Campanha de “crowdfunding” para abrir Livraria de Mulheres no Porto

Há cerca de meia centena de Livrarias de Mulheres em todo o mundo, mas não há nenhuma em Portugal. Aida Suarez está a “tentar por tudo” para que em breve haja uma no Porto

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Aida Suarez quer abrir a primeira Livraria de Mulheres em Portugal Paulo Pimenta

Será um espaço feito por mulheres, que fala de mulheres e se destina a mulheres, mas no qual os homens serão sempre muito bem-vindos. Aida Suarez tem apelido espanhol, mas nasceu no Porto e habituou-se desde pequena a passar meio ano de cada vez em cada lado da fronteira, e ter sempre nos livros os fiéis companheiros das viagens de comboio. É dela a definição do espaço que pretende abrir no Porto, se possível já em Abril, na que deverá ser a primeira Livraria de Mulheres em Portugal.

Aida Suarez está mobilizada a dar o primeiro contributo português para um “clube” que ainda é restrito, já que não chega a meia centena o número de Livrarias de Mulheres em todo o mundo. Para tal, lançou na Internet a campanha Confraria Vermelha - Livraria de Mulheres, onde apela ao contributo de todos para a apoiar a abrir um espaço “que seja de promoção de cultura, mais até do que um espaço de promoção do livro”, explicou ao PÚBLICO.

Desde 2010, altura em que entrou na Prolég, a Livraria para Mulheres em Madrid, que a ideia de abrir um espaço semelhante no Porto anda a germinar na cabeça de Aida. Desde então tem pesquisado muito e visitado todas as que pode, para finalmente se ter sentido apta a desenhar um projecto que leva no nome a palavra Confraria por apelar à união de um grupo, e Vermelha, por ser essa a cor da capa da Capuchinho, a personagem preferida dos contos infantis. Mas, se for para pensar em autoras do universo feminino, daqueles com que Aida Suarez pretende rechear as estantes da sua livraria, não tem dúvidas em dizer de onde lhe vem o mote: do ensaio de Virginia Woolf "Um quarto só para si". “Um quarto próprio, onde podemos caber todas”, explica Aida Suarez.

A livraria que está na cabeça de Aida Suarez é um sítio recheado de livros, de cima abaixo, e onde também há telas de projecção para ver cinema e para apoiar na transmissão de eventos como tertúlias, conferências, lançamentos de livros que, acontecendo no Porto, poderão ser acompanhados em todo o mundo, graças ao "streaming" da Internet. É, também, o local onde as mulheres se podem juntar para criar algumas coisas, para discutir outras tantas e para perceber melhor o mundo que as rodeia. É, por fim, o centro onde se pode mostrar ao mundo que a literatura feminina não é um sub-género e de onde serão esgrimidos todos os argumentos para demonstrar que faz falta traduzir mais vozes de mulheres.

“Não é verdade que encontramos todos os títulos nas livrarias generalistas. Continua a ser muito difícil ter acesso a publicações que sejam de mulheres, falem de mulheres ou se destinem a mulheres. E encontrar essas publicações traduzidas, mais difícil ainda”, acusa. Para comprovar a sua teoria, Aida tem na manga uma lista de 137 autoras, das quais pede que o interlocutor reconheça apenas dez. E que dessas dez tente identificar cinco de que já tenha, de facto, lido alguma coisa. Nunca teve sucesso. 

Pelas estantes da Confraria Vermelha estarão livros a falar de igualdade e de conquistas, de maternidade (“há mais títulos, para além dos livros práticos, e das 'x' melhores formas de fazer isto ou conseguir aquilo”, argumenta), de lutas e de violências, de género e de arte. E também livros sobre sexualidade, “mas não aqueles que só têm um foco sobre a mulher, que a coloca como objecto de prazer imediato”, explica Aida Suarez, para quem uma das missões da Livraria das Mulheres é contrariar a tendência que classifica a literatura feminina como um sub-género. “Até ao nível do design dos livros, com capas às florzinhas e tons pastéis, se nota que há o cliché da literatura de cordel, como se as mulheres só lessem esses livros, ou só escrevessem assim, uma espécie de literatura inferior”, critica.

Os 12 mil euros que Aida Suarez pede na plataforma de "crowdfunding" são apenas para montar o espaço e arrancar o negócio. Para garantir a sua manutenção, e o pagamento das contas, Aida Suarez pensou noutras alternativas: dar uma componente cooperativa à livraria e partilhar o espaço com a Escola de Narração Oral Itinerante, a primeira a existir em Portugal e que foi também fundada no Porto e por uma mulher, Clara Haddad. Os dois projectos partilharão o espaço e as despesas.

O espaço colaborativo vai chamar-se Fábrica das Histórias e será o sítio onde, segundo Aida Suarez, a Confraria Vermelha e a Escola de Narração Oral Itinerante vão trabalhar em conjunto para oferecer uma agenda variada de actividades e eventos. A perspectiva de rede não se vai confinar ao espaço interior da livraria portuense, uma vez que Aida Suarez já tem em marcha um plano de aproximação às lojas espanholas mercado onde existem mais, e com maior dinamismo de modo a poderem ser partilhadas toda a espécie de sinergias. A próxima apresentação pública da Confraria Vermelha - Livraria das Mulheres será no próximo dia 20 de Fevereiro, na livraria Lila de Lilith, em Santiago de Compostela.

Campanha termina a 20 de Março

A campanha de "crowdfunding" foi lançada na plataforma PPL, dois dias antes do Natal, e vai terminar no dia 20 de Março. O objectivo é angariar 12 mil euros, a verba que Aida Suarez contabilizou como necessária para fazer face aos custos de arrendamento do espaço e respectivas obras de adequação, aos encargos com o licenciamento da livraria e respectivo registo, bem como as despesas com as instalações informáticas e com a compra do seu material mais precioso: “livros e muitos, livros”, diz Aida.

“Não escondo que este projecto servirá, também, para me dar um emprego. Isto não deixa de ser negócio, mas é uma actividade que não me vai enriquecer pessoalmente, mas sim tornar mais ricas muitas mulheres”. A pouco mais de cinco semanas de terminar a campanha, o projecto de Aida Suarez está muito longe da meta a que se propunha atingir – não chega aos 5% da verba anunciada como necessária. 

Aida Suarez sabe que muito possivelmente vai ter de devolver todo o apoio que já conseguiu – são essas as regras desta plataforma; dos 630 projectos que já publicou, 48% não viram os objectivos atingidos, e o dinheiro foi devolvido aos apoiantes. Mas Aida Suarez assegura que o seu “já é um projecto conseguido”. “A partir do momento em que ficou online, os contactos têm crescido e a rede já é uma realidade. Já valeu a pena”, diz. O formigueiro para criar a livraria, que lá anda desde 2010, esse não vai desaparecer. Está garantido.

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