A cozinha mais descontraída de Tiago Bonito ocupa um Canto Redondo

O novo restaurante na Casa da Calçada, em Amarante, não tem a formalidade do Largo do Paço. Quer ser uma alternativa para os hóspedes do hotel e atrair os amarantinos.

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Pedro Costa
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Quem se hospedava no Hotel Casa da Calçada, em Amarante, só tinha uma opção para almoçar e jantar sem sair dos portões da propriedade — o Largo do Paço, com uma estrela Michelin. “E quem prova um menu de degustação numa noite, não vai repetir a experiência na noite seguinte.” Palavras do chef executivo do Largo do Paço, o jovem Tiago Bonito, em jeito de introdução sobre o novo restaurante na sua alçada, o Canto Redondo. Numa antiga sala de apoio ao bar do hotel, com mobiliário clássico, sofás confortáveis e mesas baixas — sem condições para acolher almoços e jantares —, abriu agora um restaurante mais descontraído.

A carta criada pelo chef é bem mais descontraída do que a do vizinho Largo do Paço, mas “mantém a identidade” que Tiago Bonito faz questão de incluir em todos os pratos que confecciona. O Canto Redondo, continua, “é uma alternativa dentro da Casa da Calçada, uma segunda opção para o cliente e para Amarante”. “Abrimos este espaço a pensar também na cidade, para atrair as pessoas que não estão no hotel, mas querem conhecer a nossa cozinha.”

Aberto diariamente para almoços, o menu do Canto Redondo “é mais consensual, baseado em sabores portugueses, uma comida de conforto”. “É uma cozinha menos elaborada, sim, mas não quer dizer que seja mais relaxada”, sublinha Tiago Bonito. Nas entradas há carpaccio de bacalhau meia cura com pimentos assados e ovo de codorniz, amêijoas à Bulhão Pato e camarão frito com pimentos padrón ou presunto serrano com cogumelos frescos e queijo São Jorge. O robalo com arroz malandrinho de sapateira e uma açorda de lavagante com aguardente velha e coentros são as opções de peixe, duas, tal como as de carne: bife de novilho com batata-doce e salsa e chuleton maturado grelhado. Há ainda uma opção de pasta e um risotto. Nas sobremesas, destaque para o pastel de nata de comer à colher e o cheesecake de ananás dos Açores, com gelado de chá verde e lima.

“Esta cozinha tem muito sabor e um bom produto. Os nossos clientes, quando nos visitam, não estão à procura de sushi”, brinca Tiago Bonito, que assim tem mais tempo — bem como a sua equipa — para se dedicar ao Largo do Paço. Este último pode assim encerrar aos almoços e duas vezes por semana (domingo e segunda-feira), para que todos se foquem nos menus de degustação já premiados. O Canto Redondo está aberto ao jantar apenas ao domingo e à segunda-feira e, nos restantes dias, entre as 15h e as 23h, tem uma carta ligeira (salada César, prego em bolo do caco, risotto).

Um homem do mar em Amarante

Tiago Bonito, nascido perto de Coimbra há 31 anos, mudou-se para Amarante há um ano e meio para ocupar a posição de chef executivo do restaurante da icónica Casa da Calçada. Pouco tempo depois, recebia a notícia de que tinha conseguido manter a estrela Michelin do Largo do Paço, numa estreia que o empurrou (ainda mais) para a ribalta. Ainda não teve tempo para criar raízes na cidade banhada pelo Tâmega, confessa, mas tem conhecido a região, explorado as opções de fornecedores locais.

Faz questão de conhecer pessoalmente os homens e as mulheres a quem compra legumes, queijos, carne, peixe. Mostra-lhes como uma batata ou uma cenoura pode ser “mais do que batata ou uma cenoura vendida em sacos de uma tonelada”. “Gosto de mostrar aos fornecedores o que faço, dou-lhes a provar o que cozinho com o produto que eles vendem, convido a família”, conta. Isto para mostrar que uma estrela Michelin não se conquista apenas entre as quatro paredes da cozinha do Largo do Paço, na qual trabalham 15 pessoas.

Sempre que pode, Tiago Bonito pega no carro e vai até ao mercado municipal de Matosinhos e de Angeiras escolher e comprar o marisco e o peixe que preenchem a carta do Largo do Paço — e, desde Junho, também do Canto Redondo. “Aqui em Amarante, a tradição é o fumeiro, o pouco peixe que há é de rio”, justifica. E isto, para um amante da pesca e do mar como Tiago, é motivo para deixar algumas saudades dos anos em que trabalhou no Algarve e em Tróia. Sempre que consegue, contudo, junta-se aos amigos, mais a Sul, para dias de pescaria em alto-mar.

“Gosto muito do mar, dos mariscos, da frescura e das texturas do peixe”, vai repetindo ao longo da conversa. E este gosto passa depois para a concepção das receitas, “pratos com sabores fortes, a maresia, a sal”. “Tenho até, na carta do Largo do Paço, um cherne ao sal que é um prato que eu faço muitas vezes para os amigos, estão sempre a pedir-me.”

Um jantar ibérico a quatro mãos (e três estrelas Michelin)

A primeira edição do Chef d’Oeuvre não tinha contornos de competição. Mas, se tivesse, o resultado teria sido um empate, daqueles a pedir desforra. À cozinha e ao staff de Tiago Bonito no Largo do Paço (com uma estrela Michelin), em Amarante, juntou-se o chef Óscar Velasco, do restaurante Santceloni (duas estrelas Michelin), em Madrid. O objectivo? A preparação, a quatro mãos, de um menu de degustação a ser servido no restaurante do Hotel Casa da Calçada com o carimbo Chef d’Oeuvre — que é o mesmo que dizer “obra-prima de um artista”. A ideia dos dois chefs foi uma “junção ibérica” do trabalho de cada um: Óscar Velasco trouxe de Madrid um “frango do campo” e alguns caldos que levam vários dias a preparar, Tiago Bonito apostou nos peixes portugueses.

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A preparação do jantar a quatro mãos Pedro Costa

A abertura do jantar esteve a cargo do chef a jogar em casa: a uma delicada caixa de caviar, Tiago Bonito acrescentou atum, rábano picante, ovo, cebolinho e couve-flor. A entrada é uma saudação ao cliente que chega ao Largo do Paço, servida a quem peça um dos dois menus de degustação do restaurante (Caminhos e Identidade). Seguiu-se uma tosta de trigo com frango e molho agridoce “tipicamente espanhol”, explicou Óscar Velasco durante a preparação do mesmo, e um lírio dos Açores com maçã e maracujá. “Este é um dos pratos que fala sobre mim”, confidenciou Tiago Bonito. “O lírio é um peixe mais gordo, que faz a rota migratória nos Açores, e sirvo com maracujá para incluir a parte tropical.” Mas Óscar Velasco não quis ficar atrás nos sabores do mar e optou por um lagostim sobre folha de alface e sabores do Oriente.

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Nos pratos principais, o chef português escolheu aquele que é o seu “peixe preferido”, o pregado, com carabineiro, plâncton e espargos. “O carabineiro diz-me muito sobre o Algarve e os anos que lá passei, traz à mesa a maresia.” A costela de cabrito cozinhada pelo chef espanhol foi acompanhada por avelã, alho negro e puré de abóbora assada.

Para terminar, Óscar Velasco deu a ribalta a Montse Abellán, a chef de pastelaria do Santceloni, que levou à Casa da Calçada um granizado de cenoura, lima, endro, aveia e gengibre. Pistácio, café gelado, framboesa e mascarpone, com assinatura portuguesa, fechou o jantar.

O Chef d’Oeuvre, garante Álvaro Aragão, director da Casa da Calçada, é para repetir “duas a três vezes por ano”, sempre com chefs de outros hotéis da Relais & Chateaux.

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