Conjugar cantina e comida caseira na mesma frase pode soar a oxímoro, mas nem essa aparente contradição impediu Orlando Lopes e Rui Costa, dois nortenhos de 29 e 39 anos, respectivamente, de juntar os dois conceitos numa única ideia de negócio. “A ideia surgiu à mesa de um restaurante do Porto, em Agosto de 2015”, recorda um deles. Três semanas depois de constituírem a empresa, já estavam a vender refeições caseiras para fora, através de um modelo de negócio inspirado nos Dabbawalas de Bombaim, numa versão tecnológica talhada para o mundo ocidental. A empresa chama-se EatTasty e, segundo os próprios fundadores, define-se como uma “cantina virtual” através da qual se pode encomendar “refeições caseiras” para entrega em casa ou no trabalho.
“Desde que iniciámos a empresa até começarmos a vender demorou três semanas. Até sentirmos que tínhamos de facto um negócio”, foi preciso algum tempo mais, conta Rui Costa, “cerca de um ano”. Apesar da popularidade dos foodies, dos chefs e dos programas de cozinha, não é um negócio fácil. Três concorrentes internacionais da EatTasty (a belga Menu Next Door e as norte-americanas Jospehine Meals e a Food Works) faliram, um cenário tristonho em que até empresas que angariaram mais de três milhões de dólares de investimento, como a Jospehine Meals, soçobraram perante riscos legais, problemas operacionais e o desinteresse do mercado. A Food Works redireccionou a actividade para outra linha de negócio, que baptizou como Pilotworks: aluga cozinhas, em vez de vender a comida.
Ainda assim, Orlando e Rui acreditam que a ideia pode vingar por cá — e enquanto pensam expandir-se angariaram até agora 370 mil euros em duas rondas de financiamento, com os principais investidores a serem a Caixa Capital, a Sonae IM (do grupo a que pertence o PÚBLICO) e a Olisipo Way. Até porque, “depois de uma análise ao mercado mundial de foodtech”, Orlando e Rui encontraram “diversos modelos de negócio” e decidiram “criar um que conjuga aspectos positivos de todos os outros”, tentando aprender com os erros dos outros e corrigir o que funcionou mal.
No essencial, o serviço da EatTasty resume-se a esta ideia: se não pode comer em casa, encomende uma “refeição caseira” através de uma plataforma que liga o cliente a um cozinheiro e a um estafeta e a refeição será entregue em qualquer local, desde que coberto pelo serviço. É uma alternativa aos restaurantes, “com melhor rácio qualidade/preço, conveniente, rápido na compra e na entrega, com variedade na ementa e serviço ao cliente”, sustenta Rui Costa.
Por agora, a EatTasty cobre apenas algumas áreas geográficas dos concelhos de Lisboa, Oeiras e Amadora. Incluem-se aqui “grande parte da área de Lisboa, Lagoas Park, Tagus Park, Miraflores, Quinta da Fonte, Alfragide e Carnaxide”, explica Rui Costa, formado em Tecnologias da Informação, Gestão e Marketing e que vive em Famalicão, onde se encontra parte das instalações da empresa. Orlando, por seu lado, licenciou-se em Gestão e Engenharia Industrial, é de Viana do Castelo e passou antes por indústrias tão diversas como a do automóvel, produção audiovisual, retalho e software.
A empresa pretende expandir o serviço para outras áreas de Lisboa e em seguida tentar “uma nova geografia, nacional ou internacional, no início de 2019”.
A plataforma está acessível via computador ou app iOS. “Em relação ao Android não há data definida” para o lançamento, acrescenta Rui Costa. Como o design do site é mobile first, navega-se perfeitamente num browser de um telemóvel, seja qual for o sistema operativo.
Uma vez criada uma conta, o processo parece simples: a ementa diária inclui um prato de carne, outro de peixe e outro vegetariano (é possível consultar as ementas diárias com quatro dias de antecedência).
Em três cliques está feita a encomenda e o pagamento pode ser por cartão de débito, de crédito ou de refeição. A encomenda é alocada ao estafeta responsável pela rota que inclui a localização do cliente (que é avisado de antemão sobre o horário ideal de encomenda e entrega em função da sua localização).
Longe desta azáfama estão 15 home cooks, como chamam aos cozinheiros, e que “são pessoas com variados percursos de vida”, que “trabalham em diferentes tipos de cozinhas”. “O que faz com que as nossas refeições sejam caseiras é o facto de nunca utilizarmos processos industriais e descentralizarmos a produção em n pontos”, destaca Rui Costa, garantindo o cumprimento das normas — no que toca à segurança alimentar, por exemplo.
“Qualquer pessoa que tenha um ponto de produção certificado e que cumpra as normas de HACCP, poderá ser um candidato a cook da EatTasty”, explica. A empresa “também presta apoio à regularização destas normais legais”. “Quando uma pessoa se candidata, avaliamos factores como a localização e condições do ponto de produção e testamos as capacidades culinárias da pessoa em questão. Se tudo estiver conforme, é iniciada uma formação de cozinha prestada pelos nossos chefs. (…) Os ingredientes são entregues todos os dias de manhã na casa de cada cook”.
Uma refeição EatTasty custa 5,90 euros, com transporte e talheres incluídos, sendo cada prato desenhado por profissionais que trabalham com a empresa e que depois são produzidos com ingredientes e processos que são verificáveis (cada cozinheiro guarda mesmo uma amostra que pode ser analisada posteriormente, em caso de reclamação).
Desde o lançamento, a empresa conseguiu 5000 utilizadores registados, “dos quais mais de mil compraram refeições em Abril”. Vinte por cento da facturação tem origem em clientes que criam uma conta e utilizam o serviço em modo empresarial (almoços de equipa, eventos ou reuniões).
A diferença mais óbvia entre esta solução e outras opções como a UberEats ou a NoMenu é que estas últimas entregam comida feita e vendida por restaurantes.