Em caso de dúvida, amor!

A consciência é um estado tramado... sussurra-nos sempre: em caso de dúvida, amor!

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Jonathan Pendleton/Unsplash

Acertar, estar certo, correcto, ter razão, fazer bem, fazer o bem, não emerdar (como dizem os franceses), longo prazo, médio prazo, curto prazo, no já? “Que fazer?”, perguntava-se o Vladimir Ilitch, sim Vladimir, que fazer?! E quando, já agora?

Mandar-nos ser bonzinhos é fácil e barato; cá no prédio só há oito apartamentos e temos para cima de 16 concepções do certo e do errado (apesar de metade das casas estarem por ocupar), até o raça do gato tem opinião sobre o assunto... isto é tudo muito complicado.

Dar esmola, não dar esmola, ser amigo dos bichinhos, trabalhar, respeitar a greve, ir à missa, ir à "manife", não ir à toirada, reciclar, não comer carne, não comer peixe, não comer ovos, não beber leite, não vestir cabedal, tomar as vitaminas, o carvão vegetal, a água com limão, não comprar “made in china”, comprar “nacional”, fazer “like”, não ter facebook, nem twitter, nem telemóvel, nem televisão, lembrarmo-nos do natal, do 1.º de Maio, do dia da mãe, do são valentim, dos anos da avó, não fumar no elevador, apanhar o caganito do cão, lavar as partes baixas com óleo de linhaça (biológico e comércio justo).

Ai amem-se uns aos outros como a vós mesmos, está bem está Jesus, liga o telejornal que logo falamos... E no entanto não há álcool, nem droga, nem bola, nem telenovela, nem “jornalismo cidadão”, nem “campanha nas redes sociais”, nem pornografia, nem SIC Caras que cheguem para nos anestesiar o olhar, a empatia, a humanidade. Quer dizer, haver há, nós é que não vamos nessa, andamos demasiado vivaços.

Somos corruptos, contraditórios, medrosos, lúbricos, lambões, bipolares, preguiçanas, burros, invejosos, desatentos, vaidosos, apáticos, auto-iludidos, colectivamente manipuláveis e severamente dados à auto-destruição. Como espécie agimos mais como um vírus do que como mamíferos, a assassinar lentamente o hospedeiro como se não nos fossemos consumir no lume que aí, inexoravelmente, vem. Dançar à beira do precipício é um traço de personalidade.

Construímo-nos e destruímo-nos por dá cá aquela palha, pregamos a concórdia de faca na mão, ensinamos os pequenos a ignorar a miséria, o horror que escorre lento, normal, pelas ruas; já nem nos damos ao trabalho de inventar um guião: não é porque Deus quis ou porque os desgraçados o mereceram dalguma maneira... um “as coisas são assim” “as coisas são como são” chegam-se-nos bem.

E apesar de tudo quando os cabrões rodam o manípulo do horror para o muito quente, quando se nos atiram a granada para o meio da plateia, há sempre algo em nós que grita a resposta certa.

Somos humanos, disparatar com um ar sério faz parte do encanto, ser sublime também. Porque apesar de tudo sabemos quase sempre quando dizer não, por pouco que o façamos. A consciência é um estado tramado... sussurra-nos sempre: em caso de dúvida, amor!

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