Anish Kapoor: “A geometria está cheia de complicações psíquicas”

O artista britânico cujas obras monumentais chegaram esta sexta-feira a Serralves está interessado no momento em que as suas esculturas se autonomizam da geometria e começam a fazer "coisas esquisitas".

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Anish Kapoor junto a Corpo Seccional, que apresentou pela primeira vez em Versalhes em 2015 PAULO PIMENTA

Anish Kapoor, o conhecido escultor britânico que inaugurou esta sexta-feira no Museu de Arte Contemporânea de Serralves uma exposição em que junta várias obras no parque e ainda um conjunto de maquetas dentro do museu, explica em conversa com o PÚBLICO de onde vêm as suas esculturas.

Na exposição podemos ver muitas formas puras, ou formas ideais: o círculo, o quadrado, a espiral. Mas rapidamente descobrimos que elas não são assim tão simples como parecem e falam de vazio, de escuridão, de infinito. É aqui que está a verdadeira conversa que quer ter através das suas esculturas?
A geometria é fascinante porque pensamos nela como uma coisa puramente racional, mas está cheia de complicações psíquicas. É nisso que estou interessado, naquele momento em que um objecto geométrico começa a fazer qualquer coisa esquisita, algo de imprevisível.

Como quando um buraco em forma de círculo nos puxa para o escuro?
Precisamente. Como é que uma coisa que nasce da mente se transforma em algo que não é compreensível por essa mente. É essa ideia, e ela é literalmente verdadeira. A geometria não é racional.

Por isso, estamos a falar mais de formas ideais do que de formas puras?
Sim. Claro que as formas ideais também se referem a algum princípio cósmico, a algo que está lá fora.

Por que é que escolheu pôr o Espelho do Céu naquele lugar, o Jardim do Relógio de Sol, que é um espaço mais íntimo? Costumamos vê-lo em espaços mais abertos.
Gosto bastante que esteja todo rodeado por árvores. Naquele espaço tem a possibilidade de ser lido mais como uma pintura, ao reflectir o céu que muda constantemente, ao invertê-lo e trazê-lo para o chão. É quase como pôr lá água, como um jardim que pode ter um lago ao centro. Espelho do Céu é uma espécie de um equivalente esquisito de um lago.

É a verticalização da ideia de um lago?
Sim, sim.

Podemos estabelecer uma relação entre o monólito que vemos no interior do museu (Whiteout, 2004), com o seu branco extremo para o qual é difícil olhar, e a obra no parque, Descida para o Limbo (1992), com a sua extrema escuridão? São as tais relações de opostos que explora?
Também há uma relação entre Espelho do Céu e o vazio escuro de Descida para o Limbo, além da cegueira branca de Whiteout, como lhe podemos chamar, este “não me podes ver” ou “não estou aqui como objecto”.

É um dos seus não-objectos?
Sim, é uma dessas coisas a que volto como um ideal, constantemente. Os objectos não são, geralmente, como surgem descritos pela sua fisicalidade. São muitas vezes outra coisa. Essa outra coisa é uma espécie de objecto imaterial, uma presença não material. Hoje os cientistas estão interessados numa coisa chamada “matéria escura”, pois o que nós vemos não é suficiente para fazer o universo. De alguma maneira nós temos a matéria escura, algo invisível, que nem percebemos bem o que é. Isso parece provar esta ideia de que estes objectos não podem ser descritos.

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