Em 2017, a concentração de dióxido de carbono (e não só) atingiu um novo recorde
O último ano está entre os três anos mais quentes desde que começaram os registos meteorológicos em 1880 e foi também o mais quente sem o fenómeno do El Niño.
A concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera continua a subir. Em 2017, o principal gás com efeito de estufa atingiu as 405 partes por milhão (ppm), segundo um relatório anual da agência dos oceanos e da atmosfera dos Estados Unidos (NOAA) e da Sociedade Americana de Meteorologia agora divulgado. Em 2016 tinham-se já atingido as 403,3 ppm – nessa altura, para encontrarmos valores idênticos de CO2 na atmosfera tínhamos de recuar três a cinco milhões de anos quando a Terra era dois a três graus Celsius mais quente do que hoje.
O registo de 2017 é ainda o mais elevado em amostras de gelo de até 800 mil anos. Também houve um aumento da concentração de outros gases como o metano e o óxido nitroso.
Para percebermos a concentração de CO2, temos como referência a curva de Keeling. Em 1958, como se suspeitava que o CO2 estava a aumentar na atmosfera, o químico norte-americano Charles Keeling quis medir de forma rigorosa a concentração desse gás. Para isso, colocou aparelhos no topo do vulcão Mauna Loa (Havai). Outro foi também instalado na Antárctida. Logo nesse ano verificou-se que havia uma concentração de CO2 de 316 ppm, ou seja, para cada milhão de moléculas diferentes na atmosfera havia 316 de CO2.
Desde então, a curva de Keeling – que tem uma linha com altos e baixos em forma de serra que correspondem à diferença entre o Inverno e o Verão no Hemisfério Norte, onde há mais florestas na Terra – tem estado imparável. “A taxa de crescimento global de dióxido de carbono quase que quadruplicou desde o início dos anos 60”, lê-se num resumo sobre o relatório publicado agora e compilado por mais de 500 cientistas de 65 países. Também, segundo dados ainda preliminares da NOAA, os níveis e dióxido de carbono já atingiram as 411,25 ppm em Maio deste ano.
Voltando ao actual relatório, assinala-se que as temperaturas superficiais globais foram entre 0,38 e 0,48 graus Celsius acima da média do período entre 1981 e 2010. Num comunicado da NOAA, destaca-se ainda que 2017 foi um dos três anos mais quentes desde que começaram os registos meteorológicos sistemáticos em 1880 – 2016 foi o que registou temperaturas mais altas – e foi o mais quente sem o El Niño, fenómeno de transporte de uma massa de água quente desde a Austrália até às costas da América do Sul, por altura do Natal.
No último ano, o nível do mar também atingiu um valor recorde pelo sexto ano consecutivo. O seu nível médio está agora 7,7 centímetros acima do registado em 1993 e alerta-se ainda que tem subido cerca de 3,1 centímetros por década.
Portugal: seco e sem precipitação
Ao longo do relatório, são várias as chamadas de atenção para muitos países. Por exemplo, sublinha-se que 2017 foi o segundo ano mais seco em Espanha e o terceiro mais seco em Portugal desde 1931. “Em Setembro, a precipitação média em Portugal foi apenas 5% da que era normal entre 1971 e 2000. Em muitos sítios, a precipitação não foi, de todo, medida”, destaca-se, acrescentando que se seguiu o Outubro mais seco dos últimos 20 anos afectado por ventos fortes causados pelo furacão Ofélia, que dificultou a extinção de fogos em ambos os países da Península Ibérica.
Já na Argentina, em Janeiro, registaram-se 43,4 graus – a temperatura mais alta até agora num sítio tão a sul do planeta –, enquanto o Paquistão alcançou os 53,5 graus em Maio.
Já no Árctico, a temperatura anual média do ar à superfície foi a segunda mais alta desde 1900, ultrapassada apenas pela de 2016. O documento sublinha que “o Árctico não conheceu temperaturas tão anormalmente elevadas do ar e da superfície da água desde há dois mil anos”. Em Março, a extensão do gelo marinho registou uma descida de 8% relativamente à média entre 1981 e 2010, atingindo assim o menor valor desde que se fazem estes registos há 38 anos.
No extremo oposto, na Antárctida, a 1 de Março, o gelo marinho atingiu o valor diário mais baixo desde que se fazem estas observações de satélite desde 1978.
Os recifes de coral também não são esquecidos no documento. Sublinha-se que um fenómeno de branqueamento que durou desde Junho de 2014 até Maio de 2017 teve impactos “sem precedentes” nos recifes e que mais de 95% dos corais de algumas áreas afectadas morreram. “Acho realmente surpreendente como estas temperaturas recordes afectaram os ecossistemas no oceano”, disse ao diário britânico The Guardian Gregory Johnson, oceanógrafo da NOAA. Quanto aos ciclones tropicais, houve 85, acima da média entre 1981 e 2010 que foi de 82.