Acaba de concretizar um objectivo enorme e, diria, desumano: correu uma maratona. Uma brutalidade para os cépticos da corrida, onde me incluo preguiçosamente. Mas as suas pernas tremem. Não de dor, porque o sorriso com que cortou a meta denunciava que poderia correr facilmente mais meia. Tremem, porque dali a poucos dias vai recomeçar.
Em resposta a um país que há muito se esqueceu dela, da sua luta, da sua garra e persistência (caramba, se dúvidas houvesse, ela correu uma maratona), voa para definir novos sonhos. As paragens serão mais agrestes, frias certamente, mas o horizonte vestirá, sem qualquer sombra de dúvidas, uma pele mais "friendly". Daquela que dá vontade de tocar, sentir, abraçar. A mesma que outrora pairava por cá, em jeito de esperança.
Há anos jamais conseguiria imaginar uma vida além-fronteiras. O apego à minha família é gigante e os três anos que passei em Lisboa souberam-me, amargamente, a uma eternidade. Afinal, sou uma mulher do Norte. E Lisboa fica já ali. Agora imagina que, quando recebes um telefonema a meio da noite a dizer que o teu pai teve um enfarte, estás a milhares de quilómetros? Do outro lado do mundo? A impotência ganha a maior força da tua vida. No entanto, aquilo que sempre me pareceu a história dos outros, começa a ganhar vida. O guião foi, está a ser reescrito, ao sabor das incertezas, da angústia, da desilusão.
Este país já não é para novos. Pelo menos, para aqueles que têm coragem de correr atrás dos sonhos sem estratégias ou planos super definidos, rumo a um emprego certeiro, mas desapaixonado e desapaixonante. Este país não absorve os seus talentos. Antes, prepara-os e projecta-os para o mundo. O mundo dela recomeça hoje. A esta hora, já aterrou em Londres. Nas pernas os seus músculos escondem a tão amarga saudade de ter tentado tudo in portuguese. Ironicamente, o combustível necessário para, dia após dia, voltar à estaca zero. "By the way", em Abril próximo a sua meta será a Maratona de Londres.