ser um flagelo que atinge, não só animais de companhia,mas também (e cada vez mais) outras espécies, como as exóticas, selvagens ou de pecuária. A verdade é que a negligência continua a pautar a forma como os animais são detidos. Frequentemente, ouvimos relatos de animais que se encontram entregues à sua própria sorte, a deambular nas ruas da cidade, sem qualquer protecção, abrigo, alimento ou água. E não apenas cães e gatos, também animais de grande porte como os cavalos.
A ausência de um regulamento específico em matéria de protecção, bem-estar e saúde animal na larga maioria dos municípios, onde Lisboa, a capital do país, não é infelizmente excepção, também não contribui para diminuir as debilidades sentidas quanto à aplicabilidade da legislação nacional.
De acordo com os diferentes diplomas, como a própria Lei das Autarquias Locais, compete aos municípios a recolha e o alojamento de animais abandonados e errantes, o controlo da população animal através da esterilização (em breve, irá entrar em vigor a proibição dos abates nos canis municipais) e a realização de acções de sensibilização da população para para as questões da protecção animal a partir do 1.º ensino básico.
As autarquias são das instituições sociais que estão melhor posicionadas para educar para alguns aspectos relativos à detenção, à posse, à circulação ou deambulação de animais na via pública, bem como ao alojamento de animais e à execução das respectivas medidas de profilaxia médica e sanitária.
O mesmo se dirá quanto a regular o próprio funcionamento do Centro de Recolha Oficial (canil/gatil municipal), no qual devem ser adoptadas as melhores práticas em termos da gestão e dos cuidados que são prestados aos animais, incluindo no que respeita ao momento de os ceder para adopção e seu posterior acompanhamento.
O Regulamento de Protecção, Bem-estar e Saúde Animal pode fazer a diferença na vida dos animais que partilham a sua vivência connosco, reforçando a protecção. Mas a par da criação de um regulamento, não nos podemos esquecer que prevenir e sensibilizar continua a ser a melhor estratégia se queremos mudar mentalidades e comportamentos, sobretudo quando falamos de seres vivos que estão na nossa total dependência e que não têm, por si só como se defender.