Para um planeta com quase sete mil milhões de pessoas, não é de admirar que a generalidade delas tome a liberdade de expressão por um direito, muitas vezes porque já nasceram com ele. Esse facto, aliado à panóplia de ferramentas gratuitas que estão ao alcance de qualquer um e que permitem a expressão desenfreada de ideias e da falta delas, leva a que todos se sintam com legitimidade incorrer sobre os mais variados assuntos, sobretudo aqueles sobre os quais nada sabem e que nunca sequer dedicaram dois minutos.
Ora isto significa que, não só cada um de nós é constantemente violentado por informações conflituosas, como também que somos coagidos a sofrer incursões alheias sobre temas que preferimos nunca ver debatidos ou porque não interessam de todo ou porque, apesar da devassa pública das novas tecnologias, ainda existe quem preze aquele valor tão caído em desuso, que se chama privacidade.
Basta ver todo o Zé-da-esquina a tomar partido sobre taxis vs Uber ou um qualquer tu-que-fumas pronunciar-se sobre se serão os angolanos ou os espanhóis a dominar a banca nacional. A verdade é que no tempo da "outra senhora", cada um pensava profunda e arduamente no que tinha para dizer antes de falar, ao passo que agora que o meio se tornou a mensagem, cada um dos opinadores toma a sua palavra por lei e assume-se como pleno conhecedor de todos os factos.
Multiplicando isso por uns tantos mil milhões, a quantidade de ruído gerado pela espécie humana é abismal, essa mesma espécie conhecida por apenas valorizar algo depois de o perder. Então, talvez não fosse descabido considerar elaborar uma Carta da Liberdade De Expressão, que, tal como a de condução funcionaria por pontos.
Portanto, por cada asneira, calinada ou bacorada, seriam descontados pontos e chegando a zero, haveria uma suspensão da emissão de opiniões durante um mês, após o qual voltariam os pontos ao valor inicial. E quem, pergunta o leitor, seria o responsável por decidir os critérios de perda de pontos? Naturalmente, teria de ser nomeada uma comissão presidida por todos os adeptos da filosofia tão portuguesa de, “se pensasses como eu, o mundo seria muito melhor.”