Os azulejos “telha” presentes na cultura portuguesa tradicionalmente usados para controle de temperatura dos edifícios, e, mais tarde como suporte de gravação dos mais variados motivos (mitológicos, religiosos, narrativos e históricos) adquiriram desde há muito o estatuto de ícones da cultura cerâmica portuguesa. Para o italiano Luca Colapietro são o elo de ligação entre a tradição do artesanato português e a sua arte surrealista.
Luca, ou “Mr. Surrealejos” como gosta de ser tratado, afirma ter ficado “chocado” quando chegou a Lisboa. Deparou-se cercado de azulejos em todo lado. Gostou particularmente das ruas, dos prédios e das tasquinhas que se destacavam por causa dos seus padrões. Estava perante uma cultura diferente daquela que estava habituado em Itália, explicou ao P3.
Decidiu investigar a tradicional técnica dos azulejos portugueses e apaixonou-se. Com a ajuda de um outro artista, o italiano aprendeu este processo (diferente do tradicional) que consiste em "recolher imagens", "imprimi-las em papel especial para o efeito", e depois "colocá-las sobre o azulejo" para "ir ao forno a 200 graus fazer a gravação”. Em que são usados? Para os mais variados fins como vamos ver mais a frente.
A fusão entre o antigo artesanato português e o design de Luca fez com que os azulejos se transformassem e adquirissem novas interpretações como podemos ver no seu site. Muitos dos motivos nasceram pelo facto de não serem comuns em Itália ou na vida de Luca.
O Eléctrico 28 e as lagostas
Apaixonado pela cultura portuguesa, Luca pega em imagens reais e tradicionais, entre elas o Eléctrico 28, as sardinhas portuguesas, o galo de Barcelos, as caveiras de açúcar, os cravos vermelhos, os peixes e os elefantes para serem aleatoriamente sobrepostas nos azulejos. Todos estes ícones têm significado para o italiano. As lagostas utilizadas no trabalho de Luca surgem porque nunca tinha comido lagosta, e quando chegou a Lisboa ficou admirado por ser um prato presente na gastronomia portuguesa. As caveiras de açúcar surgiram com a ida ao México, no dia dos mortos. Usou-as porque gostou do significado que os mexicanos lhe atribuem. Tudo o que o fascina pode ser utilizado e transformado na sua arte. O “Mr. Surrealejo” transforma o real em surreal, os azulejos em Surrealejos.
Muitas vezes a inspiração parte dos sonhos de Luca, de “sonhos com imagens reais” que depois são gravadas nos brancos azulejos “telha” portugueses. Ao P3 explicou que Salvador Dalí, ou filmes da Pixar são algumas das suas fontes de inspiração. Não há regras na escolha dos motivos, mas todos eles têm o seu significado na vida de Luca. Quanto aos sonhos, o artista confessou ao P3 que tem o “de ver um prédio em Portugal coberto com a sua arte”.
Criar interpretações surreais de objectos e desenhos reais que depois são gravados nos azulejos utilizados para os mais variados fins, é o ponto de partida do seu trabalho, explicou Luca ao P3.
A técnica consiste em fazer uma digitalização de todas as imagens escolhidas pelo artista, imprimi-las num papel especial para o efeito para serem sobrepostas no azulejo. Após este processo o azulejo vai ao forno durante 10 minutos e está pronto para por um gancho que permite pendurá-los se esse for esse o efeito desejado, ou então dar largas á imaginação e utilizá-los para os mais variados fins. Mesas, cadeiras, quadros, caixas, em tudo isto os Surrealejos podem ser utilizados.
Para criar o azulejo basta pensar na ideia, na composição do desenho e na sua finalidade. Após o processo o trabalho é fotografado e colocado no site, Facebook e Instagram do “Mr. Surrealejos”.