Faculdades estão a contratar investigadores através de associações privadas

Concursos para vincular bolseiros ao abrigo da lei do emprego científico estão a ser lançados por entidades paralelas às instituições. Ministro da Ciência admite que a situação pode ser ilegal.

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A versão final da lei do emprego científico foi aprovada em Maio de 2017 RICARDO SILVA

Duas faculdades da Universidade de Lisboa (UL) estão a lançar os concursos para a vinculação de bolseiros de investigação, aos quais estão obrigadas pela lei do emprego científico, através de associações privadas de que elas próprias são associadas. A solução pode ser ilegal, admite o próprio ministro da Ciência, Manuel Heitor, mas tem que ser avaliada “caso a caso”.

Em causa estão os bolseiros de investigação do Instituto Superior Técnico, que estão a ser contratados através da Associação do Instituto Superior Técnico para a Investigação e Desenvolvimento, e os da Faculdade de Ciências, cujos editais para a abertura dos concursos foram publicados pela FCiências.ID – Associação para a Investigação e Desenvolvimento de Ciências.

O caso da Faculdade de Ciências é o mais polémico, uma vez que a associação FCiências.ID  foi criada a 10 de Janeiro de 2017, quase meio ano depois da publicação da primeira versão do diploma do emprego científico. A associação do técnico existe há mais tempo, desde Abril de 2011.

No âmbito da nova lei, “a instituição contratante é a instituição de acolhimento do bolseiro a 1 de Setembro de 2016”, sublinha a Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) – entidade pública sob tutela do Ministério da Ciência e que vai financiar estes contratos de trabalho nos primeiros anos – num esclarecimento no seu site, para o qual remeteu o PÚBLICO.

A FCiências.ID, criada apenas no início de 2017, não cumpre este critério. No entanto, também no site da FCT, a mesma associação surge na lista das instituições que já sinalizaram bolseiros para os quais vão ser lançados concursos para a sua contratação, com um total de 94 investigadores abrangidos. No Técnico são 122.

Este não é, porém, o único problema legal que o recurso a associações privadas para a contratação de bolseiros levanta. O próprio ministro da Ciência quem admite que a solução “em alguns casos pode ser uma solução abusiva”.

O diploma “é claro”, defende Manuel Heitor: “São as instituições de acolhimento dos bolseiros que têm de abrir os concursos. Se os investigadores tiverem um vínculo anterior com estas associações, a opção é válida. Se não tiverem, não é.”

Contactada pelo PÚBLICO, fonte do gabinete de comunicação da reitoria da Universidade de Lisboa assegura que os concursos para a contratação de bolseiros “são abertos de acordo com a lei, na instituição onde os bolseiros exercem funções”.

O presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup), Gonçalo Leite Velho, entende que este caso configura uma prática de “outsourcing laboral” por parte das universidades. A utilização de associações privadas para a contratação dos bolseiros é “clara ilegalidade”, acrescenta.

O contrato de trabalho dos bolseiros através de uma associação privada é assim feito com base no Código de Trabalho, em vez da Lei de Trabalho em Funções Públicas, como acontece para os docentes e investigadores dos quadros das instituições de ensino superior e ciência. Ao Código de Trabalho, os investigadores podem assim ter contratos a prazo sucessivos até um limite de três anos. O objectivo é “evitar que estes investigadores sejam incluídos nas carreiras de docente ou de investigador”, acusa Gonçalo Leite Velho.

A lei do emprego científico foi aprovada pelo Governo no Verão de 2016 – mas acabaria por sofrer várias alterações no Parlamento, menos de um ano depois. A intenção do Governo foi a de transformar os contratos de bolsas de investigação dos cientistas em contratos de trabalho, reforçando a sua estabilidade e direitos laborais. A primeira estimativa apontava para cerca de 3000 bolseiros que poderiam passar a ter contratos de trabalho.

O último balanço da aplicação deste diploma foi feito no início desta semana. Até 30 de Abril, as instituições de ensino superior e ciência tinham sinalizado 1596 bolseiros. Apenas 71 contratos (4,4%) foram enviados à FCT para financiamento. “As instituições estão a responder com muita lentidão”, critica o ministro Manuel Heitor, segundo o qual, durante esta semana, a FCT e as instituições assinaram contratos-programa que estabelecem prazos para a abertura dos concursos e agilizam o seu financiamento “como forma de acelerar o processo”.

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