Venezuela: quem cuida dos nossos emigrantes?
Diante da tragédia humanitária em curso na Venezuela, sabendo que haverá um grande número de portugueses afectados, não deveria o Governo criar um programa de estímulo ao regresso daqueles que o quisessem fazer?
1. Já aqui, por mais de uma vez e ainda na semana passada, se alertou para a gravíssima crise humanitária na Venezuela. Antes de toda e qualquer outra consideração, é fundamental alertar para os muitos milhões de cidadãos venezuelanos que neste momento sobrevivem no limiar da fome, estão desprovidos de qualquer serviço básico de saúde, estão simplesmente entregues à insegurança e à violência no seu quotidiano.
Alguns destes milhões, diante da fome e da impotência, optaram por sair do país. A situação humanitária nas fronteiras com o Brasil e com a Colômbia é absolutamente intolerável. Os alertas dados por governos de países próximos, que estão a ser objecto de um grande afluxo de refugiados, designadamente do Equador e do Perú, são altamente preocupantes. Estamos diante de um desastre humanitário, com milhões de pessoas em circulação, com muitas mais sem qualquer hipótese de ajuda. A primeira palavra tem, pois, de ser para a comunidade internacional, que não pode deixar esta mole de seres humanos à mercê da sina que um regime político lhes marcou. Aqui países como Portugal e Espanha ou entidades como a Santa Sé têm especiais responsabilidades históricas e políticas. A verdade é que, tendo em conta as proporções da tragédia em curso, pouco têm feito. É fundamental que usem de todo o seu peso na comunidade global, mas em especial junto da União Europeia, para minimizar e obviar os efeitos desta catástrofe. Antes de qualquer consideração política, é urgente encarar a situação humana, abrir canais junto das inenarráveis autoridades venezuelanas e naturalmente colaborar com o Brasil e com a Colômbia, que não podem ser deixados sozinhos (sob pena de copiarmos o ineficiente modelo europeu, em que os países de fronteira, como a Itália, a Grécia ou Malta, têm de resolver tudo quase a sós).
2. A segunda palavra é devida à comunidade portuguesa. Sabemos que entre cidadãos portugueses e luso-descendentes, estamos diante da segunda mais importante comunidade de emigrantes na América Latina. Entre os mais necessitados neste estertor venezuelano estarão decerto muitos milhares, senão dezenas de milhar de portugueses ou descendentes de portugueses. De tempos a tempos, ouvimos umas declarações esparsas do secretário de Estado competente em razão da matéria, sempre num sentido estranhamente tranquilizador, a roçar o anestesiante. Muito raramente, ouvimos o ministro dos Negócios Estrangeiros tocar o tema, já que ele se especializou na definição da cartilha ideológica do PS mais do que no exercício do seu múnus. É incompreensível que diante de uma crise desta natureza, o Estado português não tenha desenvolvido uma política sistemática de identificação das situações de necessidade e de construção de um programa de apoio.
Ainda neste fim-de-semana, o primeiro-ministro, na sua veste partidária, anunciou um pacote para estímulo do regresso de cidadãos “recém-emigrados” (pacote logo denunciado pelos conselheiros das comunidades portuguesas como pura propaganda). Mas não há ninguém que faça a pergunta: diante da tragédia humanitária em curso na Venezuela, sabendo que haverá um grande número de portugueses afectados, não deveria o Governo criar um programa de estímulo ao regresso daqueles que o quisessem fazer? Diga-se, de passagem, que os portugueses que saíram para a União Europeia não são sequer emigrantes, no sentido que lhes atribui António Costa; são felizmente cidadãos europeus, que usufruem do regime de liberdade de circulação e de mobilidade de trabalho. Estão, pois, grande parte deles numa situação bem mais favorável do que a que têm os portugueses estão expostos ao naufrágio venezuelano.
É, pois, fundamental que a sociedade civil, aí incluídos os partidos da oposição e os meios de comunicação social (que têm estado bastante discretos), exija do Governo uma estratégia e um programa de apoio aos cidadãos portugueses e seus descendentes que sofrem a aflição venezuelana. Mesmo do Presidente da República, sempre tão intimamente ligado às comunidades portuguesas pelo mundo, é necessária, neste particular, uma voz mais forte. O Governo português, seja no plano da concertação internacional, seja no plano do apoio aos portugueses em necessidade, procura assobiar para o alto. É tempo de o fazer descer à terra.
3. Finalmente, uma última palavra, já do domínio do juízo político. Considerei sempre escandalosa a ligação de José Sócrates e de alguns dos seus ministros ao “chavismo” venezuelano. De resto, o estilo megalómano e de caudilho de Chávez era uma clara inspiração para Sócrates, como há largos anos escrevi nestas páginas. Era evidente a transição para a ditadura e para um regime oligárquico de empobrecimento generalizado. Transição que se consumou em todo o seu esplendor quando o poder passa para Nicolás Maduro e o regime desce aos infernos da indigência política. Neste sentido, mesmo algumas iniciativas de Paulo Portas, quando ministro dos Negócios Estrangeiros, são, a meu ver, censuráveis. Uma política externa cuidadosa, salvaguardando a posição dos portugueses ali residentes, não implica cumplicidades nem apoios explícitos.
Mas nada se compara à apologia que o PCP e o Bloco – e muitas personalidades da área – fazem do regime chavista e da sua supersticiosa reencarnação em Maduro. Como explicam o PCP, o Bloco e todos esses académicos a fuga desesperada de milhões de cidadãos venezuelanos? Como podem apoiar a supressão das mais elementares liberdades políticas? Como podem ter como modelo uma política económica que gerou a mais funda ruína e miséria? Tantas são as palavras para os refugiados do Mediterrâneo, sejam as vítimas da guerra na Síria ou da fome no Saara, e tão poucas ou mesmo nenhumas para as vítimas de um regime político que criminosamente destruiu a economia de um dos países com mais riqueza das Américas. Sobre o modelo de sociedade desejado pelo Bloco e o PCP não há nem pode haver ilusões. É soturno.
SIM John McCain. A virtude militar, a coragem política e a independência pessoal são uma referência incontornável para a democracia americana e para a democracia ocidental.
NÃO Arcebispo Vigano. O aproveitamento oportunista da tragédia dos abusos sexuais por banda de sectores que nunca defenderam a transparência e abertura da Igreja é chocante.